Marcos e Lucas (nomes fictícios) são dois adolescentes pobres da periferia de Curitiba. Ambos têm grande defasagem escolar e um contato já íntimo com a violência. Marcos, por exemplo, tinha quatro amigos: três morreram e um está preso. Os dois jovens estavam envolvidos com o tráfico de drogas e cumpriram medidas socioeducativas. A vida deles começou a mudar quando começaram a participar de um programa de aprendizagem.
Hoje a rotina das "correrias" deu lugar à responsabilidade. Eles participam do Programa Estadual de Aprendizagem para o Adolescente em Conflito com a Lei e estão empregados em órgãos públicos do estado. Atuam na área administrativa e têm contrato de trabalho com duração de 12 meses. Os chefes de Marcos gostaram tanto do trabalho dele que decidiram contratá-lo como estagiário. A falta de sonhos deu lugar a um projeto de futuro: ele agora quer seguir a carreira militar.
Lucas está há menos tempo no programa (três meses), mas conta que sua vida já mudou. É primeira experiência dos dois no mundo do trabalho. Marcos mora com a mãe, que trabalha como balconista, na Cidade Industrial. Com 16 anos, ele ainda está na sexta série, mas colocou a escola em primeiro lugar. "Antes saía para ferver, só fazia festa", lembra. "Hoje me tornei mais pontual, passei a ser mais responsável."
A iniciativa que está beneficiando os dois jovens é da Secretaria de Estado da Criança e da Juventude. Ela possibilita que a adolescentes que já estiveram em conflito com a lei possam ser inseridos em um programa de aprendizagem profissional. A legislação que garante esse benefício já existe em todo o país, mas somente em empresas privadas. Jovens com idade entre 14 e 18 anos têm uma jornada de trabalho de 20 horas semanais, precisam estar matriculados no ensino formal e para isso recebem um salário e todas as garantias trabalhistas. Mas foi no Paraná que esse processo passou a ocorrer na administração pública. Mais de 2 mil jovens já foram beneficiados desde o início do projeto, há três anos.
O programa é voltado a adolescentes que já estiveram privados de liberdade ou cumpriram medidas socioeducativas em semiliberdade ou liberdade assistida. Eles são encaminhados pelo Ministério Público, Conselhos Tutelares, municípios ou por profissionais da própria secretaria. As únicas exigências é que precisam estudar e ter renda inferior a meio salário mínimo per capita. Há 700 vagas distribuídas em órgãos e empresas da administração estadual. Em primeiro lugar está a Copel, com 100, e em segundo a Sanepar, com 80. Os meninos e meninas recebem meio salário mínimo regional, além de benefícios trabalhistas e previdenciários.
Há pessoas responsáveis pelos jovens em cada órgão ou empresa. Chamados de "facilitadores", eles fazem a ponte da secretaria com o restante da equipe. No início, muitos colegas ficaram receosos, mas hoje os gestores do programa garantem que os facilitadores ligam pedindo mais jovens ou solicitam a ampliação dos contratos. Durante quatro horas, eles recebem um curso de formação oferecido pela Secretaria de Estado da Educação, com aulas de informática e reforço escolar, por exemplo.
O projeto está presente em 11 municípios: Curitiba, Cascavel, Foz do Iguaçu, Londrina, Toledo, Pato Branco, Umuarama, Paranavaí, Campo Mourão, Ponta Grossa e Maringá. O objetivo agora é estabelecer parcerias para que os jovens possam continuar inseridos no mercado de trabalho. Há casos em que os jovens trabalhavam em empresas como a Copel e fizeram concurso para ficar definitivamente no quadro de funcionários. Outros estão cursando o ensino superior. A ideia é a expansão tanto nos órgãos estatais quanto a criação de uma parceria com o setor privado. Hoje o programa está institucionalizado, com legislação e orçamento próprio.