Foz do Iguaçu – Gordinho completará 12 anos no próximo domingo. O sonho dele é estudar na Aeronáutica, ideal bem distante da vida que leva hoje como vendedor de refrigerantes na Ponte da Amizade, ligação entre Brasil e Paraguai. Bom de papo e dedicado ao trabalho, esse ano o garoto acabou sendo obrigado a abandonar a 5a. série para ajudar o pai no orçamento familiar. "Prefiro trabalhar do que ficar em casa", diz.

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A história de Gordinho é reflexo do drama das crianças vindas de famílias de baixa renda que vivem na região da tríplice fronteira do Brasil, Paraguai e Argentina. São vítimas da pobreza, condição que as deixam longe da escola e as levam com mais facilidade às situações de abuso sexual e ao trabalho infantil.

Essa realidade foi diagnosticada em um estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) com apoio da Itaipu Binacional no Brasil, Paraguai e Argentina. Os índices, divulgados ontem em Foz do Iguaçu, evidenciam a urgência de se estabelecer políticas públicas para contornar a situação.

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O levantamento foi feito entre junho e outubro de 2005 em 62 cidades situadas na região fronteiriça do Brasil, Paraguai e Argentina. Os pesquisadores obtiveram as informações em banco de dados dos governos federal, estadual e das prefeituras. Esta foi a primeira pesquisa da Unicef realizada simultaneamente em três países.

Um dos dados alarmantes refere-se à desigualdade social, fator que acaba empurrando crianças e adolescentes ao tráfico e consumo de drogas, exploração sexual e comercial. Dos 32 municípios brasileiros incluídos na pesquisa, dos quais 31 são paranaenses, 17 têm uma proporção de pobres maior do que a média estadual (23,7% no Paraná). Os indicadores foram fundamentados na renda domiciliar per capita inferior à linha da pobreza (1/2 salário mínimo).

As altas taxas de pobreza atingem até mesmo municípios que recebem royalties da Itaipu, entre eles Santa Helena, Itaipulândia e São Miguel do Iguaçu. A infra-estrutura e os programas sociais das cidades não resolvem o problema da desigualdade social.

Abandono

"A maioria das crianças que estão na rua são abandonadas", diz a representante da Unicef no Brasil, Marie-Pierre Poirier. Segundo ela, a pesquisa é um primeiro passo para transformar a realidade. Agora é preciso acompanhar a situação de perto e as dinâmicas que serão estabelecidas para melhorar a situação das crianças.

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Para representante do Unicef no Paraguai, Walter Mendonça Filho, a região da tríplice fronteira apresenta características que acabam colocando crianças e adolescentes em situação de risco. "Existem particularidades na tríplice fronteira que tornam as crianças e adolescentes um pouco mais vulneráveis às situações de exploração e abuso" diz.

Outro problema apontado no relatório é a alta incidência de sub-registros. No lado brasileiro, a situação é mais grave nos municípios de Santa Tereza do Oeste e Matelândia, nos quais o percentual de cobertura de registro civil é menor do que 75%.

Para o diretor regional do Unicef para América Latina e o Caribe, Nils Arne Kastberg, é preciso que os governos trabalhem de forma integrada para combater o problema. "As ações isoladas podem gerar situações nas quais os problemas não sejam abordados", enfatiza.

Na tentativa de amenizar o problema, o Unicef está sugerindo aos governos municipais, estadual e federal oito ações para melhorar a condição das crianças na tríplice fronteiras, entre elas a oferta do registro civil em hospitais e maternidades; ampliação dos serviços de saneamento básico; o fortalecimento da família; investimentos em educação de qualidade para crianças de 0 a cinco anos e provenientes de zonas rurais.