São Paulo Obras de geração de energia e rodovias previstas pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) estão sobre regiões de alta riqueza natural, que o próprio governo identifica como prioritárias para a conservação. Pelo menos dez obras encostam ou estão muito próximas de regiões de importância biológica alta a extremamente alta, e ameaçam o equilíbrio de ecossistemas e a existência de espécies algumas únicas do Brasil e reconhecidamente ameaçadas de extinção.
Elas são as rodovias BR-364, no Acre; BR-156, no Amapá; e BR-230 e BR-163, no Pará; as hidrelétricas Santo Antônio e Jirau, em Rondônia, São Salvador e Serra Quebrada, no Tocantins; as termoelétricas Vale do Açu, no Rio Grande do Norte, e Candiota 3, no Rio Grande do Sul.
A constatação vem da sobreposição de dois mapas: do PAC, divulgado pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, no dia 23 de janeiro, e do programa de Áreas Prioritárias para Conservação Uso Sustentável e Repartição dos Benefícios da Biodiversidade Brasileira, coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) e que funciona parcialmente com doações internacionais.
A maioria das obras sobrepostas a áreas sensíveis fica na Amazônia. Historicamente, todo plano de infra-estrutura na região provoca uma busca desabalada por terras próximas para abrigar operários e aventureiros de fornecedores de serviços a grileiros. Sem ordenação, isso provoca desmatamento muito além do necessário e distúrbio do sistema natural.
No entorno dessas obras estão algumas paisagens únicas, como um trecho de campinarana (um tipo de campina) no extremo oeste do país, entre Amazonas e Acre, com areia branca. Ela fica na área de influência da BR-364, cuja construção e pavimentação fortalece planos de integração de Peru, Brasil e Bolívia, dentro da Iniciativa para Integração da Infra-estrutura Regional Sul-Americana (Iirsa).
Outro exemplo ocorre onde são planejadas as duas hidrelétricas do Madeira, em Rondônia. O trecho entre o rio e a Estação Ecológica Serra dos Três Irmãos é reconhecido pelos biólogos como a mais rica em primatas da Amazônia. São 16 espécies, todas descritas como ameaçadas de extinção na Convenção Internacional sobre Comércio em Espécies Ameaçadas. O programa de Áreas Prioritárias identifica as hidrelétricas como um perigo aos animais.
Para Adriana Ramos, coordenadora do Programa de Políticas Públicas do Instituto Socioambiental, a sobreposição de interesses demonstra "uma visão unilateral" centrada apenas na elevação do Produto Interno Bruto (PIB). "O impacto ambiental não é levado em consideração. Há tantas alternativas, tantas idéias boas, mas na hora de se fazer um plano de desenvolvimento elas parecem ser mero detalhe", afirma. "A questão não é discutida antes do licenciamento ambiental. Por isso depois ela vira conflito."