Escola em Realengo no dia da tragédia: obras em andamento e feridas abertas| Foto: Agencia Brasil

Superação

Alguns saíram, outros se tratam

Brenda, Carlos, Stephany, Luísa, Rayane. Pelo menos cinco alunos da turma 1.801 – a do oitavo ano, onde Wellington Menezes entrou atirando – deixaram a Tasso da Silveira após o massacre. Outros, como as irmãs Marcela e Carolina, deficientes visuais, chegaram a mudar de colégio, mas voltaram. Houve até o caso da menina Bruna, de 10 anos, que entrou na escola após o massacre. "Ela queria estudar aqui, mesmo conhecendo várias vítimas. Éramos vizinhos de Bianca, Igor e Milena (que morreram na tragédia)", conta Jorgina Ortega de Oliveira, avó de Bruna, que tem dois irmãos matriculados na escola.

Segundo o diretor Luís Marduk, a maioria dos alunos optou por permanecer no colégio. Dos cerca de 40 que pediram transferência logo após a tragédia, entre dez e 15 retornaram.

Tratamento

Alguns continuam em tratamento psicológico, outros receberam ou se deram alta. O sofrimento comum virou fator de união.

"Ficamos mais unidos", resume Isabela Martins, de 14 anos, da 1.801. "Pensei em sair do colégio, mas os amigos me pediram para continuar. Fui algumas vezes ao psicólogo, mas já parei", diz.

No dia 7 de abril, Júlia não foi ao colégio porque perdeu a hora. A tragédia – da qual soube pela televisão – a fez perder a melhor amiga, Karine. Júlia fez terapia durante um mês e parou por conta própria, mas agora quer voltar.

Segundo Maria Silvia Elia Galvão, que coordena a área de Saúde Mental da prefeitura para a região, entre 80% e 85% dos alunos procuraram atendimento psicológico logo após o massacre. Em alguns casos, o terapeuta ia à casa dos pacientes. Em outros, as vítimas eram levadas em vans da prefeitura até a clínica da família. Hoje, 21 ainda continuam com esse tipo de tratamento.

Uma das linhas de trabalho é chamada de "brincação": por meio de jogos e brincadeiras, os alunos externam os sentimentos e tentam superar a tristeza. Há também quem precise de atendimento psiquiátrico para vencer o trauma – pais e professores inclusive. Hoje, quatro psicólogos e dois psiquiatras atendem à demanda da Tasso da Silveira.

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O som dos tiros foi substituído pelo bate-estaca dos operários. O portão de entrada mudou de lugar e, temporariamente, ficou bem mais estreito. Guardas municipais acompanham quem chega e quem sai do colégio. E, algumas vezes por semana, uma van busca alunos e pais para acompanhamento psicológico em uma clínica da família.Seis meses após o massacre na Escola Municipal Tasso da Sil­vei­ra, em Realengo, a vida vai voltando ao normal, porém mais triste. Três professoras continuam de licença, afastadas por "acidente de trabalho" – uma expressão técnica para designar o estresse pós-traumático. E o que ocorreu naquele 7 de abril não sai da cabeça de quem estava lá. "Quando lembro parece que volta tudo", conta a merendeira Simone Lima, há 14 anos no colégio.

"Minha filha não quis sair da escola, mas mudou. Ficou mais preocupada com o irmão, de 19 anos. Sempre que ele vai à igreja, à noite, ela pede para não voltar tarde", diz Gildete Antunes, que mora em frente da escola e, no dia do massacre, acolheu em casa várias crianças que conseguiram sair do colégio.

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Com 980 alunos, do 4.º ao 9.º ano do ensino fundamental, a Tasso da Silveira sofreu uma reforma emergencial pouco após a tragédia. Desde junho, porém, uma grande obra derrubou praticamente todo o colégio, aberto há 40 anos. Da construção original, só restaram as fundações. Instalações elétricas e hidráulicas foram trocadas, cada um dos quatro andares ganhou um banheiro e as salas de aula foram reconstruídas.

As obras ainda não terminaram. A última etapa será justamente a principal novidade da escola. No local onde antes ficava uma praça – entre a escola e uma creche municipal – está sendo erguido um anexo. Lá, os alunos terão salas de leitura, dança e esportes, laboratórios de informática e ciências, um auditório maior e um elevador. "Com isso, poderemos ter alunos cadeirantes", conta Luís Marduk, há três anos na direção da Tasso da Silveira.

O projeto foi acelerado por causa da morte dos 12 alunos, assassinados pelo ex-estudante Wellington Menezes de Oliveira. O secretário municipal de Obras, Alexandre Pinto da Silva, confirma que a unidade precisava de fato de uma reforma, mas não seria tão ampla nem tão rápida assim.

Professoras ainda carregam temor

Só de falar do massacre, Gisele Conceição Mateus, de 44 anos, fica com os olhos cheios d’água. Não é para menos: desde então, a vida da professora de Ciências do 8.º e 9.º anos virou de cabeça para baixo. Um mês após a tragédia, o boato de que um outro atirador havia entrado na Tasso da Silveira a fez surtar. Ela entrou em licença médica e passou a fazer tratamento psicológico e psiquiátrico. Até hoje, toma antidepressivos. "Na primeira sessão, eu disse à psicóloga que a única coisa que eu queria era ter a minha vida de volta", conta Gisele. "Todo mundo vai morrer um dia, mas a tragédia me fez ver que eu posso morrer amanhã", completa.

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Para Estela Maris, professora da sala de leitura, o impacto foi diferente. No dia 7 de abril, ela estava em casa, de licença médica. Soube do massacre pelo telefonema de uma amiga, de outra escola, e correu para lá. O receio veio depois, quando encontrou um "batalhão de desconhecidos" no colégio. Eram outros professores, psicólogos, agentes de saúde. "Não reconheci a minha escola. Parecia que tinha sido invadida", lembra a docente, de 34 anos, que leciona há seis na escola.

Mas esse temor já passou. Apesar de tudo – e de a obra "não ter deixado um tijolinho no lugar" – a professora diz que a equipe vem conseguindo fazer um bom trabalho. E, por falar nos "tijolinhos", a nova Tasso da Silveira não terá um lugar específico para homenagear os 12 alunos mortos na chacina.