Jovens que passam muito tempo em frente ao computador durante a noite podem sofrer de distúrbios do sono, do humor, alterações hormonais e até metabólicas. A constatação é de uma pesquisa realizada pela psiquiatra Gema Galgani, da Universidade de Campinas (Unicamp). Durante dois anos ela investigou os hábitos de 160 adolescentes de escolas públicas e particulares, com idades entre 15 e 18 anos, e constatou que 71% dos que afirmaram usar o computador no período noturno têm má qualidade de sono.
A maioria dos adolescentes afirmou ficar conectado das 18 às 3 horas da madrugada em dias de semana, e das 18 às 6 horas nos fins de semana. Segundo o estudo, 36,54% dos jovens demoram até meia hora para conseguir pegar no sono, 32,69% levam de 30 a 60 minutos e 11,54% chegam a demorar mais de uma hora para adormecer. "O normal seria um adolescente dormir em questão de 10 minutos", diz Gema.
A pesquisadora explica que um dos principais fatores para a má qualidade do sono é a luminosidade do monitor. A luz emitida pelo aparelho reduz a produção do hormônio responsável pela sensação de sono, que começa a ser secretado assim que escurece. "Estudos já mostram que o uso do computador por mais de três horas por dia já é suficiente para afetar o padrão de sono", afirma. Gema ressalta que, ao contrário da televisão, considerada uma mídia passiva, o computador proporciona interatividade, o que mantém a mente mais alerta.
O estudante William Lourenço de Oliveira, 17 anos, não fica uma noite sem usar o computador. Logo que volta da aula, por volta das 22h30, já se conecta ao MSN e ao Orkut para conversar com os amigos. "Fico até umas 5 horas da manhã", conta. Ele não trabalha de manhã, mas costuma acordar por volta das 9 horas, treina futebol todos os dias das 13 às 16 horas e vai para a aula à noite. "Tem dias em que fico muito cansado, o treino da tarde não rende e à noite mal consigo ficar acordado enquanto o professor fala", revela.
Cansaço e irritação
A redução das horas de sono pode implicar em uma série de problemas relacionados à saúde. Dormindo menos, o número de ciclos do sono é menor. Gema Galgani explica que o normal é que uma pessoa tenha de cinco a seis ciclos por noite, número que pode cair para quatro com a privação do sono. Com isso, tanto o chamado sono REM (período em que ocorrem os sonhos e o desenvolvimento cognitivo e da memória) como o não-REM (período em que são repostas as energias) ficam prejudicados. Como conseqüência, no dia seguinte o adolescente se sentirá cansado, sonolento, irritado, com menos nível de consciência e menor rendimento no trabalho ou na escola. Além disso, Gema ressalta que é durante o sono que o organismo secreta um dos principais hormônios desta fase da vida: o hormônio do crescimento.
De acordo com a presidente da Sociedade Paranaense do Sono, Elyéia Hannuch, o uso do computador não deveria ser feito a menos de duas horas do horário de dormir. "O ideal é que próximo da hora de ir para a cama se realize atividades mais relaxantes e o ambiente de dormir seja isento de iluminação", afirma.
Segundo a médica, permanecer até de madrugada no computador afeta o chamado ritmo biológico do corpo. No organismo, as funções fisiológicas acontecem de forma rítmica, ou seja, têm altos e baixos no decorrer de um determinado período de tempo. Esses ritmos são guiados por células localizadas no cérebro, que determinam como o organismo deve se comportar dependendo da etapa do ciclo. Dessa forma, a secreção de hormônios, a divisão de células, a concentração de enzimas e a velocidade dos neurotransmissores são apenas alguns dos fatores que variam ao longo do dia.
Os ritmos internos do organismo são sincronizados por marcadores externos, como a luz, as refeições ou o horário de trabalho. Elyéia explica que, quando uma pessoa se mantém acordada durante o período noturno, fica exposta à luz em um período em que deveria estar no escuro. Por conta disso, todo o metabolismo e a secreção de substâncias essenciais para o bom funcionamento do organismo fica afetado.