Em liberdade assistida, jovem frequenta curso obrigatório de informática| Foto: Christian Rizzi / Gazeta do Povo

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O que pode ser feito para aprimorar o processo de ressocialização dos jovens infratores?

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Em meio à retomada do debate sobre a redução da maioridade penal, dados da Secretaria da Família do Paraná e do Conselho Nacional da Justiça revelam que as medidas de restrição e privação de liberdade afetam apenas uma pequena parcela dos jovens infratores no estado. Das cerca de 5 mil crianças e adolescentes em conflito com a lei no estado, 91% estão em regime aberto – medida adotada em casos menos graves e defendida por profissionais da área. O problema é que o preconceito e a falta de estrutura dos municípios, responsáveis pelos atendimentos, são barreiras à recuperação desses jovens.

Os adolescentes que cumprem medidas em meio aberto, ou seja, não estão internados em unidades de ressocialização, são inseridos em programas sociais oferecidos pelas prefeituras. Já aqueles submetidos à privação e restrição da liberdade ficam sob a tutela do Estado e são encaminhados para um dos 18 Centros de Socioeducação (Censes) ou das seis casas de semiliberdade existentes hoje. Juntas, essas unidades têm capacidade para atender 1,1 mil adolescentes.

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Alternativas

Os principais programas criados para atender aos jovens que cumprem medidas em meio aberto são a Liberdade Assistida (LA) e a Prestação de Serviço à Comunidade (PSC). No primeiro, o adolescente é obrigado a cumprir uma rotina, que inclui estudar, fazer cursos profissionalizantes e atividades com os pais. No segundo, precisa prestar serviços sem remuneração, em órgãos públicos, com jornadas que não interfiram no horário escolar ou de trabalho. A proposta de ambos os programas inclui o acolhimento familiar e o apoio direto ao jovem. Mas as dificuldades para colocar em prática as medidas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) são inúmeras.

Em Foz do Iguaçu, são poucos os órgãos públicos que aceitam o trabalho feito pelos jovens inseridos na PSC. Quando concordam em receber o serviço, as instituições oferecem atividades consideradas desmotivadoras pelos jovens – lavar banheiros e varrer pátios.

Estudo

Outro entrave é a dificuldade para encontrar vagas nas escolas públicas. "Tem adolescente que há três anos não consegue se matricular nas escolas. Há muito preconceito", diz a coordenadora do Centro de Referência Especializado em Assistência Social (Creas) II de Foz do Iguaçu, Cristina Souza Dias.

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Algumas escolas oferecem vagas, mas os jovens não podem frequentar as aulas porque o colégio fica distante do bairro onde moram e eles não dispõem de dinheiro para pagar o transporte.

Além disso, alguns adolescentes têm a capacidade cognitiva comprometida pelo uso de drogas e não conseguem ter um desempenho satisfatório. A cidade também não tem abrigos para adolescentes infratores ameaçados de morte. Neste ano, ao menos dois jovens que cumpriam medidas em meio aberto foram assassinados.

Atendimento à família é deficitário

A promotora da Infância e Juventude do Ministério Público do Paraná, Luciana Linero, diz que, conforme o artigo 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a internação só se justifica quando o ato infracional cometido envolve grave ameaça, violência, reiteração de infrações graves ou descumprimento de medidas anteriores.

Na avaliação da promotora, o quadro é positivo, porque a medida socioeducativa em meio aberto é mais eficaz do que a restritiva da liberdade, pelo fato de trabalhar com o adolescente e a família.

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O problema é que esse atendimento à família ainda é deficitário em alguns municípios do estado, pela falta de orçamento das prefeituras e a inexistência de programas especializados. "A proposta que a legislação tem é muito boa. A nossa dificuldade está na aplicação prática dela. Esbarra-se nas dificuldades que os municípios apresentam em relação à destinação orçamentária para essa área, que não é considerada tão prioritária", afirma.

Apoio psicológico

De acordo com Luciana, o acompanhamento aos familiares dos jovens infratores precisa dar resultado para o adolescente encontrar outra realidade quando retornar ao lar. Isso envolve mudanças do ponto de vista econômico e psicológico. Em alguns casos é preciso oferecer tratamento de saúde para os pais, alguns alcoólatras, ou renda para a mãe, cujos maridos estão presos.

Programa estadual prevê cursos para pais e filhos

A coordenadora do Centro de Referência Especializado em Assistência Social II (Creas II) de Foz do Iguaçu, Cristina Souza Dias, diz que o panorama em relação ao apoio familiar deve mudar a partir da implantação do programa Atenção às Famílias dos Adolescentes Internados por Medidas Socioeducativas (Afai) na cidade. Está prevista a contratação de 11 profissionais, entre psicólogos, pedagogos e assistentes sociais, e a instalação de um ambiente para oferecer atividades às famílias e aos adolescentes.

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Projeto do governo do estado, o Afai oferece inúmeras ações, como cursos e atividades conjuntas entre pais e filhos. A prioridade é o atendimento a famílias de adolescentes internados.

Apesar do avanço na área da família, Foz do Iguaçu ainda precisa de uma clínica de internação para adolescentes dependentes de droga, além de espaços de cultura e lazer para os jovens frequentarem nos fins de semana.

Novas escolhas

Após três meses internado, rapaz faz planos para o futuro

João* é um dos adolescentes atendidos pelo Programa Liberdade Assistida em Foz do Iguaçu. Há pouco tempo, ele foi apreendido quando tentava cruzar a fronteira do Brasil com o Paraguai transportando maconha.

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Depois de passar três meses internado no Cense, começou a cumprir medida socioeducativa em meio aberto. Uma das tarefas que ele precisa cumprir atualmente é frequentar um curso de informática na sede do programa. João já pensa no futuro. "Quero fazer Engenharia Civil", diz.

O menino de 16 anos está motivado e não pensa em voltar a cometer a infração que o privou da liberdade. Na época, absorvido pelo desejo de ganhar dinheiro fácil, ele decidiu, por conta própria, ir ao Paraguai para comprar droga e vender no Brasil. Assim, ganharia cerca de R$ 1 mil de maneira fácil, mas nada compensadora. "Fiquei três meses no Cense. Tem gente que gosta de lá como se fosse casa, mas eu não", diz.

* nome fictício