O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP) julgou procedente a ação do Ministério Público Estadual, protocolada em setembro de 2021, contra a Prefeitura de Ibaté, no interior paulista, sobre a utilização de recursos da educação, especialmente do Fundeb, para a compra de um terreno que tem 57% da sua área destinada à construção de uma rodoviária. A sentença, publicada no último dia 9 de agosto, é contra o atual prefeito de Ibaté, José Luiz Parella, do PSDB, reeleito em 2020.
O TCESP emitiu decisão sobre o assunto no dia 24 de agosto, na qual julgou a representação procedente e determinou o encaminhamento dos autos ao MP-SP para devidas providências que julgar necessárias.
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De acordo com a sentença do TCESP, o terreno de 3.009,82 m² foi comprado há dez anos, em 2012, quando Parella também era Perfeito de Ibaté, com parte de recursos do município destinados à educação e verbas do Fundeb e do Salário Educação. A aquisição foi autorizada para a implantação de um complexo educacional, com escola, biblioteca e outros edifícios interdisciplinares. Em 2020, durante o terceiro mandato de Parella como prefeito (ele foi reeleito em 2016, após ficar oito anos fora da Prefeitura), 57% do terreno (1.718,40 m²) acabou sendo desviado para uma promessa de campanha, a construção da rodoviária.
A desapropriação do terreno custou R$ 1,8 milhão, sendo custeada integralmente com verbas do orçamento educacional. Do Fundeb, foi utilizado o valor de R$ 320 mil. Segundo o TCESP, houve "desvio de finalidade nas despesas relacionadas à manutenção e desenvolvimento do Ensino e consequente afronta ao previsto nos artigos 70 e 71 da Lei de Diretrizes e Bases". Por lei, tanto o Fundeb como as outras verbas utilizadas devem ser aplicados exclusivamente na manutenção e no desenvolvimento da educação básica pública, bem como na valorização dos profissionais da educação.
Ao Ministério Público Estadual, a Procuradoria municipal alegou que "a construção do Terminal Rodoviário foi custeada com recursos livres do orçamento, após regular processo de licitação na Concorrência nº 01/2020, não se submetendo, assim, à deliberação do Conselho Municipal de Educação".
De acordo com a sentença do TCEESP, no entanto, as justificativas da defesa não conseguiram descaracterizar as irregularidade já que o terreno, de fato, comprado com recursos da educação, está sendo utilizado para outra finalidade.
Após a publicação desta matéria, a Prefeitura respondeu nesta quarta-feira (14) aos questionamentos da reportagem da Gazeta do Povo, enviados na semana passada. De acordo com a assessoria de imprensa, era necessário frisar que o dinheiro do Fundeb não tinha sido utilizado para a construção da rodoviária, e sim para a compra do terreno para essa edificação.
Sobre o uso do dinheiro da educação para a compra desse terreno, a Prefeitura afirmou que teria ocorrido uma mudança na finalidade da destinação do dinheiro, sem prejuízo para a rede municipal de ensino, o que para os gestores não seria algo ilegal ou imoral, já que o mesmo volume de dinheiro teria sido destinado a educação por outros meios. A Prefeitura ainda não explicou, no entanto, por que utilizou o dinheiro da educação se tinha recursos próprios para a compra do terreno.
Fundeb usado para outros fins
Em levantamento feito no ano passado sobre as contas correntes do Banco do Brasil beneficiárias de recursos do Fundeb, o Tribunal de Contas de União (TCU) encontrou, entre outros indícios de irregularidades, a existência de créditos estranhos ao Fundo em contas bancárias de 3.113 municípios.
Das 27 Unidades da Federação, segundo informações do TCU, apenas as contas bancárias de oito estados não apresentaram créditos estranhos ao Fundo: Acre, Alagoas, Ceará, Goiás, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Roraima. Em nível municipal, em 3.113 municípios também foram detectados dados irregulares ao Fundo nas contas bancárias específicas. Em 2.926 municípios, o CNPJ titular da conta não era o órgão responsável pela Educação.
A Gazeta do Povo mostrou no início deste ano como os estados e municípios têm aplicado o excedente (chamado popularmente de “sobras do Fundeb”) em finalidades controversas. Como exemplo, estão investimentos em obras e equipamentos que não dialogam com a melhoria efetiva da qualidade da educação.
Um projeto de lei de autoria do prefeito Rafael Freire (PSB) aprovado pela Câmara de Vereadores de Alpinópolis em Minas Gerais, por exemplo, autorizou o emprego de aproximadamente R$ 1 milhão na construção de uma garagem para apenas dez veículos da secretaria de Educação com recursos oriundos do Fundeb. Diante da má repercussão, o valor foi reduzido a R$ 800 mil, uma redução de apenas 20% do valor inicial.
Na época, um docente da cidade mineira que preferiu não se identificar falou com a Gazeta do Povo: “O valor é absurdo para a construção de um barracão para guardar os dez veículos da Educação do município de Alpinópolis”, disse. “Esse dinheiro poderia ter sido utilizado para melhorar a estrutura das escolas, mas não houve planejamento para que esse quase um milhão de reais fosse investido diretamente nas escolas. Um descaso com a comunidade escolar”, prossegue.
A Gazeta do Povo entrou em contato com o Ministério da Educação para saber mais sobre a tentativa de controle em relação ao uso indevido do Fundeb por parte de alguns gestores, mas não obteve retorno. A assessoria do MEC apenas informou: "Estamos aguardando resposta da área técnica, que, neste caso, é o FNDE. Assim que tivermos as respostas, encaminharemos".
Recursos do Fundeb
Novas regras que aumentaram ainda mais os recursos do Fundeb passaram a vigorar no ano passado, após o presidente Jair Bolsonaro sancionar a Lei 14.113/2020. Desde a sanção do Novo Fundeb, houve um aumento expressivo dos recursos destinados para a educação básica. No ano passado, o valor total repassado aos estados e municípios, no âmbito do Fundeb, foi de R$ 194 bilhões. Neste ano, a receita total do Fundeb estimada para este terceiro quadrimestre é de R$ 255,9 bilhões. Os municípios mais pobres, principalmente das regiões Norte e Nordeste, dependem quase que exclusivamente dessa fonte de recursos.
De acordo com a lei, 70% dos recursos devem ser empregados na remuneração dos servidores da educação, enquanto os 30% restantes devem ser empregados em custeio de materiais didáticos, equipamentos para a escola, entre outros custos considerados despesas de manutenção e desenvolvimento do ensino.
No montante para 2022, R$ 222,6 bilhões correspondem ao total que Estados, Distrito Federal e Municípios contribuem para o Fundo; R$ 22,2 bilhões referem-se à complementação-Valor Aluno Ano do Fundeb (VAAF) e R$ 11,1 bilhões são da complementação - Valor Aluno Ano Total (VAAT) da União ao Fundo.
A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) divulgou no dia 2 de setembro uma estimativa de quanto cada município brasileiro deve receber do Fundeb ainda neste ano. Segundo o levantamento da CNM, somente o estado de São Paulo receberá R$51,2 bilhões do Fundo.
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