Vitrine do governo federal nas eleições de 2014, a marca de 8,1 milhões de estudantes no Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) pode ter sido inflada com matrículas que ainda não se confirmaram. A Gazeta do Povo confrontou informações repassadas pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) e constatou que em ao menos cinco capitais incluindo São Paulo e Porto Alegre , os dados repassados pelo governo federal são até três vezes maiores do que os informados pelos municípios.
A meta do governo federal era matricular 8 milhões nos cursos do Pronatec até o fim deste ano algo que o Ministério da Educação diz já ter superado. Desse total, 1,439 milhão veio do Pronatec Brasil Sem Miséria braço do programa voltado a famílias em vulnerabilidade social. Essa quantidade é mais do que o dobro do mostrado em reportagem publicada pelo jornal no ano passado (692 mil inscritos).
Os números repassados pelo MDS, entretanto, divergem dos informados por São Paulo, Florianópolis, Porto Alegre, Cuiabá e Salvador. Juntas, essas prefeituras dizem ter matriculado 25.891 alunos de baixa renda no Pronatec. A diferença em relação aos dados do governo federal é de 38 mil matrículas, mas ela pode ser maior, já que a reportagem consultou apenas capitais e não cidades do interior, onde os números são bem mais robustos.
A divergência nos dados pode ser explicada pelo critério utilizado nas estatísticas. As informações apresentadas pelos municípios que mais se aproximavam das federais são as de pré-matrículas. Ao todo, dizem essas capitais, foram 59 mil pré-matrículas fase em que a vaga ainda não está garantida.
Procurado pela Gazeta do Povo, o Ministério do Desenvolvimento Social encaminhou uma tabela com dados de 2014 e de todo o período de execução do projeto na qual sugere que os números obtidos pela reportagem se referiam apenas a este ano e não ao ciclo completo do Pronatec. Entretanto, três das cinco secretarias municipais consultadas pela Gazeta do Povo repassaram informações por ano, o que vai de encontro com a explicação da pasta federal. As outras duas confirmaram que os dados se referem ao período entre 2012 e 2014.
A inconsistência dos dados do Pronatec pode não se restringir aos cursos voltados ao público do Bolsa Família. Em relatório publicado no dia 27 de agosto, a Controladoria Geral da União (CGU) já havia apontado necessidade de aprimoramento no controle do Pronatec Bolsa Formação, que inclui as versões "Trabalhador" e "Estudante". Segundo o relatório de auditoria, instituições de ensino conveniadas continuam recebendo valores por alunos desistentes. Isso ocorreria por causa de uma deficiência no sistema, que ainda não tem um campo para reconfirmação da matrícula apesar dessa necessidade ter sido levantada em uma portaria do Ministério da Educação no ano passado.
Cursos rápidos são 68% das matrículas
O Pronatec oferece cursos técnicos, com carga horária que varia de 800 a 1,8 mil horas, e de formação inicial e continuada modalidade cujos cursos vão de 160 a 500 horas/aula. Apesar de ter sido procurado durante uma semana, o Ministério da Educação não informou quantas das 8,1 milhões de matrículas se referem a cada modalidade.
Entretanto, reportagem publicada pelo jornal Folha de S.Paulo em agosto já havia mostrado que a meta de 8 milhões de matrículas só foi atingida graças aos 5,480 milhões de alunos que frequentaram os cursos mais rápidos de formação inicial e continuada.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social, é na formação inicial e continuada que estão as 1,439 milhão de matrículas do Pronatec Brasil Sem Miséria. "Esses cursos são voltados a quem tem escolarização mais baixa. É raro termos um aluno do Bolsa Família matriculado diretamente em um curso técnico", diz Adriana Cardoso de Lima, do Senac-PR
Os dois cursos mais procurados do Pronatec, segundo a Folha de S.Paulo, foram de auxiliar administrativo e operador de computador, com 428.817 matrículas juntos.
À época da publicação, o MEC publicou nota dizendo que a matéria da Folha de S. Paulo "desqualifica a importância da educação profissional no país, ao não considerar a relevância dos cursos de qualificação profissional para a formação de milhões de trabalhadores brasileiros, bem como para o atendimento da demanda de mão de obra qualificada".