Burocracia atrasa recursos
Dar uma resposta à população durante tragédias como a do Rio de Janeiro e iniciar a reconstrução das cidades é um processo árduo que toma mais tempo do que deveria. Em Blumenau, atingida pela chuva no fim de 2008, a vida praticamente retornou ao normal dois anos após a tragédia. Em Branquinha, no interior de Alagoas, mesmo seis meses após as chuvas do ano passado, boa parte da população atingida segue em barracas improvisadas, com dificuldade de acesso a serviços básicos, como água e luz.
Depoimentos
Confira os depoimentos de algumas vítimas das chuvas no Rio de Janeiro na matéria e também no vídeo abaixo
Em um dos principais abrigos para os atingidos pela chuva em Teresópolis, no Rio de Janeiro, o jardineiro Jorge Antônio da Costa aguarda a resposta do patrão para saber se ainda terá trabalho. A faxineira Geocilane de Oliveira, que também vive no local, espera por uma nova casa, ao mesmo tempo em que tenta se recuperar da perda da neta. Na casa de parentes, o bombeiro eletricista Damião Souza se pergunta se poderá ir para a residência de quatro andares que construiu e nunca usou. Cansado de indefinições, o pedreiro Juaci Rabello tomou uma decisão: fica morando na casa do irmão, mesmo depois de ela ter sido danificada pela chuva e estar rodeada de entulhos.
Assista ao vídeo com o depoimento de vítimas da tragédia
Os atingidos pela maior tragédia nacional causada pela chuva estão em compasso de espera. Eles aguardam por definições do poder público e, principalmente, pela construção de novas casas. As perguntas sobre o que irão fazer, quanto tempo ficarão no abrigo e onde irão morar são as mais difíceis de serem respondidas. ?Não sei?, dizem muitos deles.
Enquanto faltam definições, eles improvisam. Nos bairros atingidos pela chuva é comum ver moradores carregando roupas, móveis e eletrodomésticos da casa antiga. Mas, engana-se quem pensa que eles rumam para um novo lugar, uma casa definitiva. Levam os objetos para a casa de um parente ou amigo, onde estão morando, ou para abrigos. Não sabem até quando ficarão nessa situação ? o menor tempo possível, de preferência.
Só que o histórico de tragédias no Brasil não inclui uma resposta rápida do poder público. O dinheiro demora a chegar aos municípios, há trâmites burocráticos que precisam ser respeitados (como a Lei das Licitações e desapropriações de terra) e a falta de experiência das prefeituras faz com que passe muito tempo até uma tomada de decisão. Em Santa Catarina, 96 famílias atingidas pela tragédia de novembro de 2008, que matou 135 pessoas, aguardaram dois anos em moradias provisórias em escolas e galpões até receberem a chave de uma casa por parte do poder público. Entretanto, em Blumenau, ainda há cerca de 400 pessoas de 120 famílias em abrigos à espera de uma nova residência para recomeçar a vida.
Poder público presente
No Rio de Janeiro, as prefeituras e o governo do estado tentam se organizar e mapear o que será feito daqui para frente: se irão construir tendas provisórias, como irão retomar as aulas ? já que escolas servem de abrigo ?, quanto dinheiro será preciso. Só que fica difícil tomar grandes decisões em um momento em que estima-se que cerca de 400 pessoas continuam desaparecidas, comunidades permanecem sem luz e água encanada, dezenas de crianças estão sem os pais e ainda há distritos isolados por falta de acesso.
Para amenizar o desconforto enfrentado pelos desabrigados, os governos federal e estadual têm trabalhado em várias frentes. Dentre as medidas estão: as defesas civis dos municípios da região serrana do Rio receberão treinamento especial para atender populações em situação de risco; R$ 40 milhões foram liberados pelo governo do Rio para auxiliar o pagamento de aluguéis para as vítimas; o Ministério da Saúde liberou R$ 8,7 milhões para ampliar a assistência hospitalar da região.
A presença do poder público interfere também na postura das pessoas afetadas pelos estragos. Cientes de que o Estado está ao lado e se mobiliza para que a situação melhore, a comunidade apresenta-se preparada para superar a tragédia. ?A assistência oficial precisa ser imediata nestes casos?, reforça o psicólogo especialista em transtorno de estresse pós-traumático em desastres, Othon Vieira Neto.
O especialista explica que a ausência do poder público deixa as vítimas desacreditadas e consequentemente revoltadas com toda a situação, o que costuma gerar problemas a partir da segunda semana após o evento. ?Acarreta uma situação egoísta, em que as pessoas pensam que alguém deve pagar pelo que elas estão sofrendo e não interessa quem vai pagar. A reação natural é a dor, a raiva?. Uma das principais características dessa revolta são os saques nas regiões afetadas, já registrados nos últimos dias.
Veja o slideshow abaixo com fotos da catástrofe na região serrana do Rio de Janeiro
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