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Rui Costa Pimenta

Líder do PCO defende liberdade de expressão da direita e critica partidos de esquerda

“Se a esquerda não mudar de posição, será destruída”, diz presidente do Partido da Causa Operária
Um dos fundadores do PT, Rui Costa Pimenta defende a liberdade de expressão no duelo entre Trump e as Big Techs, critica militância identitária – como feminismo e movimento LGBT – e aponta incoerências na atuação da esquerda brasileira. (Foto: Divulgação PCO)

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Figura bastante popular na esquerda brasileira, Rui Costa Pimenta, de 63 anos, tem histórico de longa data no ativismo político: participou da refundação da União Nacional dos Estudantes (UNE) em 1979, foi diretor da Central Única dos Trabalhadores (CUT) na Grande São Paulo e participou do processo de fundação do Partido dos Trabalhadores (PT). Após divergências com a direção do partido, deixou a sigla e, em 1995, fundou o Partido da Causa Operária (PCO), do qual é presidente.

Pimenta disputou a presidência da República quatro vezes seguidas (todas pelo PCO) entre os anos 2002 e 2014. Apesar de receber números pouco expressivos de votos em todas as candidaturas, dedicou-se a aproveitar a exposição para difundir os ideais do seu partido. O PCO, de extrema-esquerda, define-se como uma agremiação “verdadeiramente revolucionária e comunista”.

Entre as principais propostas da sigla estão o fim do capitalismo por meio da implementação do socialismo; a estatização dos principais meios de produção; o fim das privatizações; a legalização das drogas; e até mesmo a extinção da Polícia Militar. O partido é crítico ferrenho de Jair Bolsonaro, considera que o impeachment de Dilma Rousseff em 2016 se tratou de um golpe e que a prisão de Lula se deu apenas para evitar que o petista concorresse às eleições presidenciais de 2018.

Por outro lado, o Partido da Causa Operária apresenta uma série de posicionamentos opostos à maioria da esquerda brasileira: é contrário ao desarmamento da população; critica a "demagogia ecológica" (que serviria para barrar o desenvolvimento do país); é favorável ao voto impresso; desaprova parte das condutas de movimentos identitários, como o feminismo e o movimento LGBT; e, recentemente, saiu em defesa de Donald Trump e das vozes conservadores que estão sendo caladas por meio da censura das gigantes da tecnologia, como Facebook, Twitter, Google e Amazon.

Rui Costa Pimenta é editor e jornalista responsável pelo jornal Causa Operária, diário vinculado ao partido. Desde o início da campanha eleitoral para a presidência dos Estados Unidos, o ativista tem utilizado o veículo para defender que há inúmeras atitudes antidemocráticas na forma como algumas das principais Big Techs – grandes empresas de tecnologia – do mundo e tradicionais jornais do país norte-americano agiram para impedir a reeleição de Trump. Após a vitória de Biden e, mais recentemente, após a invasão do Capitólio, o ativista tem defendido que há em curso “uma caçada à liberdade de expressão” a setores da direita e “um ataque gigantesco contra os direitos democráticos da população” nas ações executadas pelas gigantes da tecnologia, que desencadearam uma ofensiva nunca antes vista contra Trump e seus apoiadores.

A Gazeta do Povo entrevistou o fundador do Partido da Causa Operária com exclusividade. Na entrevista, Pimenta fala sobre liberdade de expressão, perigos da censura, guerra ideológica e tece críticas à forma como parte da esquerda tem endossado comportamentos autoritários e se afastado das camadas populares do país.

Após a invasão do Capitólio, várias ações têm sido orquestradas por grandes empresas de tecnologia para silenciar vozes conservadoras em todo o mundo. Isso é um problema, já que o debate político está bastante centrado nas mídias sociais e plataformas digitais. O PCO tem denunciado frequentemente essa ameaça à liberdade de expressão, inclusive saindo em defesa de Donald Trump. Por que o partido decidiu “comprar essa briga” que hoje está sendo travada majoritariamente pela direita?

