Brasília A pizza foi assada em uma sessão secreta, considerada tranqüila por muitos senadores, mas com pitadas de ameaças veladas e recheada de tumultos do lado de fora do plenário do Senado. Foram 40 os parlamentares mestres-cucas a meter a mão na massa, 35 tentaram estragar a receita e 6 decidiram não dar palpite. Após 5 horas no forno, o cheiro da impunidade pairava no ar: o presidente do Senado, Renan Calhei-ros, havia sido absolvido.
Para colocar mais lenha no fogo, Renan tentou intimidar seus colegas que o criticam desde a primeira denúncia. Durante seu discurso de defesa, virou-se para Jefferson Perez (PDT-AM) e comentou: "Veja bem, senador Jefferson Perez. Eu poderia ter contratado a Mônica (Veloso, ex-amante dele) como funcionária do meu gabinete. Mas não o fiz". Perez nada disse.
Mas a temperatura já tinha esquentado pouco antes. Defendendo a perda de mandato, Demóstenes Torres (DEM-GO) chamou a estratégia de defesa do senador de "burra". Irritado, Renan pediu respeito. Em seguida, Demóstenes se desculpou e corrigiu a afirmação: "Direi, porém, que sua estratégia foi pouco inteligente", ironizou.
Após a divulgação do resultado, em meio a muito empurra-empurra, o senador saiu do plenário, ao lado de seu advogado, e só falou uma frase: "Vou para a igreja rezar, vou para a igreja rezar". Não foi. Sua mulher Verônica telefonou para ele e pediu que voltasse imediatamente para casa onde sua família o esperava.
Horas depois, Renan divulgou nota em que afirma que "o resultado da votação é uma vitória da democracia". A nota também informa que ele vai procurar os líderes partidários como forma de garantir a realização de votações na Casa. "Nesses mais de cem dias, muitos de nós perdemos algo. Eu perdi mais. Abri mão de momentos de convivência com minha família e com os amigos", diz a nota.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi informado sobre a absolvição enquanto tomava café com a rainha da Dinamarca, Margrethe II, e o príncipe consorte, Henrik II, no castelo de Fredensborg, onde está hospedado. Ao assessor que lhe deu a notícia, o presidente apenas respondeu "está bem" e não quis mais comentar o assunto.
Já a oposição atribuiu a absolvição de Renan diretamente ao PT. "Foram seis absolvições e seis era o número de senadores do PT que dizia votar conosco", afirmou o senador Demóstenes Torres (DEM-GO).
O líder do PSDB, Arthur Virgílio (PSDB-AM), foi mais duro e chegou a chamar de "delinqüentes" os que se isentaram da votação. "O resultado foi deplorável porque seis resolveram fazer o voto sujo, o voto bem calhorda da abstenção", disse.
Mas o primeiro resultado indigesto dessa pizza deverá aparecer na tentativa de votação da prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Mesmo antes de a proposta ter sua votação concluída na Câmara, os senadores de oposição já avisam que não farão qualquer movimento para ajudar o governo a aprovar o projeto. Pior: a idéia dos partidos de oposição, inclusive, é a de derrubar o projeto de CPMF no Senado, ainda mais depois de considerarem que o governo ajudou a salvar o mandato de Renan.