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Os policiais que invadiram o Carandiru na tarde do massacre atiraram em detentos que já estavam prontos para se entregar e não tinham relação com a briga que acontecia dentro do presídio, disse o agente penitenciário Moacir dos Santos, quarta testemunha a depor nesta segunda-feira (15). Ao todo, 111 presos foram mortos na ocasião.

A testemunha definiu o episódio como uma execução e disse ainda que mesmo após o Massacre, presos que já estavam no pátio, rendidos, nus, foram levados pela polícia de volta para o prédio para retirar corpos de mortos e acabaram fuzilados. Santos era Diretor da Divisão de Segurança e Disciplina da Casa de Detenção e, no dia 2 de outubro de 1992, foi avisado por volta de 13h de uma briga que ocorria entre dois grupos rivais de detentos do Pavilhão 9.

Ele contou que a confusão envolvia cerca de cem dos mais de 2 mil presos do pavilhão. Esses dois grupos saíram em defesa de dois presos que começaram uma briga, cada um de uma facção, conhecidos pelos apelidos de "Barba" e "Coellho".

O agente penitenciário foi ao local da briga para negociar com os detentos, ao lado de mais 10 funcionários. Mas, depois de 40 minutos de conversa, os presos diziam que a briga era entre eles e expulsaram os funcionários, sem tentar fazê-los de reféns ou machucá-los. Neste momento, ele acionou o alarme de emergência e a Polícia Militar foi avisada.

Quando o reforço chegou, formou-se, então, uma espécie de comitê, formado por ele, o diretor do presídio José Ismael Pedrosa, o coordenador do Sistema Penitenciário, Hélio Nepomuceno, o secretário-adjunto de Segurança Pública, Antônio Filardi, e o comandante do policiamento metropolitano Ubiratan Guimarães, além de dois juízes. O grupo discutiu como a operação de entrada da PM ocorreria.

O combinado, segundo ele, foi de que Pedrosa faria uma negociação com um megafone e os policiais dariam cobertura, com escudos. "Mas eles [os policiais] não seguiram o acordo. Arrombaram a porta e já foram metralhando", disse.

Os presos alvejados nesse primeiro momento tinham sido colocados por ele no pátio, justamente porque não tinham relação com a briga que ocorria lá dentro. A polícia, segundo ele, sabia disso quando atirou neles.

"Não deixaram a gente nem socorrer os feridos", disse. Santos afirmou que só conseguiu entrar no pavilhão por volta das 19h, quando os presos já estavam rendidos. Ele disse que, quando entrou, viu um "tapete de mortos". "As galerias estavam forradas de corpos", disse. Ele afirmou que, quando estavam no pátio, presos já rendidos e nus foram retirados por policiais para ajudar a recolher os corpos de dentro do prédio e "eram fuzilados depois". "O juiz começou, então, a anotar o nome de todos que eram levados para ajudar e eles pararam de matar. Se isso não tivesse sido feito, mais gente teria morrido".

Para o agente, os policiais mataram a maioria dos presos dentro das celas e, depois, fizeram com que os presos removessem os corpos, para alterar a cena do crime.

Mas em uma das celas, ele achou 11 presos mortos. "Tinha marcas de balas para todos os lados, em todas as celas. Eles [os policiais] só respeitaram a tenda de Umbanda".

Despistar

O agente penitenciário afirmou que depois que a situação acalmou, as autoridades começaram a discutir como fariam para retirar os corpos. Segundo ele, para despistar a imprensa e os familiares dos mortos, foram usados três grandes carros. Os corpos foram levados para três IMLs (Institutos Médicos Legais) diferentes. O Massacre ocorreu um dia antes das eleições municipais. O número real de mortos só foi divulgado após o fechamento das urnas.

Testemunhas

Antes de Santos, três ex-detentos do Carandiru também prestaram depoimento. Luiz Alexandre de Freitas disse ter sobrevivido porque se escondeu sob corpos. "Escondi debaixo dos mortos para não morrer também".

Outra testemunha foi Marco Antônio de Moura, que afirmou que policiais atiraram em direção à cadeia de dentro de um helicóptero. "Tinha presos que estavam no telhado, tentando fugir. Todos foram atingidos por essas balas e morreram". Foi ouvido ainda o ex-detento, Antônio Carlos Dias, que disse acreditar que o número de mortos no massacre foi ao menos o dobro dos 111 divulgados oficialmente. "Só os corpos que vi saindo do segundo andar eram mais de cem pessoas. Esses 111 eram as pessoas que tinham família, que recebiam visitas", disse.

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