Nessa luta nós não achamos que tenhamos que tomar lado – Trump ou Biden. Mas aqui se criou uma confusão: o Trump, apesar de todo o poder político que ele conseguiu, esse poder que ele tem é democrático, é um eleitorado; são pessoas que apoiam ele. Enquanto isso, os outros mantêm um poder político que é totalmente antidemocrático, burocrático, fundado no apoio massivo de bilionários e trilionários norte-americanos. Desse ponto de vista, podemos dizer que o Joe Biden é uma ameaça muito maior do que o Trump.

Joe Biden só pode ser chamado de democrata com aspas, ironicamente, porque esse homem é um genocida. Ele esteve no centro dos principais acontecimentos militares dos Estados Unidos nas últimas décadas. Ele é o pivô de todo o sistema político-militar agressivo dos norte-americanos. Iraque é uma das especialidades dele. Então chamar uma pessoa dessa de democrata é um insulto à inteligência.

O Trump e o trumpismo de um modo geral estão encurralados diante do poder dos adversários, que são muito mais poderosos do que ele. Toda a imprensa norte-americana está contra ele. Eu acho, inclusive, que o apoio de vários setores de esquerda às medidas antidemocráticas contra o Trump são uma histeria provocada por esse mesmo aparato político que é gigantesco e tem muita influência.

Não estamos em uma situação em que há uma luta entre o fascismo e a democracia. Isso é uma fantasia. Os acontecimentos estão mostrando, nesse momento, que o outro lado oferece um perigo real e prático muito maior do que o Trump. Esses acontecimentos de censura são muito graves.

Muita gente da esquerda interpretou a invasão ao Capitólio como um golpe de Estado. Eu não vi nada disso. Se os Estados Unidos estivessem à beira de um golpe de estado fascista, seria o caso de definir uma posição muito clara, muito radical e enérgica diante disso. Mas eu não vi isso. Algumas pessoas podem se assustar pelas faixas, pelo estilo, mas temos que entender o seguinte: os movimentos de direita também têm o direito de existir.

E o que eu vi foi um movimento democrático. Acho um exagero gigantesco falar que a invasão de um prédio público é um golpe de Estado. Não vi que foi um assalto para tomar o poder pela força, nada disso. Então eu vejo uma utilização inescrupulosa e maliciosa dos acontecimentos para atacar os direitos democráticos do povo norte-americano.

Biden se comprometeu como medida prioritária do governo dele aplicar uma lei contra o “terrorismo doméstico”. Se o pessoal acha que isso só vai ser usado só contra a direita, está muito enganado. Vai ser usado contra todo mundo que levantar a cabeça de forma que, primeiro, eles não gostem, e segundo, que eles tenham condições de aplicar a lei contra essas pessoas. Os movimentos populares, sindicatos, o movimento negro também.

O movimento negro, aliás, como vimos na véspera das eleições, realizou manifestações muito fortes; queimaram delegacias de polícia. Se invadir o Capitólio é terrorismo, imagine queimar uma delegacia de polícia.

Então eu acho que a esquerda perdeu o juízo. Eles viram o rato, que é o Trump, entrar no galinheiro, e decidiram entregar o controle do galinheiro para a raposa, que é o Biden. Precisa tomar muito cuidado com isso. A histeria não é um bom conselheiro em política. A gente precisa usar a cabeça.

Grupos de esquerda que têm endossado as ações de censura contra a direita estão, portanto, em uma direção oposta à liberdade de expressão?

Eles estão sim, e cada vez mais. Isso é algo curioso pelo seguinte: à medida que as pessoas vão adotando esse tipo de posicionamento elas vão adquirindo uma ideologia reacionária.

Apareceu há uns dias nas redes sociais toda uma defesa da tese do filósofo Karl Popper sobre o Paradoxo da Tolerância. Toda a esquerda falando disso para defender o fato de que você não pode ser tolerante com os intolerantes. Mas eles não sabem que o Paradoxo da Tolerância não está dirigido contra a extrema-direita. Ele foi elaborado para estar dirigido contra a esquerda comunista. Era uma tentativa de colocar o comunismo na ilegalidade. É uma tirada propagandística da Guerra Fria. Aí você vê para onde a esquerda está indo. Isso aparece em todos os lugares.

