
O número de estrangeiros no Brasil está em declínio nas últimas sete décadas. Em 2010, 433 mil imigrantes responderam ao Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou seja, o equivalente a 0,22% da população. Em países desenvolvidos, como Canadá e Austrália, essa taxa varia entre 22% e 27%. O Brasil chegou a ter 1,3 milhão de imigrantes nos anos 40 do século passado. Embora a queda tenha se acentuado década após década, foi a partir da criação do Estatuto do Imigrante, em 1980, que o número de estrangeiros ficou ainda mais diminuto por causa de regras mais rígidas.
O estatuto proibia, por exemplo, que professores estrangeiros dessem aulas nas universidades brasileiras e exigia que os imigrantes tivessem boa saúde. Esses requisitos hoje já não existem mais. Conforme o antropólogo e professor da Universidade de Brasília (UnB) Roque de Barros Laraia, o modelo de imigração foi estabelecido conforme os preceitos da segurança nacional.
Com a regulamentação do Conselho Nacional de Imigração na década de 90, do qual Laraia foi membro por 17 anos, foram analisados os casos omitidos pela lei e publicadas resoluções, como a que permite a entrada de estrangeiros aposentados no país, o que flexibilizou a política. Porém, segundo o antropólogo, ainda é preciso fazer mais. "O Brasil seguiu a trajetória dos Estados Unidos, que era aberto e de repente fechou as portas para a imigração", aponta.
A diretora do Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça, Izaura Miranda, diz que o país não é restritivo. O departamento traz números diferentes aos do IBGE e expõe que, até junho do ano passado, o Brasil tinha 1,4 milhão de estrangeiros, englobando vistos temporários e permanentes para trabalho, estudo e turismo.
O Ministério do Trabalho e Emprego, que é o órgão que libera os vistos do estrangeiro que entra no país a trabalho, forneceu 142.913 vistos entre os anos de 2008 e 2010. Segundo dados do ministério, 95% desses vistos eram temporários.
Anistia
Nos últimos anos, o governo brasileiro tem se esforçado para regularizar a situação dos ilegais. Em 2009, na mais recente anistia do Ministério da Justiça, um contingente de 45 mil imigrantes foi beneficiado. Para Laraia, a política de anistia é interessante, porém, não engloba todos os imigrantes. "Muitos não se regularizam por ignorância da lei e outros porque preferem continuar clandestinos, sem pagar impostos", diz.
Em outra medida, anunciada neste mês, o Conselho Nacional de Imigração autorizou a emissão de 1,2 mil vistos por ano nos próximos dois anos para cidadãos haitianos que desejam morar no Brasil. Sem trabalho por causa do terremoto que devastou o Haiti há dois anos, eles estão entrando em território brasileiro pelas fronteiras do Acre e do Amazonas.
Lei atual visa proteger mão de obra nacional
A diretora do Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça, Izaura Miranda, explica que a política de imigração adotada no Brasil visa proteger o trabalhador brasileiro. O coordenador de Imigração do Ministério do Trabalho e Emprego, Paulo Sérgio de Almeida, corrobora a afirmação e lembra que a mão de obra estrangeira não pode competir com a nacional. No entanto, o professor Roque Laraia, da Universidade de Brasília, acredita que a política poderia ser reformulada neste sentido. "Acho que deveria haver uma política de captação de pessoas qualificadas. Não faz sentido trazer empregados que não têm qualificação. É aumentar o problema", opina.
Segundo o Ministério do Trabalho, entre 2008 e 2010, 57% dos imigrantes tinham ensino superior. Perto de 80% dos detentores de visto permanente, com validade de cinco anos, podendo ser renovado, têm cargos de chefia ou são investidores. Almeida, que considera que o Estatuto do Imigrante está defasado e precisa ser revisado, aponta que a vinda de mão de obra qualificada é positiva para o país.
Um projeto de lei encaminhado pelo governo Lula em 2009 ao Congresso prevê uma reformulação do estatuto. No entanto, desde março do ano passado, a proposta está parada na Comissão de Turismo e Desporto. Entre as mudanças previstas estão o visto para turismo de negócios e a maior abrangência do Conig, que passaria a ser um conselho de migração, atendendo também a brasileiros que estão no exterior. Hoje, há pelo menos 2 milhões de brasileiros espalhados pelos continentes.
Estabilidade brasileira atrai clandestinos
O bom momento econômico do Brasil não atrai apenas investidores. É cada vez maior o número de imigrantes oriundos de países pobres. Em setembro do ano passado, um grupo de nove nigerianos foi barrado pela Polícia Federal no Porto de Paranaguá após cruzarem o Atlântico clandestinamente em um navio turco.
Nos últimos meses, cerca de 4 mil haitianos entraram no Brasil para fugir da miséria e da violência na terra natal, arrasada por um terremoto em 2010. Desses, 1,6 mil conseguiram visto de residência humanitária emitido pelo Ministério do Trabalho (MT). As principais portas de entrada dos haitianos são as cidades de Brasileia, no Acre, e Tabatinga, no Amazonas.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos censos de 1970 a 2000 houve queda no número de imigrantes vindos de países desenvolvidos, como Portugal, Japão, Itália e Espanha, enquanto aumentou a quantidade de estrangeiros oriundos de nações vizinhas, como Bolívia, Peru, Colômbia e Guiana.
Para a professora de Relações Internacionais da Tuiuti Janiffer Tammy Gusso Zarpelon, esse quadro é negativo. "O Brasil não tem políticas públicas de intercâmbio com países ricos. Ele recebe muitos estrangeiros que saem de países em condições piores que a nossa. Temos o caso dos bolivianos que se sujeitam a trabalhar no Brasil com salários menores que os pagos aos brasileiros", observa.