Efeito
Segundo um dos médicos que compõem a auditoria conduzida pelo Ministério da Saúde, a combinação de medicamentos prescritos pela médica Virgínia Soares de Souza era variada e causava um efeito imediato nos pacientes.
"Cada paciente tinha o seu kit [de medicamentos], mas normalmente os remédios eram [ingeridos] na mesma hora. Isso causava um efeito imediato e a chance de óbito era grande", afirmou o médico, que pediu para não ser identificado na reportagem.
Ainda de acordo com o profissional, o uso dos medicamentos citados no relatório do Instituto de Criminalística é comum. Mas a ingestão deles em determinadas doses, combinada com a diminuição dos parâmetros de oxigênio, é que pode antecipar o óbito.
O especialista cita como exemplo um caso que surgiu após a conclusão do inquérito que apontou a médica como autora de sete homicídios no hospital. "Tem um caso no qual o paciente estava em névoa [não precisava do respirador mecânico] e ela [doutora Virgínia] fez a medicação e depois colocou no ventilador. Ele morreu 20 minutos depois desse procedimento", relata.
Inquérito
Nucrisa não recebeu relatório sobre novas mortes suspeitas
Samia Cristina Coser, delegada adjunta do Núcleo de Repressão aos Crimes contra a Saúde (Nucrisa), órgão policial responsável pelo inquérito inicial que investigou sete mortes ocorridas na UTI do Hospital Evangélico, disse não ter recebido o relatório produzido pelo Instituto de Criminalística e que a investigação em torno das mortes pode ser concluída sem a abertura de um novo inquérito policial.
"A promotoria pode entender que tem provas suficientes para oferecer a denúncia diretamente à Justiça", explica a delegada. Ela não descartou, porém, a abertura de novo inquérito para apurar a responsabilidade da direção do hospital no caso.
"Recebemos a informação de que a promotoria pode pedir um novo inquérito, dessa vez para apurar a diretoria do Hospital. Mas isso ainda depende de um pedido do Ministério Público, o que ainda não ocorreu", afirmou a delegada.
O Ministério Público do Paraná recebeu, na última sexta-feira, um relatório elaborado pelo Instituto de Criminalística que colocou sob suspeita o atendimento oferecido pela médica Virgínia Soares de Souza a 346 pacientes mortos após período de internação na UTI do Hospital Evangélico. De acordo com o documento, 317 pacientes foram a óbito no mesmo dia em que a médica prescreveu um coquetel de remédios o que equivale a 91,6% das mortes.
Outros 128 pacientes que ficaram na UTI do Hospital Evangélico também foram submetidos ao coquetel de medicamentos após prescrição de outros médicos do estabelecimento mas em doses e combinações diferentes. Nesses casos, de acordo com o MP-PR, ocorreram 17 mortes no mesmo dia o equivalente a 13,2%.
Ainda segundo o Ministério Público, a conclusão do Instituto de Criminalística, unidade da Polícia Científica do Paraná, é que nos 334 casos em que os pacientes morreram no dia em que receberam os coquetéis, houve a prescrição de medicamentos como o diprivan e o pavulon horas antes do óbito. O primeiro é um anestésico e o segundo, um analgésico, que podem levar o paciente a óbito em caso de ingestão simultânea.
No total, foram analisados 1.872 prontuários gerados entre 2006 e este ano período em que a médica Virgínia chefiou a UTI do Hospital Evangélico. Os documentos foram apreendidos pela Polícia Civil em fevereiro e também estão sendo analisados pelo grupo coordenado pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Denasus).
A promotora Fernanda Nagl Garcez, responsável pela investigação, preferiu não para falar sobre o relatório. Por meio da assessoria de imprensa do MP-PR, ela disse que os dados não comprovam que tenham sido cometidos homicídios na UTI, apesar de darem mais elementos para a investigação. As 317 mortes, porém, são tratadas como "suspeitas" pela promotoria.
Além do diprivan e do pavulon, o relatório produzido pela Polícia Científica constatou que foram prescritos outros remédios que poderiam ser nocivos à saúde dos pacientes em caso de ingestão combinada ou em altas doses, como o fentanil, thionembutal, dormonid e o ketalar.
A investigação sobre esses novos óbitos suspeitos ainda não gerou uma nova denúncia à Justiça. O Tribunal de Justiça do Paraná, porém, já aceitou a denúncia oferecida pelo Ministério Público que apontou a médica Virgínia, outros três médicos e dois enfermeiros como coautores de sete mortes na UTI Geral do Hospital Evangélico. A Justiça ainda não julgou o caso.
Defesa minimiza dados sobre remédios
A defesa da médica Virgínia Soares de Souza afirmou que o relatório produzido pelo Instituto de Criminalística não apresenta dados novos e não tem valor científico. "Discordo dessa conclusão, pois não é científica e um conjunto de coisas que não provam é igual à prova nenhuma", afirmou o advogado Elias Mattar Assad em entrevista na segunda-feira.
Ontem, Samir Mattar Assad, sobrinho de Elias e que também trabalha na defesa da doutora Virgínia, voltou a falar sobre o assunto. Ele disse que não teve acesso ao relatório do Instituto de Criminalística, mas afirmou que informações divulgadas pela imprensa mostram não haver novidades.
No último sábado, uma comitiva de dirigentes da Federação Nacional dos Médicos (Fenam) se reuniu com Virgínia. Segundo Geraldo Ferreira, presidente da entidade, o objetivo do encontro foi escutar a versão da médica sobre a investigação.
"A violência do prejulgamento, sem o direito de resposta já fez o seu mal destruindo a vida profissional da médica. A análise criteriosa do ocorrido compete à Justiça. Esperamos que as investigações conduzam ao completo esclarecimento dos fatos e, caso seja comprovado crime, que seja punido", disse Ferreira, por meio de nota divulgada pela assessoria da Fenam.
A Sociedade Evangélica Beneficente (SEB), organização mantenedora do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (HUEC), também emitiu uma nota, na última sexta-feira, defendendo os procedimentos que são realizados na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da instituição.
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