São sofismas que foram inventados para que você aprove uma política de restrição à liberdade de expressão, que é a mesma liberdade de pensamento. Se você puder pensar, mas não puder falar, então também não pode pensar.

Outra coisa que a esquerda não entende: os direitos não são direitos porque não têm contraindicação. Se você tem o direito de andar armado, é lógico que alguém vai usar mal esse direito. Então isso não é argumento. O direito é um direito, se vai ser mal usado por alguns isso não vem ao caso.

Então a esquerda não está só enveredando por um caminho antidemocrático nesse sentido (e, portanto, reacionário), como está adquirindo uma ideologia profundamente antidemocrática.

Na sua avaliação, há limites para a liberdade de expressão?

Acho que hoje em dia a gente deveria se preocupar mais com a liberdade do que com qualquer tipo de limite. Você não pode fazer acusações falsas de crimes contra as pessoas, calúnias. Mas esse conceito de a pessoa ser estritamente cuidadosa com a liberdade de expressão, isso não existe. O correto é lutar por uma liberdade de expressão total: a pessoa falou, você fala outra coisa.

Vários dos posicionamentos recentes do PCO são bastante parecidos com o que o jornalista Gleen Greenwald tem defendido nos últimos meses. Ele recentemente citou, em um canal de TV norte-americano, que empresas como o Facebook possuem comitês para definir o que pode ser considerado verdadeiro e falso e quais tipos de discursos serão e quais não serão permitidos na plataforma. Quais são as consequências de Big Techs ditarem o que é e o que não é permitido ser discutido?

Acho que ele está completamente correto nisso. Há uma monstruosidade que é o controle estatal sobre os novos meios tecnológicos. Todo mundo deveria ter medo dessa situação.

O livro 1984, do George Orwell, é uma brincadeira de criança perto disso que estão fazendo. Nós estamos conversando aqui agora, e eu tenho um celular em cima da mesa. Alguém pode estar escutando a conversa. Não só tecnologicamente é viável, como procuram fazer isso. É uma monstruosidade totalitária que nunca vimos antes. A tecnologia está permitindo o desenvolvimento das tendências totalitárias mais profundas da sociedade atual. É uma contradição, a tecnologia também permite o desenvolvimento das tendências progressivas, mas as tendências totalitárias e reacionárias são muito profundas.

Nós não podemos alimentar a ilusão de que esses grandes monopólios das redes sociais são verdadeiramente privados. O serviço de informação, o que o pessoal chama de “Estado profundo” – aquele grupo que controla de uma maneira muito mais acentuada a política nacional –, que é uma coisa que existe em todos os países, nunca iria permitir que uma coisa do poderio que têm essas empresas fosse independente do Estado. São empresas semiestatizadas: o lucro é privado, mas o funcionamento é estatal. E estatal num sentido perverso. Não é o Estado público, transparente, é o Estado secreto. Isso é muito negativo.

Aí soma-se ao cortejo de monstruosidades as pessoas quererem decidir o que é a verdade. Mas quem tem essa verdade no sentido jurídico da coisa? Eu defendo as coisas que acho que são verdadeiras, mas impor a uma outra pessoa é uma coisa muito mais complexa. É uma volta à Idade Média. Essas ideias de censura, da relatividade da liberdade de expressão, do controle social, tudo isso cheira muito a inquisição. Eu acho abominável. É um retrocesso em termos de civilização. Estamos diante de uma feroz investida ideológica com claro sentido bárbaro de volta ao passado. É uma reviravolta contra a Revolução Francesa de 1789.

