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Rede de assistência às vítimas de estupro enfrenta sobrecarga e estrutura insuficiente

Ato na Praça Santos Andrade, em frente à UFPR, reuniu cerca de 300 pessoas em defesa da mulher e em solidariedade a adolescente de 16 anos que foi estuprada no Rio de janeiro | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Ato na Praça Santos Andrade, em frente à UFPR, reuniu cerca de 300 pessoas em defesa da mulher e em solidariedade a adolescente de 16 anos que foi estuprada no Rio de janeiro (Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo)

As críticas à conduta do delegado titular da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informação, primeiro responsável pela investigação de um estupro coletivo cometido contra uma adolescente no Rio de Janeiro, reacendeu o debate sobre a eficiência da rede de assistência às vítimas desse tipo de crime e à capacitação dos profissionais. Em entrevistas, a adolescente afirmou ter se sentido desrespeitada.

São comuns os relatos de mulheres sobre o atendimento em delegacias especializadas. As reclamações mais comuns dizem respeito à falta de capacitação dos agentes e à culpabilização da vítima. Especialistas na área apontam que a precariedade do atendimento tem mais a ver com a sobrecarga e estrutura insuficiente do que com o protocolo em si. Ou seja, a Norma Técnica de Padronização das DEAMs (Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher) é adequada, o problema é executá-la plenamente.

Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2015, o Brasil registrou 47,6 mil denúncias de estupro e estupro de vulnerável; no Paraná, foram 3,9 mil denúncias, o que faz do estado o terceiro com maior número de ocorrências. Já Curitiba é a quinta capital com maior número de denúncias, atrás de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Manaus.

Estrutura e sobrecarga

O elevado número de vítimas e a natureza hedionda do crime desafiam a manutenção de uma rede de assistência integrada e capacitada.

No Paraná, vítimas de estupro são atendidas por uma rede de serviços que incluí delegacias especializadas (da Mulher e da Criança e do Adolescente), o Ministério Público, o Instituto Médico Legal e hospitais de referência.

O primeiro passo para que uma mulher vítima de estupro seja assistida adequadamente é o atendimento em delegacias especializadas – hoje, há apenas 18 delas em todo o estado. Nos municípios que não possuem delegacia especializada, as vítimas devem procurar as unidades locais, as quais deveriam ter uma equipe capacitada para o atendimento de mulheres em situação de violência – o que nem sempre ocorre.

As delegacias especializadas sofrem ainda com a sobrecarga – somente a de Curitiba acumula mais de 18 mil inquéritos policiais em andamento.

O mesmo se repete no Nucria, núcleo da Polícia Civil especializado em crimes contra crianças e adolescentes em Curitiba, onde, só em 2015, foram abertos 319 inquéritos para apurar denúncias de estupro de vulnerável.

Protocolos

A primeira recomendação para vítimas de estupro é que procurem um hospital de referência para o atendimento médico e a administração do coquetel de remédios antirretrovirais. Em Curitiba, o Hospital de Clínicas da UFPR e o Evangélico são os responsáveis por receber as vítimas e acionar um perito do IML, que irá até a unidade realizar o exame de corpo delito. Esse procedimento, no entanto, só é realizado quando a vítima procura o hospital em até 72 horas após o estupro. Depois desse prazo, deve buscar diretamente a Delegacia da Mulher.

Os procedimentos a serem adotados pelas delegacias especializadas estão definidos na Norma Técnica de Padronização das DEAMs (Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher). O primeiro contato com o policial é determinante para o desenrolar da queixa-crime e da investigação criminal. Um atendimento humanizado pressupõe policiais qualificados, com compreensão de violência de gênero e da legislação específica, que não minimizem ou coloquem em dúvida o relato da vítima.

Após o registro do Boletim de Ocorrência, a vítima deverá ser encaminhada para um local reservado para conversar com a escrivã da polícia. Logo depois são tomadas as providências legais: preenchimento do BO; coleta de provas; solicitação à Justiça, em prazo de 48 horas, de medida protetiva de urgência; encaminhamento ao exame de corpo de delito e a serviços de atendimento psicossociais.

Demora prejudica coleta de provas

O prazo para o registro da denúncia e consequente abertura de inquérito é de seis meses a partir do momento em que a vítima identifica o agressor, e não do momento do crime. No entanto, a titular da delegacia da mulher de Curitiba, Sâmia Coser, ressalta a importância de fazer o registro e a denúncia o mais rápido possível também devido às limitações da coleta de provas materiais.

“Dispomos de um espaço temporal curto para identificar substâncias, a presença de esperma e sinais de agressão física. Por exemplo, se a vítima fez uso de entorpecentes, em poucas horas posso não conseguir mais identificar essas substâncias. E muitos agressores utilizam a falta dessa prova para alegar que houve consentimento”, explica.

O mesmo vale para as provas de imagem, diz a delegada: câmeras de rua e estabelecimentos comerciais e residências não mantêm arquivos por mais de uma semana; da mesma forma, testemunhas são difíceis de localizar muito tempo depois.

Feita a denúncia, é instaurado um inquérito policial para apurar os fatos relatados pela mulher. Nessa etapa, a delegada determina os atos de investigação, como ouvir o acusado e testemunhas e coletar provas. Se a prática do crime for comprovada, o autor é indiciado e o inquérito é enviado ao Judiciário e ao Ministério Público, a quem cabe denunciar e processar o agressor. O Judiciário é responsável por sentenciar o caso.

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