O presidente da Sabesp, Jerson Kelman, afirmou que haverá reavaliação do período de sigilo de alguns dados operacionais da empresa. A estatal de água do governo Geraldo Alckmin (PSDB) tornou sigilosas as informações sobre procedimentos e projetos técnicos e operacionais do abastecimento hídrico de São Paulo. Com o carimbo de “secreto”, todos documentos sobre o tema apenas serão divulgados daqui a 15 anos, em 2030.
O carimbo de “secreto” se refere ao grau de sigilo previsto na Lei de Acesso à Informação, que entrou em vigor em 2012 e permite a qualquer cidadão requisitar documentos do setor público. Os demais carimbos são “ultrassecretos” (25 anos) e “reservado” (5 anos) -esses prazos de sigilo ainda podem ser prorrogados por uma vez.
A Sabesp também vai rever a posição inicial e divulgar nesta semana os nomes das entidades (em sua maioria hospitais) que receberam intervenções para ficarem de fora de um eventual rodízio -que tem possibilidade baixa de ocorrer atualmente.
Mesmo assim, diz Kelman, dados como detalhes de onde estão os canos da empresa e válvulas de controle deverão permanecer ocultos. Ele afirma que esse segredo visa a segurança de informações operacionais e do abastecimento público.
Em nota, a Sabesp disse que “informações sobre instalações subterrâneas da Sabesp são sigilosas para evitar eventuais atos de sabotagem ou vandalismo que colocariam em risco a vida, segurança ou saúde da população”.
Segundo Kelman, no início do ano, quando a Sabesp fez a lista de 492 locais que ficariam sem cortes de água, a Grande SP vivia a perspectiva não só de um rodízio, mas de um colapso de seu abastecimento situação em que não seria possível fornecer água para a cidade, nem mesmo de maneira alternada.
O fato de os lugares que ficariam fora de um rodízio estar sob sigilo, de acordo com ele, foi uma escolha da Sabesp para proteger esses pontos na eventualidade de colapso.
“Se em uma situação normal já se faz gato [roubo de água], imagine em uma situação de colapso”, disse ele.
A empresa também deverá explicar os critérios que a fizeram chegar a esta lista. Segundo Kelman, entre outros elementos, ela levou em conta a quantidade de pacientes em hospitais e a vulnerabilidade deles em cada ponto.
O secretário Benedito Braga (Recursos Hídricos), que esteve em Brasília, disse que “esses dados têm que ser preservados” por uma “questão de segurança pública”.
“É o Pentágono dizer onde ele tem agentes para combater o Estado Islâmico. É a mesma coisa”, disse Braga, para quem a polêmica era “dessa turma aí que quer fazer bagunça” -referência a entidades críticas à gestão hídrica de SP e que protestou contra prêmio dado a Alckmin.
Documentos sigilosos
No caso da Sabesp, a classificação de sigilo foi feita após o portal “iG” ter solicitado, por meio dessa lei, a lista completa dos pontos da Grande SP que não teriam seu abastecimento interrompido durante a eventual implantação de um rodízio (corte do fornecimento de água).
Esses 492 pontos são, de acordo com a Sabesp, “prioritariamente” hospitais, clínicas de hemodiálise, além de delegacias e presídios. Segundo o “iG”, o portal solicitou os dados em março, por meio do SIC (Serviço Estadual de Informações ao Cidadão).
A Sabesp negou o acesso à lista, alegando que a informação poderia trazer “ameaça ao sistema de abastecimento público de água”, além de “enorme prejuízo à sociedade, podendo ensejar inclusive depredações e violência contra os órgãos do Estado”.
Ao “iG” a estatal alegou ainda que detalhes de suas operações poderiam ser inclusive usadas no planejamento de ações terroristas que, mesmo em sob hipótese remota, não podem ser descartadas.
O portal buscou um recurso, mas, antes disso, a Sabesp classificou como “secretas” todas as informações sobre procedimentos e projetos técnicos e operacionais da empresa, o que impediu o acesso à essa lista dos locais que não teriam água cortada.
O decreto, porém, não deixa claro quais seriam esses procedimentos e projetos, o que abre brecha à Sabesp para negar acesso a outras informações técnicas sobre a crise da água no Estado.
Essa decisão segue a mesma linha de decreto da Secretaria do Estado de Transportes Metropolitanos que, no ano passado, classificou como “ultrassecretos” documentos de trens e Metrô.
A medida foi revogada na semana passada, após a Folha de S.Paulo ter revelado o caso.
Rodízio de água
Um rodízio de água chegou a ser cogitado no início deste ano, no auge da crise. Mas, com as chuvas de fevereiro e março e a ampliação do racionamento (entrega controlada de água), a medida foi descartada, ao menos neste ano.
A identificação dos locais que não poderiam ficar sem água foi feita pela Sabesp para a elaboração de um “Plano de Contingência” exigido por prefeitos da Grande SP.
O plano, no entanto, está engavetado na gestão estadual. Alckmin chegou a chamá-lo de “papelório inútil”.
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