Você acredita que grandes veículos de imprensa norte-americanos tenham intencionalmente contribuído para retirar Donald Trump da Casa Branca e que grandes empresas de tecnologia formam monopólios para silenciar o republicano e vozes conservadores que o apoiam. Explique, por favor, o que significa esse suposto interesse por trás de vários dos acontecimentos recentes?

O imperialismo é o poder dos grandes monopólios. Por ser monopólio, você já controla todo um setor econômico. Mas não são monopólios individualizados, eles se juntam e controlam o mercado mundial. É um poder exorbitante. Esses monopólios, que são dirigidos pelo sistema financeiro internacional, são representados pelo Joe Biden, não pelo Donald Trump.

O Trump é o representante de setores médios da burguesia norte-americana. Na eleição ficou absolutamente claro. Quem acompanhou as eleições percebeu que Wall Street apoiou em peso o Biden. Quer dizer, o principal setor do capitalismo internacional. Os meios de comunicação também, cartelizados contra o Trump. Todas as grandes empresas de redes sociais se juntaram para tirá-lo.

É a luta do setor mais poderoso da burguesia norte-americana, o setor propriamente dito imperialista, monopolista, contra outros setores da burguesia, que não são pequenininhos, não é um comerciante. Há industriais; o próprio Trump é um bilionário e tem um certo poder. Mas não tem parâmetro de comparação.

Em um texto recente do jornal da Causa Operária, vocês enfatizam que as eleições presidenciais dos EUA em 2020 foram a mais fraudulenta da história. Com base no que vocês fazem essa afirmação?

Nós não temos prova nenhuma, o que não impede de fazer uma consideração política sobre o problema. Primeiro, toda essa cartelização da imprensa tem um “reverso da medalha” que é o seguinte: os meios de divulgação da direita foram sendo aniquilados nas redes sociais muito antes de o Trump ser banido do Twitter. Vários e vários grupos que divulgavam a política do Trump foram completamente cortados. Isso já é uma fraude, começa por aí.

Segundo lugar: o voto por correspondência não é admissível. O voto por correspondência ensinou que houve uma fraude. Por que essa insistência em algo que todo mundo sabe que é muito mais fácil de fraudar? O correio recebe o voto num determinado lugar, armazena aquele voto, e a coisa mais fácil do mundo é fraudar isso.

É como também o debate no Brasil. Por que o STF não determina que, embora tenha a urna eletrônica, haja também o voto impresso? Tudo pode ser fraudado, mas o voto impresso é muito mais fácil de ser auditado.

E em terceiro lugar, o pessoal do Biden é famoso por fraudar eleições. Já fraudaram uma, que foi a eleição do Bush contra o Al Gore. Mas ninguém vai se levantar contra isso agora porque toda a imprensa fica batendo que não é verdade.

Mais especificamente no Brasil, como você avalia os passos da esquerda brasileira atualmente?

Eu acho que a maior parte da esquerda (falando logicamente das forças organizadas, não do esquerdista avulso) está muito atrelada à luta parlamentar, que é um reformismo de baixíssimo voo. Isso impede que essa esquerda se desenvolva como popular.

O que nós precisaríamos não é chegar no Congresso e propor um plano contra o desemprego, mas é mobilizar os trabalhadores. O fechamento da Ford, num certo sentido, embora tenha muito mais a ver com a própria Ford, não tanto com o Brasil em si, indica que é possível que a gente viva uma nova onda de demissões. Então ter uma política para o povo defender seria uma questão essencial. O parlamento, em grande medida, é uma farsa desse ponto de vista. Você vai lá, faz um discurso: “o povo precisa disso, precisa daquilo”, mas não acontece nada. Propõe um projeto de lei e só é aprovado aquilo que os setores que são uma verdadeira oligarquia encastelada no parlamento há décadas concorda em apoiar, senão não acontece nada.

Eu acho que a esquerda precisaria abandonar essa mentalidade parlamentar e se dirigir para o povo, para as ruas. Por outro lado, acho que está se processando uma grande transformação interna. O golpe de 2016, o governo Bolsonaro, todos esses problemas políticos tiveram o condão de colocar o país numa crise, mas também tiveram o mérito de acabar com aquela modorra política que existia antes. Então acho que podemos esperar para o próximo período um deslocamento de forças da esquerda para “mais à esquerda”.

