Na contramão do que é proposto em dois dos oito objetivos do milênio reduzir a mortalidade infantil e melhorar a saúde das gestantes , um problema que revela principalmente as deficiências do pré-natal não tem atenção específica para ser contornado: a morte fetal. Segundo estudo publicado recentemente pela revista britânica The Lancet, 3 milhões de bebês com mais de 4 meses de gestação morrem todos os anos na barriga da mãe ou na hora do parto. No Brasil, em 2008, conforme o Sistema de Monitoramento da Mortalidade Infantil e Fetal do Ministério da Saúde, foram cerca de 32 mil casos.
Em comparação com os nascidos vivos no mesmo ano, mais de 2 milhões, a taxa de incidência do problema fica em torno de 1,5% o que não é considerado alto, mas chega a atingir o dobro da taxa média de 0,7% registrada em países desenvolvidos. O porcentual no Brasil, porém, está subestimado, acredita o presidente da Comissão de Medicina Fetal da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), Eduardo Fonseca. "Em regiões mais longínquas, muitos bebês não ganham a notificação de natimortos, ainda mais quando nascem e morrem no parto, já que os pais acabam enterrando o bebê."
Má formação fetal, infecções maternas, hipertensão, diabete e problemas de desenvolvimento do feto estão entre as principais causas do problema, cujo combate passa por um pré-natal de qualidade. O obstetra e professor auxiliar da Maternidade Victor Ferreira do Amaral, vinculada à Universidade Federal do Paraná (UFPR), Narcizo Eduardo Sobieray, detectou em sua dissertação de mestrado que 46% das mortes chamadas perinatais (que ocorrem após a 28.ª semana de gestação e na primeira semana de vida) ocorrem principalmente pelo fato de a grávida ser hipertensa.
Melhorias
O aperfeiçoamento do pré-natal, acredita Fonseca, passaria pela criação de uma rede eficaz onde houvesse um sequenciamento dos atendimentos. Ou seja, a grávida que é detectada de alto risco deve fazer o pré-natal e o parto em centros especializados. "Uma criança com má formação no coração nasceria em um centro onde é possível realizar uma cirurgia logo após o nascimento."
Melhorar a notificação de casos de morte fetal e estimular o tratamento da sífilis congênita é outra atitude necessária. Apesar de o país já ter o exame de detecção da doença (VLDR) entre os protocolos obrigatórios e ter como meta eliminar a sífilis na gestação e a sífilis congênita no Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, Eduardo Fonseca crê que ainda existem lacunas no que diz respeito à educação sobre a doença. "Ela faz o exame, trata o problema, mas é reinfectada pelo marido. É necessário analisar o contexto familiar."
Para o conselheiro da Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Rio Grande do Sul (Sogirgs) José Geraldo Ramos, o tratamento contra o tabagismo na gravidez é uma atitude importante para diminuir os casos de morte fetal. "Não existem campanhas específicas ou tratamentos no início da gestação para parar de fumar. Seria algo relativamente simples e barato de se implantar no SUS."
Adesão
A ginecologista e obstetra do Centro de Informação e Saúde do programa Mãe Curitibana Lourdes Terezinha Pcheblski ressalta que um dos desafios é aumentar a adesão ao pré-natal precoce. "Muitas vezes a mulher chega [para fazer o exame] no quarto, quinto mês de gestação, quando já não é possível tratar doenças preexistentes. O ideal é sempre começar o acompanhamento médico o mais rápido possível."
A relação médico-paciente é outro ponto para que a gestante volte ao ginecologista e cumpra pelo menos o número mínimo de consultas (seis durante os nove meses). "O médico deve ser claro, sanar todas as dúvidas e mostrar a importância do pré-natal. A conscientização da paciente e a conquista são feitas consulta a consulta", salienta o perceptor da residência médica em Obstetrícia do Hospital Evangélico, Marcelo Guimarães Rodrigues.
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