Tratamento
Atrasado, credenciamento de comunidades é polêmico
Aguardado desde 2012, o edital para credenciamento de comunidades terapêuticas em Curitiba deve ser lançado em março, segundo o planejamento da gestão atual. Está previsto o credenciamento de 120 leitos, a um valor total de R$ 1,2 milhão ao ano. O processo, porém, já suscita críticas antes mesmo de ser lançado. Uma das exigências previstas é que as comunidades não tenham nenhum vínculo com programas do governo federal ou estadual. Essa possibilidade é criticada pelas entidades, que dizem que o favorecimento ou restrição de concorrência são ilegais.
"Faremos isso para alcançar um número maior de entidades, que hoje não têm ajuda alguma de financiamento, mas que fazem um trabalho sério. Aquelas estabelecidas já têm boa fonte de recursos", explica Diogo Busse, do Departamento de Política sobre Drogas. Segundo ele, as entidades terão de se enquadrar nas normas legais e sanitárias.
Para o coordenador técnico da Casa de Recuperação Água da Vida, Flavio Lemos, o credenciamento funciona como uma licitação pública. "Sendo assim, não pode haver favorecimento. Deve permitir a participação de todos os interessados", diz ele, que também faz parte do Conselho Municipal sobre Drogas (Comped). "Essa discussão não passou pelo conselho, e acho que lá também seria questionada", observa. Lemos diz que o poder público precisa ajudar as comunidades a se estruturarem, para que depois elas tenham condições de concorrer aos editais lançados.
João Honório Bueno, coordenador da Casa de Apoio Belém, também vê com preocupação a restrição. "Em um edital do governo federal de 2010 demorou um ano para a gente começar a receber. O convênio que temos atualmente vence em novembro", conta. A casa pretendia se candidatar às vagas custeadas pelo município. "Os dependentes não podem ficar sem tratamento por causa da burocracia", diz ele.
Eficácia
Elogiadas por internos, casas de apoio são desprezadas por ministro
"Antes eu não tinha horário para nada. Aqui tem horário para acordar, dormir, ver televisão, trabalhar, almoçar. Só assim estou conseguindo mudar meus hábitos e ficar livre das drogas", conta Maurício Maio Rabiço, 34 anos, a respeito da internação na Casa de Apoio Belém. Para ele, as comunidades terapêuticas proporcionam um tratamento continuado que não existe nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps). A casa tem capacidade para 15 pessoas, que se organizam e dividem as atividades diárias na cozinha e nas demais áreas comuns.
Apesar dos elogios, as comunidades terapêuticas já foram execradas pelo atual ministro da Saúde, Arthur Chioro, quando ele chefiava a pasta no município de São Bernardo do Campo (SP). "As comunidades terapêuticas representam atraso, segregação".
Para a professora de Farmacologia Roseli Boerngen de Lacerda, as críticas às comunidades são defasadas. "Essas casas representam mais uma opção de tratamento e muitas pessoas se beneficiam delas. Aquela visão de que nas comunidades há apenas fundamentalismo religioso, sem embasamento em terapia, é defasada. Elas evoluíram."
Com menos dinheiro em 2014, a Prefeitura de Curitiba quer avançar no combate e tratamento do uso de drogas. A Secretaria Municipal da Defesa Social pretende lançar, a partir de março, um conjunto de ações para ampliar a rede de atendimento nas comunidades terapêuticas, executar o programa Mães contra o Crack e ofertar serviços básicos de saúde e cultura para as pessoas em condição mais vulnerável, em unidades móveis. Apesar de o orçamento previsto para a política antidrogas ter sofrido corte de quase 50%, a pasta pretende atingir os objetivos com a ajuda do governo federal e de uma rede formada pela sociedade civil organizada e líderes comunitários.
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Os recursos previstos para a Secretaria Municipal Antidrogas em 2013 totalizavam R$ 7,3 milhões, mas nem foram executados integralmente. O orçamento havia sido feito pela gestão anterior, e, quando Gustavo Fruet assumiu, no ano passado, ele fundiu a Secretaria Antidrogas com a Defesa Social. Para 2014, o orçamento municipal prevê R$ 3,8 milhões para a política antidrogas.
Segundo o diretor do departamento de política sobre drogas da prefeitura, Diogo Busse, ele defendia a redução da estrutura desde 2012, quando presidiu a Comissão de Direito e Dependência Química da OAB-PR. "Dizia que era possível reduzir o quadro, mas qualificá-lo, e é o que estamos procurando fazer. Temos parceria com a sociedade civil, entidades religiosas e o governo federal. Isso nos permite fazer um trabalho com mais alcance do que antes", afirma.
A concepção da política contra as drogas também sofreu modificações, explica Busse. Anteriormente, diz ele, a secretaria tinha um caráter mais repressivo, e agora o foco é humanitário. Isso ficará mais visível em março, quando está previsto o lançamento de dois ônibus adaptados que vão circular pela cidade. Serão módulos móveis direcionados à população mais vulnerável, com espaço para higienização, consulta com agentes de saúde, psicólogos e psiquiatras. "É o primeiro passo para a inclusão dessa população. Não haverá nenhuma precondição de abstinência. Mas a ideia é gerar um vínculo, sensibilizá-los para um tratamento em fase posterior."
A professora de Farmacologia da UFPR Roseli Boerngen de Lacerda explica que esse tipo de ação é positiva, pois permite que o poder público conquiste a confiança dos drogados. "Isso tem evidência científica. É preciso ir até o viciado, não dá para ficar dentro de uma casinha esperando que ele vá se tratar."
A professora alerta para o risco dos governantes deixarem de lado avanços conquistados por adversários políticos. "Por sorte, em Curitiba, temos evoluído constantemente nessa área, e há boas perspectivas."
Outro projeto em vista é o Mães contra o Crack, para o qual a Prefeitura de Curitiba havia conquistado, ainda em 2012, R$ 1,5 milhão do Ministério da Justiça. Porém, o programa não chegou a ser executado na cidade.
Curitiba é 2.ª em consumo de drogas ilícitas entre alunos
Estudantes do 9.º ano do ensino fundamental de Curitiba estão entre os que mais consumiram drogas ilícitas alguma vez na vida. Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (Pense), divulgada pelo IBGE no ano passado, 14,4% dos alunos da cidade já experimentaram drogas como maconha, cocaína, crack, cola, loló, lança perfume e ecstasy. O porcentual é o segundo maior do Brasil, atrás apenas de Florianópolis (17,5%). Na média das capitais, o valor é de 9,9%. A pesquisa foi amostral, com 2,1 mil estudantes em Curitiba e 109,1 mil em todo o Brasil.
Para reverter essa situação, a Prefeitura de Curitiba informa que investe em ações de prevenção nas escolas, especialmente na rede pública. "Embora a gente procure não trabalhar com estigmas, há uma prevalência de consumo no ensino público, em comunidades periféricas e no público jovem", explica Diogo Busse, do Departamento de Política sobre Drogas. "O principal gargalo é a questão da linguagem, como disseminar conteúdo educativo e preventivo. A cultura do medo não atinge os jovens", relata.
Famílias
A administração municipal também tem investido em palestras com líderes comunitários e agentes públicos, como guardas civis e servidores das administrações regionais. Entre julho e dezembro, foram capacitadas 600 pessoas, segundo Busse. Um convênio com o governo federal, que deve ser implantado a partir de março, pretende criar equipes multidisciplinares para orientação direta nas comunidades. A meta é atingir 8 mil famílias.
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