Além de ter ficado preso preventivamente de forma ilegal e de estar cumprindo medidas cautelares abusivas, Filipe Martins, ex-assessor especial para assuntos internacionais do governo Bolsonaro, também acabou atingido por questões políticas internas do Departamento de Polícia Penal do Estado do Paraná (Deppen-PR).
Em seis meses, conflitos políticos resultaram na destituição de dois diretores do Complexo Médico Penal de Pinhais (CMP), onde Martins estava preso.
Em fevereiro de 2024, poucos dias antes de Martins ser transferido ao presídio, o CMP tinha sido alvo de denúncias sobre condições precárias nas redes sociais e em veículos de comunicação. A chegada do ex-assessor de Bolsonaro atraiu ainda mais o foco ao presídio e influenciou um jogo de poder interno entre agentes penitenciários do Deppen, de acordo com a defesa de Martins.
O estopim dessa situação ocorreu na última sexta-feira (9), quando Martins foi mantido na prisão por horas mesmo após a liberação pela Justiça.
O coordenador dos presídios da região administrativa de Curitiba, Emerson Chagas, insistiu que, antes de sua saída, era imprescindível a instalação da tornozeleira eletrônica. Para a defesa, a exigência só ocorreu por causa da rixa de certa ala de agentes públicos contra Filipe Martins.
Segundo informações fornecidas pela defesa, o alvará de soltura foi cumprido por volta das 10h e, no mesmo horário, Martins assinou um termo se comprometendo a entrar em contato com as autoridades para instalação da tornozeleira dentro de cinco dias.
Entretanto, o advogado de Martins, ao tentar finalizar os procedimentos de soltura, foi surpreendido por um funcionário da unidade que informou a tornozeleira precisaria ser instalada no próprio presídio, contrariando o termo de compromisso assinado antes.
Agentes penitenciários alegaram que não havia tornozeleira eletrônica disponível naquele momento, e que Martins precisaria aguardar até que o equipamento chegasse. Geralmente, nos casos em que não há tornozeleira no momento da liberação, o equipamento pode ser instalado até cinco dias depois que a pessoa já foi liberada da prisão.
Não foi o que aconteceu, contudo, no caso de Martins. Em defesa do coordenador dos presídios, o Deppen alegou que esse é o "procedimento padrão realizado no ato da soltura".
Mas, segundo fontes ouvidas pela Gazeta do Povo que conhecem casos recentes de liberação de detentos do Complexo Médico Penal, é comum que a tornozeleira eletrônica seja instalada só depois da liberação.
A defesa denunciou publicamente o impasse pelas redes sociais, sugerindo que o Deppen e o coordenador dos presídios estavam agindo intencionalmente para postergar a soltura de Filipe Martins, por animosidade contra seu cliente.
Em junho, em entrevista ao podcast do jornalista Claudio Dantas, o desembargador aposentado Sebastião Coelho, advogado de Filipe Martins, já havia dito que o então diretor do CMP, Edwaldo Willis de Carvalho, queria transferir Martins de ala no presídio para prejudicá-lo, e também havia tentado impedi-lo de trabalhar na biblioteca. Ainda o acusou de ter ligação política com o PT. Dias depois, Carvalho saiu do cargo e foi substituído por Rafael Jenhevski.
Em meio ao impasse da tornozeleira, Jenhevski pediu dispensa da função – segundo fontes ouvidas pelo jornal, ele estava irritado com a situação de ingerência no presídio e com o descumprimento do protocolo correto por questões políticas.
No meio da tarde da sexta, a defesa de Martins entrou em contato com alguns parlamentares paranaenses para que eles ajudassem a resolver o impasse. Pouco tempo depois da chegada do deputado estadual Ricardo Arruda (PL-PR) ao CMP, por volta das 18h30, Martins foi liberado com a tornozeleira instalada.
CMP já sofreu interdição ética e foi descrito por defensora pública como "precário e insalubre"
Nos últimos anos, a situação do Complexo Médico Penal de Pinhais tem sido alvo de críticas, com denúncias frequentes de tratamento cruel e condições precárias. Em 2022, o Conselho Regional de Medicina do Paraná chegou a realizar a interdição ética do CMP.
Em maio de 2024, em inspeção realizada no CMP, uma defensora pública concluiu que "a unidade não possui condições estruturais nem recursos humanos suficientes para operar dentro da legalidade." "Foi observado que a estrutura física é precária e insalubre, falta de banho de sol, incomunicabilidade e restrição de direitos das pessoas em triagem, restrição da entrega de sacolas e não há atendimento médico, policiais penais e assistência social suficientes", afirmou.
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