Em uma operação batizada de Alexandria, mais de 1,5 mil agentes das polícias Civil e Militar do Paraná cumpriram, nesta quinta-feira (17), 577 mandados de prisão preventiva contra membros da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PPC). Deste total, 484 pessoas já estavam detidas – o que mostra que o estado vem falhando no controle do sistema prisional e no combate às organizações criminosas. Ao todo, foram expedidos 767 mandados de prisão preventiva e quatro de busca e apreensão em Curitiba e região, além de outras 72 cidades do interior do estado.
Como funciona a facção
Folhapress
Os cadernos apreendidos na investigação que culminou na operação Alexandria, das polícias do Paraná, dão detalhes sobre o modus operandi do PCC. A principal atividade da facção é o tráfico de drogas. Com o dinheiro, os chefes pagam advogados, dão suporte financeiro a algumas famílias e garantem proteção a quem está dentro ou fora da prisão. No Paraná, a maioria dos membros está presa. É o oposto do cenário em São Paulo, onde a maior parte está solta, ou “na sintonia”, segundo o jargão da facção. Os chefes são chamados de “resumos”. Existem resumos locais, regionais, federais e disciplinadores (esses, os responsáveis pela execução de inimigos ou infiéis, de acordo com as investigações). Quem faz a comunicação entre quem está preso e quem está “na sintonia” são advogados e familiares. Na operação desta quinta, dois advogados também foram detidos, suspeitos de desvirtuarem suas funções e atuarem, na prática, em favor do grupo, transmitindo recados a líderes e auxiliando na administração.
Até às 15h30 desta quinta-feira, haviam sido presas 93 pessoas que estavam nas ruas – 28 em Curitiba e região metropolitana e 65 no interior do Paraná.
Entre os detidos, 40 são considerados líderes do PCC, segundo o secretário estadual da Segurança Pública e Administração Penitenciária, Wagner Mesquita. “Estamos negociando 40 vagas com o governo federal para que eles sejam encaminhados a presídios federais de segurança máxima. A atuação enfraquece essa facção no estado e ajuda a desarticular a operação dela em todo o estado”, disse.
Bloqueio
O secretário de Segurança Pública, Wagner Mesquita, reconhece que as deficiências do sistema de segurança em relação ao uso de celulares nos presídios. “Vamos instalar bloqueadores e é algo que sempre precisa de vigilância”, diz.
Os líderes, que eram responsáveis por dar as ordens de atuação no estado, estavam detidos, em sua maioria, na Penitenciária Estadual de Londrina e na Penitenciária Estadual do Paraná (PEP I). O delegado Rodrigo Brown, responsável pela investigação, informa que a maioria deles cumpria pena por tráfico de drogas e roubo. Além disso, por decisão do Poder Judiciário, 237 telefones foram bloqueados, assim como 28 contas bancárias que, além do bloqueio, terão os valores sequestrados. Há ainda a suspeita de que um hotel da região central de Curitiba fosse usado para lavagem de dinheiro do PCC.
Toda essa megaoperação remonta a agosto do ano passado, quando foram apreendidos cadernos com anotações e detalhes da atuação da facção criminosa no Paraná. Todo esse material estava escondido debaixo de um colchão da cama de um casal de Curitiba que estava sendo monitorado pela polícia desde 2013. “Descobrimos um tesouro. A partir daí é que a investigação se intensificou”, afirmou o diretor do Departamento de Execução Penal (Depen), Luiz Cartaxo. “Esse casal está isolado. Nem o PCC os aceita porque falharam na missão”, completou.
Nome da operação
O nome da operação foi inspirado na Biblioteca Real de Alexandria ou Antiga Biblioteca de Alexandria, que foi uma das maiores bibliotecas do mundo antigo. Ela existiu até a Idade Média, quando supostamente foi totalmente destruída por um incêndio cujas causas são controversas. Nela continha praticamente todo o saber da Antiguidade.
Eram mais de 10 mil anotações, que incluíam todos os rituais de batismo dos integrantes do PCC, os padrinhos criminosos, as missões que deveriam ser praticadas e o pagamento das “cebolas” (mensalidade no linguajar da facção). Havia também o nomes dos “resumos” (líderes) e informações sobre a atuação do PCC dentro e fora dos presídios.
Interceptação telefônica
Foram interceptadas, com autorização judicial, mais de 30 mil ligações. A polícia tem mais de 1,7 mil horas de conversas dos membros desta facção envolvendo doze estados: Paraná, Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia, Alagoas, Ceará, Goiás, Santa Catarina, Pernambuco, Rio Grande do Norte.
Para especialista, operação é midiática e não resolve o problema de segurança
O ex-secretário nacional de Segurança Pública e professor do Centro de Altos Estudos de Segurança da Polícia Militar de São Paulo, José Vicente da Silva Filho, afirma que operações como esta para combater o crime organizado não resolvem o problema de falta de segurança pública. Além disso, o fato de mais da metade dos mandados corresponder a criminosos já presos significa que existem falhas no sistema de segurança dos presídios.
“Falta uma planejamento adequado no sistema prisional. Não há, em todo país, um serviço de inteligência prisional”, afirma. Segundo ele , os criminosos ligados a uma facção criminosa devem ser isolados. “O problema é que há corrupção de agentes públicos que permitem, por exemplo, a entrada de celulares. Na verdade, eles deveriam estar completamente alheios para não continuar agindo no mundo do crime”, ressalta.
Em relação às operações policiais, como a deflagrada nesta quinta-feira (17), Silva Filho afirma que elas não resultam em efeito prático.”Bandido não tem medo de operação. Bandido tem medo de uma polícia que atue 24 horas durante 365 dias do ano. É a ação diária que irá tirar os bandidos das ruas. Operações como essas são feitas para a mídia”, afirma.
O conteúdo das conversas interceptadas mostra que diversos crimes foram cometidos em benefício da organização criminosa, como tráfico de drogas, extorsão financeira de familiares presos, roubos de carros e residências, tráfico de armas e homicídios. “Os dados que temos serão encaminhados a esses estados para ajudá-los na investigação de outros membros dessa facção”, afirma o secretário Mesquita.
De acordo com a pasta, é a maior operação realizada no país contra membros de uma facção criminosa e conta com o apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). Mais de 1,5 mil policiais foram mobilizados.
Vagas e presos já detidos
Os presos já detidos que tiveram mandado cumprido agora também serão julgados por associação criminosa, que pode levar a mais oito anos de detenção. “Vão responder a mais um processo, com apenamento mais grave”, afirmou Cartaxo.
Em relação ao número de vagas disponíveis no sistema carcerário hoje, o diretor do Depen afirma que irá fazer um rearranjo do sistema para dar conta das vagas. “Vamos ter que dar um jeito. Um dia de cada vez”, disse.
Atuação dos advogados
Em relação aos advogados presos, o secretário Mesquita afirma que os dois profissionais atuavam como um elo de ligação entre os integrantes presos e os que estavam em liberdade. Atuam em prol do funcionamento do PCC no estado.
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