Como você avalia o comportamento de movimentos identitários de esquerda, como o movimento feminista, LGBT, antirracista, etc.?

É um comportamento autoritário, isso desagrada muita gente. Os identitários são uma camada superior, não são uma camada popular. Eles são uma camada pequeno-burguesa, em muitos casos, burguesa, e sentem que têm o apoio das instituições, então querem converter na marra: “não pode falar isso”, “não pode fazer isso”, “não pode fazer aquilo”, falou tal coisa é preso, julgado, condenado, etc.

Eu acho que ninguém nunca convenceu o povo desse modo. Tenho uma longa trajetória política, estudei muito o problema dos movimentos sindicais, populares, políticos em geral e nunca vi o cidadão ser convencido na marra. Você pode se conformar com uma situação em que você está sendo obrigado a fazer determinada coisa, mas vai chegar uma hora em que vai ser voltar contra. É muito negativo.

Não acho que os identitários sejam os defensores do negro, da mulher ou da população LGBT. Eles são uma determinada facção, com esse método que, na minha opinião, é totalmente incorreto. É um método aristocrático: ou você faz o que estou falando ou vai se dar mal. Sou totalmente contra e acho que tem muita gente cansada disso.

O que é “esquerda pequeno-burguesa”?

A esquerda é um espectro amplo da sociedade, e como tal é muito variado. Você pega o PSOL, por exemplo. É um típico partido de esquerda: defende os negros do jeito deles, a população LGBT, alguns direitos democráticos (também tem um viés autoritário), defende algumas políticas sociais. Genericamente é um partido de esquerda. Mas não é um partido revolucionário e não é um partido que tenha em vista principalmente os interesses da classe trabalhadora, a imensa maioria do país. É um partido cujas posições tem como base e endereço setores de classe média. É isso que chamamos de esquerda pequeno-burguesa.

Ela tende a ser reformista, numa política de “voo de galinha”. Tende a ser reacionária em uma série de coisas. O PSOL está cheio de propostas e projetos que são abertamente reacionários. É a esquerda de um determinado setor, das classes médias, até de uma margem da classe superior. Nós lutamos para constituir um partido da classe trabalhadora, da classe operária. Há uma diferença radical.

O que significa ser “esquerda revolucionária” no Brasil hoje?

A esquerda revolucionária hoje e em qualquer momento é aquela que vê que a única solução para a sociedade em que vivemos é a revolução. Temos um regime político tão esclerosado, tão burocrático, antidemocrático, dominado por forças exteriores à sociedade brasileira – que são os grandes capitalistas dos países mais desenvolvidos – e a população na miséria. Temos a consciência de que o desenvolvimento da sociedade só pode vir por meio de uma revolução.

Nós acreditamos que as contradições internas da nossa sociedade vão levar a isso. A sociedade caminha para um beco sem saída. Aliás, a única saída desse beco seria a revolução. Nesse sentido, a política revolucionária consiste num permanente agrupamento de forças em torno de um programa, de uma consciência e clareza políticas.

Nós somos favoráveis a mobilizar a maioria do povo. Nesse sentido, temos uma concepção democrática da revolução, é uma revolução de maioria. Não somos favoráveis a impulsionar nenhum tipo de barbárie, não somos favoráveis à restrição dos direitos de ninguém.

O Partido da Causa Operária se define como “verdadeiramente revolucionário e comunista”. Há muitas críticas ao caráter autoritário do modelo comunista, inclusive países como Coreia do Norte, China e Cuba, entre outros governos autoritários, ocupam as posições finais do ranking de liberdade de imprensa da ONG Repórteres Sem Fronteiras. Como você avalia a relação comunismo e liberdade de expressão?

