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De acordo com uma pesquisa realizada em 10 unidades prisionais da região metropolitana de São Paulo, a “renda mensal” de detentos que praticaram crimes econômicos - quando em liberdade - era em média de R$ 46,3 mil.
O valor supera em 12,9 vezes o valor médio da renda mensal obtida pelos criminosos quando empenhados em atividades legais.
A pesquisa foi realizada pelo economista e professor da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste/Toledo), Pery Francisco Assis Shikida. O levantamento contou com a participação de 10 pesquisadores, 4 professores doutores, 3 mestrandas, 1 economista e 2 estudantes de direito.
Intitulada “Aspectos da Economia do Crime em Unidades Prisionais da Região Metropolitana de São Paulo: Elementos Teóricos e Evidências”, a pesquisa ouviu 408 detentos do sistema prisional da região metropolitana de São Paulo.
Questionados sobre o gênero, 74,8% dos entrevistados se declararam homens, 15,9% mulheres e 9,3% outros. Em relação à cor, 58,1% se autodeclararam pardos, 28,7% brancos e 13,2% pretos.
A realização da pesquisa se estendeu por 8 semanas, sendo uma por mês, de setembro de 2023 a abril de 2024, totalizando 56 dias, com uma média de 8 horas de trabalho por dia.
Os pesquisadores tiveram autorização da Secretaria da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo (SAP-SP) e do Poder Judiciário para acessar as unidades e os detentos. O trabalho também recebeu apoio do Centro Integrado de Comando e Controle (CICC/SP).
Profissão “bandido”
Segundo a pesquisa, houve uma concentração dos delitos em roubo/assalto (68,6%), tráfico de drogas (60,8%) e furto (43,1%).
Em outro bloco aparecem: receptação (13%), associação ao tráfico (12,3%), formação de quadrilha (9,1%), sequestro (7,4%), latrocínio (6,9%) e estelionato (6,4%).
No terceiro bloco encontram-se: extorsão mediante sequestro (2,9%), tentativa de latrocínio (2,7%), extorsão (2,2%), contrabando (2%), fraude (1%) e colarinho branco (0,2%).
Quando os detentos foram questionados sobre a ocupação profissional na época do crime, as respostas foram bem variadas.
Destacam-se as profissões de ajudante geral, motorista/motoboy, pintor, auxiliar da produção, servente de pedreiro/serviços gerais, empresário(a), lava-rápido, mecânico, pedreiro, vendedor e cabeleireira/manicure.
Entre os entrevistados, 7,8% admitiram viver do crime, sendo sua profissão “bandido”.
Renda mensal
A média da renda mensal obtida com o trabalho lícito foi de R$ 3.595,96, valor 12,9 vezes menor que a renda obtida na ilegalidade.
Para 76% dos entrevistados, a renda legal era suficiente para cobrir as despesas básicas, enquanto 24% afirmaram o contrário.
Já em relação à questão patrimonial, 41,2% dos presos não possuíam bens imóveis; 39,5% tinham imóveis registrados em nome de terceiros; e 18,8% possuíam imóveis em seus nomes. Apenas 0,5% não responderam ou não souberam responder.
De acordo com os pesquisadores, as principais motivações apresentadas pelos detentos para a realização da atividade criminosa passam pela ideia de ganho fácil, cobiça, ambição e ganância até a indução de outras pessoas.
“Com os benefícios maiores do que os custos, sendo a renda média do crime de R$ 46.333,00 (12,9 vezes mais do que a renda do trabalho legal), o crime compensa! Políticas de Estado que estimulem mais oportunidade, emprego, trabalho e educação são formas apontadas pelos pesquisados para diminuir esses crimes”, diz um trecho da pesquisa.
“Quando foram mencionadas as punições/penas capazes de dissuadir o crime, destacou-se a premência de leis críveis”, diz outro trecho.
“O crime compensa”
Quando perguntados sobre o custo-benefício da atividade criminosa, 91,2% dos detentos afirmaram que o benefício econômico foi maior do que o custo. Para 3,4%, o benefício foi igual ao custo e para 0,7% o custo foi maior do que o benefício. Não responderam ou não souberam responder 4,7%.
“De acordo com a racionalidade do delinquente, se a expectativa da prática criminosa, após sopesar os custos e os benefícios esperados, resultar em ganhos superiores aos custos, é muito provável que o delito seja efetuado", apontaram os pesquisadores.
Apesar de reivindicarem mais oportunidades de trabalho e educação como formas de reduzir a criminalidade, 31,1% dos entrevistados apontaram pena de morte para quem comete crimes violentos como estupro.
Outros 19,8% apontaram como solução o aumento da pena contra crimes violentos; 8,6% sugeriram prisão perpétua e 6,4% apontaram o “tratamento” como uma possibilidade.
Travas frágeis
Na literatura sobre o tema, a religião, a família e a educação/escola são apontados como travas morais dissuasórias da criminalidade.
Na pesquisa, as religiões com maiores frequências foram: evangélica (46,6%), católica (21,8%), candomblé (3,9%), umbanda (2,7%), espírita (2,2%) e judaísmo (0,2%).
Afirmaram não ter religião 22,1% dos entrevistados, enquanto 0,5% se consideram ateus ou agnósticos.
Quando questionados se praticavam ou não suas crenças religiosas, 49% responderam que não praticavam, enquanto 48,5% praticavam, 2,5% não responderam ou não souberam responder”
“A proporção de não praticantes respalda o argumento de que a religião, quando não efetivamente exercida, não está desempenhando o papel de trava moral contra ações ilegais”, diz trecho do levantamento.
Segundo a análise dos pesquisadores, os resultados demonstram “a fragilidade das travas morais para a maioria dos entrevistados que se envolveram com o crime”.