O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a prisão do ex-assessor para Assuntos Internacionais do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Filipe Martins, devido a uma viagem que nuncia existiu. A decisão também cita outros argumentos que, segundo juristas entrevistados pela Gazeta do Povo, carecem de fundamentação.
De acordo com o doutor em Direito de Estado, Rodrigo Chemim, o ministro aponta na decisão que a prisão preventiva do ex-assessor é necessária para garantir a ordem pública e promover a instrução criminal, evitando que o investigado altere alguma prova. No entanto, o especialista caracterizou como “superficial” a sugestão de que Filipe poderia comprometer a produção de provas se permanecesse em liberdade durante o processo, e afirma não ter encontrado no documento nenhum argumento referente à garantia de ordem pública.
“De acordo com a jurisprudência dominante, entende-se que é possível prender preventivamente alguém para evitar reiteração de um comportamento delitivo”, explica Chemim. “Mas isso ocorre quando há algum dado concreto que evidencie alta probabilidade para essa reiteração delitiva, e na decisão eu não vi nenhum argumento nessa linha”, completa o especialista, que é professor de Processo Penal na Universidade Positivo (UP).
Segundo a defesa de Filipe Martins, o ex-assessor não exerce mais cargo público ou de influência, e já teve bens apreendidos durante a investigação. “Foram capturados celulares, tablets e outros itens”, pontua o advogado Ricardo Scheiffer, citando ainda que Martins prestou, de forma espontânea, seu depoimento à Polícia Federal (PF) e não se ausentou de suas obrigações perante a Justiça.
Defesa apresentou comprovantes de que a viagem citada na decisão nunca existiu
Além disso, o principal argumento utilizado para fundamentar a prisão é de que o nome de Filipe Martins aparece na lista de passageiros que viajaram a bordo do avião presidencial com Bolsonaro dia 30 de dezembro de 2022 rumo a Orlando, nos Estados Unidos, sem registros formais da saída ou entrada dele no controle migratório do Brasil.
Essa lista, segundo Representação da PF, indicaria uma possível evasão do ex-assessor do país “para se furtar de eventuais responsabilizações penais”, pois sua localização seria “incerta”. Porém, a defesa apresentou dia 19 de fevereiro uma série de documentos do ex-assessor que contrariam a afirmação de suposta fuga.
“Mostramos as passagens aéreas de Brasília para Curitiba em nome dele e da mulher, datadas de 31 de dezembro de 2022, assim como os comprovantes das bagagens que despacharam, e a mensagem de confirmação da companhia aérea”, informa o advogado, ao citar ainda que a PF o prendeu na casa de parentes em Ponta Grossa. "Então, sua localização não era ‘incerta’, como descreve a decisão pela prisão”.
"É necessário rever a prisão", afirmam juristas
Para juristas entrevistados pela Gazeta do Povo, isso evidencia que manter o ex-assessor preso preventivamente é ilegal. “Se a defesa demonstra que os dados que embasaram a decisão estão errados, é necessário rever a prisão”, aponta Maurício Zanoide de Moraes, professor de Processo Penal da USP e autor de diversos livros sobre Direito Criminal.
Assim como ele, o doutor em Direito Processual Penal, Gustavo Henrique Badaró, confirma que premissas utilizadas para uma prisão preventiva precisam ser comprovadas para manter o indivíduo em cárcere. “Se for mostrado que essa premissa é falsa e não houver outro fundamento, o normal é que o juiz acabe revogando a prisão, que foi equivocadamente decretada”, aponta.
Além disso, o advogado e professor Gauthama Fornaciari, que atua há 20 anos como advogado criminalista, garante que "a prisão é ilegal, pois deveriam ser aplicadas medidas cautelares diversas da prisão", como descreve a Lei 12.403.
“Certamente, quaisquer das medidas previstas, em conjunto ou isoladamente, são suficientes para assegurar a instrução criminal ou eventual risco de fuga”, informa, ao citar todas as possibilidades previstas no Artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP).
Filipe Martins permanece preso
Segundo a defesa do ex-assessor, esta sexta-feira (1º), a prisão ainda não foi revogada, e Filipe Martins segue no Complexo Médico Penal (CMA), em Pinhais, no Paraná, onde estão presos criminosos condenados por estupro, assassinato e outros delitos.
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