Desfile da Gucci na Semana de Moda de Milão| Foto: REUTERS/Alessandro Garofalo

Opinião

Expedição pelo Iguaçu em 2011 revelou tragédia ambiental

João Rodrigo Maroni, editor do projeto Águas do Amanhã e da Gazeta do Povo

Entre as inúmeras iniciativas desenvolvidas pelo projeto Águas do Amanhã [2010 a 2011] para conscientizar os paranaenses sobre a importância de se preservar o principal rio do estado, a mais marcante foi a expedição que percorreu, de carro e de barco, os principais trechos do Iguaçu – de Curitiba a Foz. Embarquei juntamente com outros colegas de imprensa e técnicos da UFPR em uma jornada de cinco dias, em abril do ano passado.

Durante a expedição, coletamos amostras de água para avaliação técnica. O resultado que a sonda mostrava apenas reiterava o que nossos olhos e narizes sentiam. Na região de Curitiba, o Iguaçu é um rio morto. E fede como tal. Quase não há peixes. Os poucos corajosos que resistem, precisam respirar junto à lâmina d’água, onde o pouco oxigênio que sobra se concentra. Uma das medições ocorreu em um ponto logo abaixo de onde a estação de tratamento de esgoto Cachoeira, da Sanepar, em Araucária, despeja o efluente teoricamente tratado. O índice de oxigênio dissolvido na água ali é de 2,6 miligramas por litro (mg/l), quando o ideal é de, no mínimo, 5 mg/l. Outros fatores que indicam poluição, como a concentração de clorofila, nitrato e a turbidez da água, também estavam altos naquele ponto e em outros dentro da Região Metropolitana de Curitiba.

É bom lembrar, no entanto, que a poluição do Iguaçu tem origem complexa. Vem do lixo jogado direta ou indiretamente no rio, de esgotos clandestinos – mesmo quando há rede de coleta disponível – e até do desmatamento das margens provocado pela ocupação desordenada, além, claro, do tratamento ineficiente do esgoto coletado.

A boa notícia é que o Iguaçu, ao longo de seu trajeto natural até as soberbas Cataratas, ainda tem a capacidade de se autorregenerar. Por quanto tempo não sabemos. Para quem vive nos arredores de Curitiba, sobrou conviver com o desastre ambiental, o risco de doenças, o mau cheiro e a vergonha de viver em uma sociedade que deu as costas para seu maior patrimônio natural. Puxou a descarga e deixou para lá.

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Repercussão

Ministério Público Estadual vai investigar se Sanepar lesa consumidor

Diego Antonelli

O Ministério Público (MP) do Paraná vai instaurar inquérito civil público para investigar a prestação de serviços da Sanepar. O procedimento visa a apurar se a companhia cobra dos consumidores pelo tratamento de esgoto, mas não executa os serviços, conforme denunciado pela Polícia Federal.

A Sanepar atende 345 dos 399 municípios do Paraná. A companhia informa em seu site oficial que 6 milhões de pessoas são atendidas com o tratamento de esgoto, somando mais de 1,5 milhão de ligações em todo o estado. Isso significa que aproximadamente 60% dos 10,5 milhões de paranaenses contam com o serviço da empresa. A Sanepar ainda relata que o índice de tratamento dos resíduos chega a até 99,4%. O custo de manutenção dos equipamentos gira em torno de R$ 1 bilhão ao ano.

O procedimento investigatório é de autoria dos promotores de Defesa do Consumidor de Curitiba Maximiliano Ribeiro Deliberador e Michele Rocio Maia Zardo.

Águas do Amanhã

Confira vídeos, fotos e dados da expedição pelo Rio Iguaçu no site do projeto Águas do Amanhã.

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A poluição do principal rio do Paraná salta aos olhos, agride as narinas e agora foi comprovada por três importantes laboratórios em uma investigação da Polícia Federal (PF) em parceria com o Ibama. A água que sai das estações de tratamento de esgoto da Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar) e também amostras recolhidas antes de passarem pelas unidades foram analisadas e revelaram que dejetos não tratados estão sendo despejados no Rio Iguaçu. Os dados embasaram a operação policial "Água Grande" (tradução da palavra indígena Iguaçu) e resultaram em uma multa de R$ 38 milhões à empresa aplicada pelo Ibama.

Trinta pessoas da cúpula da companhia foram indiciadas pela PF por crimes ambientais e também por delitos como estelionato – já que a companhia estaria cobrando por um serviço que não é efetivamente prestado. "A Sanepar é uma empresa de fachada", declarou o delegado Rubens Lopes da Silva, responsável pela investigação.

Sete pessoas foram presas em flagrante – seis motoristas de caminhões do tipo limpa-fossa, que estavam despejando esgoto, e o responsável pela Estação de Tratamento de Esgoto do Belém, em Curitiba.

Apesar de a investigação ter começado em 2008, apenas os atuais diretores da Sanepar foram indiciados, entre eles o diretor-presidente, Fernando Ghignone, licenciado do cargo desde o mês passado. As amostras que comprovariam as irregularidades foram colhidas em 2011 e 2012. A partir dos documentos apreendidos ontem, a PF vai decidir se também indicia ex-gestores da Sanepar. A Justiça autorizou 30 mandados de busca e apreensão em 19 cidades do Paraná. Foram recolhidos relatórios sigilosos, que agora serão analisados. Documentos pedidos pelo Ibama e não repassados pela Sanepar resultam em multas diárias de R$ 20 mil à companhia desde 2009.

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Estudo técnico

Outros levantamentos, como os feitos pelo Tribunal de Contas do Estado e pela Agência Nacional de Águas, já haviam indicado alto nível de poluição por esgoto no Rio Iguaçu. O destaque, desta vez, é a análise química feita por laboratórios da Universidade de Campinas (Unicamp), da empresa Tasqa e da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). De acordo com os relatórios, a água tem mais qualidade antes de passar ao lado da estação e piora assim que recebe os despejos da Sanepar. De acordo com o dicionário, sanear significar tratar, reparar, mas o esgoto tratado pela empresa estaria poluindo o rio. Todas as 225 estações da Sanepar no estado estariam atuando de forma irregular e 20% seriam clandestinas, ou seja, funcionariam sem licença ambiental.

Os argumentos da PF foram aceitos pelo Ministério Público e pela Justiça fe­derais. A procuradora Mônica Bora e a juíza Pepita Durski Tramontini entenderam que havia indícios suficientes da prática de crimes apontados pela investigação. O rio foi observado de cima, por helicóptero, das margens, por expedições a pé e de carro e, diretamente no leito, de barco. A apuração concluiu, baseada em dados próprios e outros estudos, que cerca de 80% da poluição do Iguaçu é decorrente de esgoto doméstico. Aproximadamente 13% seriam resultado de dejetos industriais. Além da companhia de saneamento, outros 180 suspeitos de degradarem o rio estão sendo investigados. "Contudo, a Sanepar é a maior poluidora", disse o delegado.