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A sociedade é racista por definição. “O racismo fornece o sentido, a lógica e a tecnologia para a reprodução das formas de desigualdade e violência que moldam a vida social contemporânea. As expressões do racismo no cotidiano, seja nas relações interpessoais, seja na dinâmica das instituições, são manifestações de algo mais profundo, que se desenvolve nas entranhas políticas e econômicas da sociedade”.
É com estes argumentos que Silvio Almeida inicia seu livro mais conhecido, Racismo Estrutural (leia resenha de Bruna Frascolla), publicado em 2019 e parte da coleção Feminismos Plurais, coordenada por Djamila Ribeiro e composta por obras como “Racismo Recreativo”, “Empoderamento”, “Lugar de Fala e Apropriação Cultural”, “Colorismo” e “Transfeminismo”. Também escreveu “Sartre – direito e política: ontologia, liberdade e revolução” e colaborou com a obra coletiva “Marxismo e Questão Racial”.
O advogado e professor é cotado para assumir o Ministério dos Direitos Humanos do governo do Partido dos Trabalhadores (PT) que se inicia em primeiro de janeiro. Para fortalecer seu nome, ele recentemente realizou uma reunião com movimentos sociais que integram o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), que tem grande influência sobre o PT. Na ocasião, dialogou com líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
Também foi convidado a participar, no dia 15 de dezembro, em São Paulo, da cerimônia de Natal do Movimento Nacional dos Catadores de Material Reciclável, do qual participou Luís Inácio Lula da Silva.
Recentemente, atuou também como relator de uma comissão de juristas negros, instituída pela Câmara dos Deputados para propor mudanças na legislação brasileira com relação ao combate ao racismo.
O documento que eles produziram inclui propostas para praticamente todas as áreas da sociedade, com medidas como: novas formas de cotas raciais, regras para programas de rádio e televisão, a realização da uma “Mega-Sena da Consciência Negra”, funk como cultura nacional e até a penalização de escolas públicas que deixem de trabalhar de forma “consistente” a história e a cultura afro.
Minorias e direitos humanos
Filósofo e doutor em direito, com trajetória acadêmica dentro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), ele é marxista e diretor do Instituto Luiz Gama, que se define com uma associação civil “que atua na defesa das causas populares, com ênfase nas questões sobre os negros, as minorias e os direitos humanos”.
É também presidente do Centro de Estudos Brasileiros (CEB) do Instituto para a Reforma das Relações Estado e Empresa (IREE), “uma organização independente que promove o debate democrático e pluralista para aperfeiçoar a interação entre os setores público e privado”.
Em 2020, foi professor visitante na Universidade de Duke (EUA), onde ministrou duas disciplinas, “Black Lives Matter US and Brazil” (“Vidas Negras Importam – Estados Unidos e Brasil”) e “Race and Law in Latin America” (“Raça e Lei na América Latina”).
Em Racismo Estrutural, Almeida argumenta que todo o imaginário social reforça o preconceito de raça, seja nos meios de comunicação, na chamada indústria cultural ou no sistema educacional. “A escola reforça todas essas percepções ao apresentar um mundo em que negros e negras não têm muitas contribuições importantes para a história, literatura, ciência e afins, resumindo-se a comemorar a própria libertação graças à bondade de brancos conscientes”.
Incentivo à contestação
Além disso, em suas frequentes falas públicas, o professor argumenta que a existência de um suposto racismo estrutural precisa ser combatido frontalmente. “Quem quer civilizar o Brasil não pode temer o poder. Temos de nos livrar dessa alma de senhor de escravo”, declarou, em entrevista ao jornal El Pais.
Para ele, o sistema de Justiça também reproduz e reforça o racismo: “Ele não produz apenas efeitos políticos, mas também no imaginário. Por exemplo, ao insistir na associação de pessoas negras com criminalidade e com pobreza. Funciona como confirmação de um imaginário social racista, que também é o mesmo imaginário que alimenta a conivência ou nossa indiferença em relação às mortes que ocorrem nas periferias do mundo”.
O Ministério Público também seria conivente com os ataques a negros, argumentou na mesma publicação. “O Judiciário e o Ministério Público como um todo são coniventes com a violência policial e com o desrespeito à Constituição. As relações sociais no Brasil e no mundo são atravessadas pela naturalização do racismo”.