A Polícia Civil transferiu ontem para Curitiba o sargento aposentado Álvaro Domingues Neto, preso sob acusação de comandar operações de tortura a mendigos de Paranaguá, no litoral do estado. Quatro guardas municipais também foram presos e outros três estão sendo procurados por suposto envolvimento no crime.
Atualmente Álvaro ocupa o cargo de secretário de Segurança Pública da cidade. Ele é acusado de liderar o trabalho de limpeza social até março deste ano, quando dirigia a Guarda Municipal. Após as denúncias, publicadas originalmente pela Gazeta do Povo no dia 23 de abril, dois moradores de rua foram encontrados mortos de forma misteriosa, num intervalo de quatro semanas.
Um dos mendigos encontrados mortos é Augusto Lúcio Bezerra, citado na reportagem com o nome fictício de Clodoaldo. Ele mostrou o lugar às margens do Lago Azul onde dois anos antes teria sido torturado por guardas municipais. Um mês depois de publicada a denúncia, Augusto foi encontrado morto em Morretes, debaixo da escada do ginásio de esportes. O laudo do Instituto Médico Legal de Paranaguá apontou morte natural, o que não convence o responsável pela Pastoral Rodoviária, padre Adelir Antônio De Carli, autor das denúncias. Esta não foi a única morte suspeita ocorrida depois de tornadas públicas as acusações.
Além disso, o próprio padre diz ter sido alvo de ameaças para não levar adiante a farta documentação encaminhada ao Ministério Público. No dia 6 de junho, o eclesiástico conta que recebeu uma ligação no celular avisando para se cuidar porque ele e mais duas pessoas seriam mortas. A essa altura, a reportagem da Gazeta já havia levado à criação de uma comissão de sindicância na prefeitura e de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) na Câmara dos Vereadores. Não tardou para ambas constatarem a limpeza social em curso na cidade. Simultaneamente, a Polícia Civil conduzia sua investigação, chegando à conclusão de que sete guardas participaram do transporte e das torturas aos mendigos.
Antes de prestar depoimento à polícia, oito dos 11 indigentes ouvidos por este jornal disseram já ter sido levados à força para Curitiba e Registro, cidade paulista na divisa com o Paraná. A estratégia dos guardas municipais era recolhê-los à noite das ruas e levá-los para bem longe. A última remessa foi no dia 25 de março, objeto da denúncia que deu publicidade ao caso. Neste lote estava Seu Pedro, de 56 anos, que, junto com um amigo sexagenário, voltou a pé para Paranaguá depois de ter sido largado em Curitiba. Naquela madrugada chuvosa, a passagem de dois carros da Guarda Municipal foi registrada pela concessionária que administra o trecho da BR-277 entre a capital e o litoral.
Álvaro negou as acusações e disse que os próprios moradores de rua pediram o transporte para outras cidades. Na segunda-feira o promotor de Justiça José Luiz Loreto de Oliveira pediu a prisão preventiva dele e dos sete guardas municipais, sendo atendido pela 2ª Vara Criminal de Paranaguá. O sargento reformado da PM foi transferido para o Centro de Observação de Triagem, em Curitiba, e os demais para o Centro de Triagem de Piraquara, na região metropolitana. Dali, serão enviados para a prisão onde aguardarão julgamento. Segundo o delegado titular de Paranaguá, Valmir Soccio, os advogados dos três guardas foragidos avisaram que em breve eles vão se entregar.
O prefeito de Paranaguá, José Baka Filho, disse que denúncias antigas estariam sendo vinculadas de forma errada à atual administração. "Se alguém em anos anteriores disseminou esse tipo de atitude condenável na corporação deve ser investigado e severamente punido", afirma. Baka refere-se ao caso mais grave, o de Augusto, que teria sido torturado no pau-de-arara às margens do Lago Azul, mas o caso mais recente de limpeza social aconteceu em março, já na atual administração. Álvaro e os demais acusados foram indiciados por crime de tortura, cuja pena varia de 2 a 8 anos de reclusão.
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