A dificuldade dos parlamentares para debater questões espinhosas no projeto de Estatuto da Igualdade Racial tem sua raiz num fenômeno conhecido: os políticos raramente resistem a uma causa que pode render votos. Em 2002, a Fundação Ford, uma das grandes financiadoras do movimento negro no planeta, patrocinou uma pesquisa onde foram ouvidas mais de 23 mil pessoas no país. O resultado mostra que o apoio da população brasileira a medidas genéricas em benefício da população negra supera a marca dos 70%, um índice muito maior do que o apurado nos Estados Unidos, em levantamento semelhante.

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A pesquisa tem um limite: não fez perguntas específicas sobre o regime de cotas, que beneficia um determinado grupo com os chamados privilégios compensatórios e prejudica outro, que passa a competir sob condições mais duras –- como o estudante branco que só teria competência para disputar as últimas classificações num vestibular.

Mesmo assim, o resultado deixa claro que "a população apóia medidas específicas para a população negra", afirma Alberto de Almeida, que coordenou o estudo. "E isso não é coisa de momento. É uma questão de valor para uma geração." Para o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), "a reivindicação tem muita força. Não adianta só falar que tudo vai mudar quando o ensino básico ficar melhor."

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Embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha defendido as cotas durante a campanha presidencial, ministros influentes eram adversários da proposta. Hoje, o governo está fechado com a idéia, integrada ao arsenal da reeleição. O projeto de pedir uma intervenção do Estado nessa matéria é coerente com o programa do PT, mas não combina com a plataforma de defesa dos valores individuais e do mercado, do PFL de Rodolpho Tourinho. "Não se pode assistir ao drama social dos negros brasileiros sem fazer nada", argumenta Tourinho. "Essa é uma forma de distribuir renda e até de retirar cidadãos da marginalidade."

O relator do projeto de estatuto na Câmara, o deputado Reinaldo Germano (PP-BA) chegou a Brasília como pastor da Igreja Universal do Reino de Deus. Deixou as causas religiosas para se engajar nas causas contra o racismo. Dobrou de votação de um mandato para outro e já planeja concorrer à prefeitura de Salvador no próximo pleito. Não é mais pastor e só freqüenta a Igreja como fiel. Germano tem seu quintal eleitoral na Bahia, assim como o senador Tourinho. Outra liderança importante da Câmara, o deputado Luiz Alberto (PT-SP) também é um dos mais envolvidos na causa negra em Brasília. As estatísticas mostram que de cada 10 eleitores baianos, 8 são negros.