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Curitiba – Ninguém mantém um funcionário suspeito de roubo. Mas o eleitor parece não ver inconvenientes em reeleger políticos acusados de irregularidades. Exemplos não faltam.

O ex-presidente da República, Fernando Collor, por exemplo, chegou a ter 12% nas pesquisas de intenção de voto para a eleição presidencial seguinte ao seu impeachment.

O ex-prefeito de Londrina, Antônio Belinati, depois de ter sido cassado, preso duas vezes e com uma ficha repleta de investigações no Ministério Público do Estado, quase ganhou as eleições para a prefeitura da cidade em 2004, com 43,5% dos votos válidos no segundo turno das eleições. E os mensaleiros estão aí, prontos para recorrer às eleições de 2004, com grande apoio das lideranças dos partidos.

Na opinião de Cláudio Abramo, da ONG Transparência Brasil, são duas as causas principais desse comportamento: ignorância e pobreza.

"O eleitor não sabe quem são essas pessoas. Se levarmos em conta que 74% dos eleitores são analfabetos funcionais, pessoas que não conseguem entender nada dos mecanismos políticos, é possível compreender porque existe um terreno impune para o aventureiro", afirma.

Refém

Na tragédia do subdesenvolvimento, a política não é algo importante na vida da maioria da população. "O trabalhador acorda cedo, trabalha o dia inteiro, chega em casa cansado e vai dormir. Nesse quadro, ele se torna refém de qualquer político que ofereça facilidades momentâneas. Acontece o que se vê, a troca de votos por alimentos, remédios, cargos e até por dinheiro.

E com as sucessivas reeleições os políticos formam verdadeiras quadrilhas criminosas e fortunas invejáveis", relata Abramo.

No início de 2005, antes da crise política de corrupção no Congresso, com a investigação do mensalão, 102 dos 594 parlamentares, entre senadores e deputados federais, haviam sido mencionados em processos criminais no Supremo Tribunal Federal (STF).

Até dezembro, o número pode passar de 200, se forem incluídos os parlamentares indiciados na CPI dos Correios, dos Bingos e na recém-criada CPI dos Sanguessugas.

"Futebolizar"

Para Armando Antônio Sobreiro Neto, promotor de justiça e coordenador do centro de apoio eleitoral do Ministério Público do Estado do Paraná, o eleitorado também não conseguiu definir ainda uma escala de valores coerente na volta da democracia após a ditadura. "A distorção mais comum é ‘futebolizar’ o pleito eleitoral, a torcida é para ‘ganhar a eleição’, independente de quem está", diz.

Outra erro é rotular os partidos em "pobres" e "ricos". "Os eleitores vão pelas aparências, não questionam seus representantes, se sentem atraídos por pessoas que mostrem ser parecidos com eles, de histórico de baixa renda. E os candidatos se aproveitam dessa ingenuidade e se apresentam de forma humilde, utilizam a linguagem do povão e escondem o patrimônio que tem", diz Sobreiro Neto.

A solução, para o promotor, está na educação para a cidadania. "É preciso recomeçar com os jovens, mostrar quais são as conseqüências do voto nas suas vidas, ajudar que as próprias comunidades repensem soluções para seus problemas e persigam essas metas", avalia.

Lizete Verillo, diretora de Combate à Corrupção da Amarribo, Associação dos Amigos Associados de Ribeirão Bonito (SP) – ONG que conseguiu o afastamento e a prisão de um prefeito corrupto em 2002 e passou a ajudar a fiscalização de prefeitos de outras cidades do país –, é otimista.

"A expectativa é que, com a divulgação da crise política do último ano no Congresso, cheguemos a ter uma renovação de 60% dos parlamentares. O próximo passo é mudar a legislação que permite aos mensaleiros a concorrência a cargos eletivos".

O relator da CPI dos Correios, deputado federal paranaense Osmar Serraglio (PMDB), também tem esperança de que os eleitores façam o que os políticos não fizeram ao absolver no plenário da Câmara deputados com sérios indícios de irregularidades. "Se eles ganharem, depois de tudo o que aconteceu, dá a impressão de que ninguém entendeu nada. Mas eu espero mais do povo". Nós também.

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