Em 2002 duas universidades do Rio de Janeiro (UERJ e UENF) adotaram cotas raciais, em 2003, mais uma estadual, do Mato Grosso do Sul (UEMS), e a primeira federal (UnB). O Paraná foi o primeiro estado da Região Sul a adotar tais políticas, com UFPR e UEL iniciando seus programas em 2004. Em 2010 o Ipea apontava que 69 instituições públicas de ensino superior adotavam ações afirmativas, das quais 55 com recorte étnico-racial.
Em 2003 uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo mostrava que 59% da população brasileira concordava com a reserva de vagas para negros na universidade, sendo a concordância maior entre a população negra e muito menor, com somente 18% de concordância, na população com curso superior completo. Ou seja, embora apoiada pela maioria da população, a medida era desaprovada por aqueles que têm mais espaço de expressão de suas opiniões (maior escolaridade e renda).
Como tal política, que passou a ser tratada de "polêmica das cotas", conseguiu tal aumento de adesão de novas universidades? As minorias negra e indígena, que quase não participam de processos internos de universidades, foram tão eficazes em convencer a pluralidade de conselhos universitários espalhados em todas as regiões do país?
O balanço desses dez anos revela que os bons resultados em termos de inclusão pesaram bastante. À medida que as diversas avaliações das políticas foram sendo publicadas, ficou expresso que os estudantes tinham rendimento, na quase totalidade de cursos e universidades, igual ou ligeiramente superior ao dos estudantes que ingressavam pela concorrência geral; os índices de abandono eram muito menores; e o perfil socioeconômico era muito abaixo do que as universidades atendiam antes das cotas, ou seja, a inclusão social acompanhou a racial. Muitos dos estudantes negros/as (na UFPR, a maioria) incluídos pelas cotas foram os primeiros de suas famílias a terem acesso ao ensino superior.
A diversidade racial pôde trazer à tona eventos isolados de discriminação (o mais notório foi o ataque a estudantes africanos na UnB), mas no atacado faz cumprir o objetivo de melhorar a diversidade.
O julgamento pelo STF revela outra face desse processo: ao passo que a defesa da ação de inconstitucionalidade foi realizada por representantes de duas instituições desconhecidas, aos representantes dos movimentos negros se juntaram em posição e argumentos a Advocacia-Geral de União, o Ministério Público, a Defensoria Pública Geral da União e a OAB.
Quando da discussão das cotas na UFPR, em 2003/04, a Andes, maior sindicato de docentes de ensino superior, e a Andifes, associação de reitores de universidade federais, eram contrárias a cotas para negros (as). A Andifes atuou no processo de forma favorável às cotas e a Andes fechou posição de apoio. Ou seja, o leque de instituições de tradição e relevância nacional foi bastante ampliado nesses dez anos. Por óbvio que as mudanças de posição de instituições tão importantes se fez em acordo, de forma discutida, negociada e relacionada com o estudo sobre as desigualdades que pesam sobre a população negra brasileira e a análise de resultados das políticas.
Paulo Vinicius Baptista da Silva, vice-coordenador do Grupo de Trabalho Educação e Relações Raciais da Anped (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação) e coordenador do programa de pós-graduação em Educação da UFPR
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