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Novo presídio suscita debate sobre a função do estado na reabilitação do encarcerado | Samuel Costa/Jornal Hoje em Dia
Novo presídio suscita debate sobre a função do estado na reabilitação do encarcerado| Foto: Samuel Costa/Jornal Hoje em Dia

Crítica

Projetos reacendem debates e geram conflitos éticos

O complexo de Ribeirão das Neves e o de Itaquitinga, a cerca de 60 quilômetros do Recife, em Pernambuco, serão as primeiras Parcerias Público-Privadas (PPP) de presídios no Brasil. Os projetos reacenderam o debate sobre os limites da participação da iniciativa privada no sistema penitenciário, o que já é uma realidade no país. Há hoje no Brasil 26 prisões em seis estados — Bahia, Sergipe, Santa Catarina, Espírito Santo, Tocantins e Amazonas — que são administradas por sete empresas privadas em contratos de cogestão.

O número de presos em presídios privados (19.428), equivale a 3,5% do total de 549.577 que formava a população carcerária no Brasil em junho deste ano, segundo dados do Ministério da Justiça. O primeiro presídio a ser privatizado foi a Penitenciária Industrial de Guarapuava, no Paraná, em 1999, uma iniciativa do então governador Jaime Lerner. O governo federal mantém silêncio sobre o tema e não dispõe de indicadores comparativos entre presídios públicos e privados, mas o potencial de crescimento das privatizações já mobiliza defensores e críticos no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas estaduais. Uma das principais críticas que se faz à privatização dos presídios é o conflito ético-filosófico-criminal da prática: como uma instituição que tem como objetivo básico o lucro pode cuidar do processo de execução penal de um ser humano, sua privação de liberdade, e bancar sem mesquinharia o seu processo de ressocialização?

R$ 2.700 por mês é o que vai custar cada preso no novo presídio. Nas penitenciárias do estado de Minas, cada encarcerado custa R$ 2 mil por mês.

4.665 dos 15.809 presos em condição de trabalho integram 486 canteiros de obras em 29 estabelecimentos penais do estado.

  • Encarcerado lê na penitenciária estadual de Piraquara

A 45 minutos do centro de Belo Horizonte, no município de Ribeirão das Neves, cerca de 1.600 operários trabalham freneticamente em três turnos, sete dias por semana, na construção de um complexo penitenciário de 2.500 metros quadrados com cinco presídios e capacidade para abrigar 3.040 presos em celas para uma, quatro e seis pessoas. O primeiro prédio, de regime fechado, com capacidade para 608 presos, será inaugurado em janeiro e lembra um complexo de segurança máxima, com seu aspecto de fortaleza e controle de portas e celas, além de um aparelho para escanear o corpo inteiro – no estilo dos aeroportos americanos, capazes de mostrar objetos nos lugares mais impensáveis do corpo humano.

A penitenciária nova poderia ser mais uma na geografia carcerária da cidade, que já abriga outros cinco presídios, não fosse um detalhe: trata-se da primeira Parceria Público-Privada (PPP) de penitenciária a ser inaugurada no país. A discussão das PPPs nos presídios se aprofunda no momento em que o Brasil convive com um déficit de cerca de 170 mil vagas e condições degradantes no sistema penitenciário.

Privatização?

O investimento na construção do complexo de Ribei­rão das Neves, de R$ 280 milhões, foi bancado pelo consórcio GPA, que ganhou a licitação com o governo de Minas em 2009 e será responsável pela administração de tudo nos presídios, com exceção do acompanhamento da execução penal dos presos. E por 27 anos, o que faz muita gente considerar o projeto, na prática, a privatização dos presídios brasileiros.

"Decidimos criar uma PPP que deixasse nas mãos da iniciativa privada a construção e administração do presídio, enquanto nós tomamos conta da obrigação constitucional de administrar a execução da pena," afirma Rômulo Ferraz, secretário de Defesa Social de Minas. "Não há privatização. O que estamos fazendo é contratar de forma inteligente", completa.

As atribuições serão divididas. Serviços de execução penal, como monitoramento, sanções disciplinares, movimentação de presos, escoltas, intervenções especiais e vigilância, serão desempenhados pelos funcionários do governo. O resto será gerenciado pelos funcionários da GPA, que não trabalharão armados e receberão a partir de R$ 1.300 por mês.

"É um divisor de águas, porque traz um elemento de gestão transformador. Se não cumprirmos os indicadores, recebemos penalidades financeiras," diz Rodrigo Gaiga, diretor do consórcio GPA e coordenador do complexo pelo grupo. Pelo contrato, o complexo de Ribeirão das Neves não poderá abrigar mais do que as vagas disponíveis, evitando o problema da superpopulação carcerária.

IniciativaNo Paraná, associações pretendem desafogar o sistema prisional

Diego Antonelli

No Paraná, as Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (APACs) estão sendo implantadas em seis municípios do estado: Barracão, Loanda, Londrina, Ponta Grossa, Foz do Iguaçu e Lapa. O objetivo é facilitar a reintegração social dos condenados e reduzir o número de presos em penitenciárias.

Segundo a secretária estadual de Justiça, Maria Tereza Uille, as associações são convênios firmados com entidades municipais para desafogar o sistema prisional. "Dessa forma, colaboramos para a reinserção social do apenado e podemos aumentar as vagas no regime semiaberto", afirma. Ela salienta que não se trata de uma parceria público-privada. "São convênios que estão sendo formalizados com a comunidade".

Em Barracão, no Sudoeste, a implantação está mais avançada. Em setembro, o governo do estado assinou o convênio e formalizou o repasse de R$ 766,5 mil. Inicialmente participarão 40 presos da região, num trabalho que conta com a participação da sociedade civil organizada do município, como Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e lideranças da sociedade civil organizada. Segundo a Secretaria Estadual de Justiça, este modelo somente está sendo possível pela união de forças dos poderes Executivo, Legislativo, Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, da OAB-PR e da sociedade civil organizada. No Brasil, as associações já existem em 17 estados.

Neste sistema, os próprios presos são corresponsáveis pela sua recuperação, tendo assistência espiritual, social, médica, psicológica e jurídica prestada por voluntários da comunidade.

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