Perseguição à PRF é desproporcional às falhas e atende a interesses das principais organizações criminosas do país.| Foto: PRF / Divulgação
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A Polícia Rodoviária Federal (PRF) está em um fogo cruzado. Fatos recentes envolvendo policiais em mortes de civis, como a asfixia de Genivaldo Santos, no Sergipe, e a menina de 3 anos baleada, no Rio de Janeiro, desencadearam uma série de críticas contra a corporação, principalmente de setores de esquerda, já irritados com a PRF pela ação durante as eleições de 2022.

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A campanha atingiu seu auge quando o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), manifestou publicamente sua visão sobre a possível extinção da PRF, afirmando que ela “deve ter sua existência reavaliada”.

Mudanças na condução dos trabalhos da corporação foram iniciadas nos primeiros dias do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em janeiro, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, determinou a extinção dos cinco Comandos Regionais de Operações Especiais (COEs) - criados durante a gestão de Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da PRF na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

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Os COEs estavam presentes nas cinco regiões do país e tinham como finalidade ampliar o enfrentamento ao crime em âmbito regional e intervir em emergências que demandassem uma resposta ágil. O Ministério da Justiça e Segurança Pública justificou tal medida alegando a subutilização dos efetivos da PRF em situações de ausência de operações específicas.

Diante desse cenário, especialistas e policiais da corporação apontam que mudanças em abordagens são necessárias, mas a perseguição é desproporcional – e pode contribuir para o fortalecimento de grupos criminosos.

Mas a quem interessa o fim da PRF? 

Para o especialista em segurança pública Fabrício Rebelo, a politização da corporação pode ser uma das causas responsáveis pela inserção da PRF na mira de críticos.

Segundo ele, os resultados alcançados pela Polícia Rodoviária Federal foram atrelados ao governo de Bolsonaro, fato que pode ser visto como o principal ponto responsável pela politização da instituição.

“No governo Bolsonaro houve um resultado muito positivo da PRF na repressão ao tráfico de drogas e de armas. Isso acabou sendo associado à gestão governamental anterior. Então, houve uma associação da atuação da polícia ao Executivo anterior, e isso - dentro de um contexto que nós estamos vivenciando hoje no Brasil - se tornou uma verdadeira perseguição ideológica contra a Polícia Rodoviária Federal”, observou.

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De acordo com o Atlas de Combate ao Crime da PRF, mesmo em meio à pandemia, em 2020, a PRF apreendeu um total superior a 736 toneladas de maconha e 31 toneladas de cocaína. Adicionalmente, foram recuperados aproximadamente 11 mil veículos e apreendidos cerca de 115 milhões de maços de cigarros contrabandeados. Nos últimos 20 anos, a PRF efetuou a prisão de 629 mil pessoas e confiscou 28 mil armas de fogo.

Rebelo também analisa as críticas excessivas feitas à Polícia Rodoviária Federal e o recado que isso passa aos barões do crime organizado, alvos das apreensões recordes de drogas realizadas pela instituição e que certamente possuem interesse no enfraquecimento da atuação da PRF.

“A partir do momento em que há uma demonização das forças policiais, acaba se passando um recado de que a atuação dela, de modo geral, não está sendo bem-vista. E isso sempre acontece na área de segurança pública. Quando temos a sinalização pública de que a preocupação com quem combate está sendo maior do que quem efetivamente pratica o crime, acaba se passando uma sinalização aos criminosos de que suas atividades são toleradas. Com isso, a tendência é termos um aumento na ousadia dos criminosos, no enfrentamento até mesmo dessas corporações que estão sendo criticadas, e consequentemente, os efeitos nos indicadores de segurança terminam sendo muito piores”.

Corporação incomoda as principais organizações criminosas do país 

No combate ao tráfico de drogas, a Polícia Rodoviária Federal incomoda as maiores organizações criminosas do Brasil. Entre elas, destacam-se o Primeiro Comando da Capital (PCC), o Comando Vermelho (CV) e a sinistra parceria entre o PCC e a 'Ndrangheta, uma poderosa máfia italiana.

As estradas do Brasil, inicialmente concebidas como rotas de conexão nacional, transformaram-se em corredores clandestinos para o escoamento de drogas. As organizações criminosas encontraram nesses extensos trechos uma forma eficiente de transportar grandes quantidades de entorpecentes de um ponto a outro do país.

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A intervenção proativa da PRF, no entanto, é um desafio significativo para essas organizações criminosas. As apreensões recordes conduzidas pela corporação sinalizam não apenas um golpe concreto contra o tráfico de drogas, mas também causam prejuízos bilionários às finanças dessas facções.

Além disso, alguns dos chefes do PCC estão na mira da PRF. No ano passado, a instituição prendeu líderes da facção criminosa em Pernambuco e no estado de São Paulo.

Em janeiro de 2022, o responsável pela atuação internacional do PCC foi preso durante uma abordagem no município de Itapecerica da Serra, no interior de São Paulo.

Já em abril, o traficante conhecido como “Colorido” foi preso na BR-116, em Salgueiro, no sertão pernambucano. Considerado o número 2 da facção, ele estava foragido desde 2014 e atuava no fornecimento de drogas do PCC para a Região Sudeste.

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Defund The Police”  

A ideia de extinguir a PRF no Brasil guarda semelhanças com a iniciativa “Defund The Police” (Desfinancie a Polícia, em português), que ganhou notoriedade nos Estados Unidos. Grupos de esquerda, como o movimento Black Lives Matter (BLM) e a organização “Black Youth Project 100” (BYP 100), figuram entre os principais defensores da redução do financiamento policial.

Essa iniciativa ganhou ainda mais adesão após a morte de George Floyd, ocorrida em 2020, durante uma abordagem policial em que um oficial pressionou o joelho no pescoço dele por quase nove minutos em Minneapolis, Minnesota.

Chicago foi uma das cidades que aderiu à redução do financiamento da polícia. Em 2020, a prefeita Lori Lightfoot solicitou uma diminuição de US$ 80 milhões no orçamento destinado à polícia.

As consequências negativas da iniciativa não demoraram a aparecer: em 2021, Chicago sofreu com o maior número de homicídios dos últimos 25 anos, com 836 vítimas, segundo dados do Departamento de Medicina Legal do Condado de Cook.

O Departamento de Polícia registrou uma queda de 39% no número de prisões por crimes violentos em 2021 em comparação com 2019. Além disso, aproximadamente 600 policiais foram demitidos do Departamento, tendo como resultado uma defasagem de cerca de mil agentes de segurança.

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Uma pesquisa revisada por pares e publicada este ano no Journal of Community Safety and Well-Being indicou que várias cidades norte-americanas recuaram em suas iniciativas de redução do financiamento das polícias locais.

O aumento nos índices de homicídios e a redução da sensação de segurança entre a população foram alguns dos motivos apontados pelas autoridades de Chicago, Nova York e Los Angeles para reverter a tendência e aumentar o orçamento destinado à polícia, revogando medidas de redução do poder policial.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]