Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Inclusão racial

Política de cotas geral e irrestrita

De origem indígena, Juliene reivindica cotas no Judiciário | Ivonaldo Alexandre/ Gazeta do Povo
De origem indígena, Juliene reivindica cotas no Judiciário (Foto: Ivonaldo Alexandre/ Gazeta do Povo)

Antes alvos de questionamentos e julgamentos, as cotas raciais estão em evidência no Brasil. A decisão unânime do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade da reserva de vagas para estudantes negros em universidades, em abril deste ano, deu segurança jurídica para as cotas ultrapassarem os muros do ensino superior. Hoje, a discussão chegou ao mundo do trabalho, principalmente no serviço público e no Judiciário.

No governo federal, a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial pretende apresentar à presidente Dilma Rousseff, até o fim do ano, uma proposta sobre cotas para negros no funcionalismo público federal. A ideia pode abranger de cargos concursados, a exemplo do que já ocorre em alguns estados, entre eles o Paraná, a postos comissionados.

Já o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mapeia a situação das minorias no Judiciário para formular até maio de 2013 uma proposta inclusiva. Ao mesmo tempo busca dados sobre os negros e índios no país e pesquisa a adoção das políticas de inclusão em outros países. O mapeamento começou após a estudante de Direito Juliene Vieira Lima Fagundes Cunha, indígena da etnia kapinawa, solicitar cotas para o ingresso de índios e negros nos quadros do Judiciário. "Temos que abrir mais portas, porque o Brasil tem uma dívida com esse povo", explica Juliene, que mora em Curitiba.

Consequências

As ações do Estado sobre a política de cotas pode ter reflexos na iniciativa privada. O Estatuto da Igualdade Racial, que entrou em vigor em 2010, prevê, por exemplo, incentivo para que as medidas no serviço público de igualdade de oportunidades no mercado de trabalho aos negros sejam implantadas no setor privado.

Segundo o assessor do gabinete da ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Marcos William Bezerra de Freitas, é preciso estimular medidas na iniciativa privada. A secretaria pretende trabalhar essa pactuação através do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial, que está previsto para funcionar em 2013.

Conjunto

Para o antropólogo José Jorge de Carvalho, coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa, a ampliação da discussão das cotas nos diferentes setores é necessária. Segundo ele, os países pioneiros nas ações afirmativas promoveram um sistema integrado, com cotas na educação e no serviço público, e na relação do Estado com as empresas através de incentivos. "No Brasil ficamos só na educação", observa.

O diretor executivo da ONG Edu­­cação e Cidadania de Afro­­des­­cendentes e Carentes (Edu­­cafro), frei David Santos, cita uma pesquisa do Instituto Ethos, de 2010, de que somente 5,3% dos cargos executivos nas 500 maiores empresas do país são ocupados por negros. "Isso é escandaloso, mostra o grande índice de exclusão. Os negros representam 51% da população brasileira."

Uma das possibilidades para a inclusão racial no mercado de trabalho seria através de incentivos às empresas que investem em diversidade, exemplifica o professor Nelson Inocencio, coordenador do Núcleo de Estudos Afrobrasileiros da Universidade de Brasília.

Prós e contras"Cotas são necessárias até que se tenha oportunidades iguais", diz especialista

Um sistema amplo de cotas precisa ser bem estudado, tanto a sua instalação quanto a aplicação. Para o professor Nelson Inocencio, a força da lei é necessária quando a sociedade não dá conta de fazer as mudanças por conta própria. No Brasil, ele observa que as cotas raciais são necessárias para promover a maior participação de segmentos antes preteridos. "Quando você faz uma sociedade democrática, ela tem que ser democrática de fato", diz.

Para a cientista política Samira Kauchakje, professora na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, o movimento de cotas é uma "reparação de injustiças e desigualdades socioeconômicas históricas". Para ela, as cotas cada vez mais ganham força da sociedade e apoio institucional dos governos, principalmente do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidente Dilma Rousseff.

No entanto, as cotas podem ser necessárias por um tempo, segundo a professora. "Entendo que é transitório até conseguirmos ser uma sociedade respeitosa, menos assimétrica", observa. "Quando a igualdade se instala, a cor de pele, a preferência sexual, não têm importância." Ela afirma ainda que há um risco, "mas que o ganho supera", de serem reiteradas e reafirmadas diferenças que afinal não são importantes.

Oportunismo

Inocencio acrescenta ainda que nesse processo de cotas é preciso ficar atento aos oportunismos. "Muita gente que não se via negra vai dizer que é com as cotas", diz. Nas universidades públicas, por exemplo, o critério para definir as raças é por autodeclaração, mas em muitas delas os candidatos passam por bancas de avaliação.

Clique aqui e confira o infográfico em tamanho maior

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.