O comunismo em geral não é conflitante com nenhum tipo de liberdade. Nós acreditamos que uma sociedade efetivamente comunista proporcionaria um nível de liberdade nunca vista antes. Mas nós não estamos falando de verdadeiras sociedades comunistas. Estamos falando de países muito atrasados economicamente que, pelas contradições e pela evolução do capitalismo mundial, realizaram uma revolução para a qual eles historicamente não estavam preparados. O socialismo que Marx concebeu era para começar no nível maior de desenvolvimento do capitalismo. Coreia do Norte, Cuba e a antiga União Soviética, nenhum deles pode ser classificado como um país desenvolvido. São revoluções que não são efetivamente o caminho direto para o socialismo, não são sociedades socialistas na nossa concepção, são sociedades de transição.

É como se fosse uma anomalia histórica. É como se a história tivesse produzido um fenômeno extremamente contraditório. Para que essas sociedades se desenvolvessem em direção ao socialismo seria necessário que os países mais desenvolvidos também se desenvolvessem nesse sentido. Eles têm uma capacidade técnica e tecnológica muito superior. Nós não somos partidários da ideia de que o socialismo possa ser a distribuição da miséria.

São países sitiados vivendo em situações muito difíceis quanto à sobrevivência. No caso cubano, por exemplo, a sobrevivência exige um regime político centralizado. Se o regime cubano se descentralizar politicamente, se abrir uma possibilidade de uma ampla liberdade para todos os setores, será engolido pelos norte-americanos.

Da Coreia não falo porque não conheço muito. É um país fechado, há pouca informação, então tem que tomar um certo cuidado. Evidentemente que o regime é ultracentralizado. Certas coisas dá para perceber de longe. Cada sociedade é uma sociedade complexa.

Da mesma maneira que Cuba, por exemplo, são regimes que não têm nenhum tipo de democracia nesse sentido. Eu acho que um país como Cuba tem outro tipo de democracia, como a participação da população numa série de coisas que os países capitalistas não têm. Mas uma coisa que temos que ter em mente é que os países atrasados, em geral, são ditaduras mesmo. Até os países atrasados capitalistas são uma ditadura. O Brasil não é uma democracia. No Brasil acontece muita coisa fora do comum do ponto de vista de ser antidemocrático.

Então, nós não podemos negar que esses países não são mesmo democráticos no sentido tradicional da palavra. A União Soviética não era nem no sentido não tradicional, não era democrática em nenhum sentido. Mas acho que cada caso é um caso e temos que analisar as coisas de uma maneira concreta, e nada disso tem a ver diretamente com nenhum comunismo; tem a ver com atraso, com a falta de desenvolvimento econômico.

Como você avalia o apoio que o Partido da Causa Operária tem recebido de setores da direita quanto às publicações recentes do partido em defesa da liberdade?

Apesar de muita gente achar isso confuso, eu pessoalmente acho positivo. Nosso programa não é de ocasião. Temos um programa que levamos extremamente a sério. Não é um dogma, uma cartilha, é toda uma concepção da política que discutimos, que tem uma função de criar uma consciência a longo prazo. Não tem nada a ver com política eleitoral. O político profissional, que é candidato, ele fala o que o eleitor quer ouvir naquela hora, e no dia seguinte ele muda de opinião. Isso não ajuda a organizar o povo, não significa nada.

Muita gente da esquerda fala: “Você está defendendo o Trump”. Nós não estamos defendendo ele, estamos defendendo um direito que vale para o Trump, vale para nós, vale para todo mundo. Nós lutamos contra o Trump com os métodos que consideramos corretos.

Que um setor da direita apoie a posição do Partido da Causa Operária, primeiro eu acho positivo porque fortalece a posição em si. Em segundo, nosso partido não vai ser arrastado pelo apoio de nenhum setor.

Quando você tem várias tendências confluindo para o mesmo ponto, vai vigorar aquela que representa efetivamente aquela política. Então eu acho bom. Querem defender a liberdade de expressão? Nós também. Não tem problema que o cidadão tenha uma ideologia diferente da nossa.

Qual é a avaliação que você faz quanto à guerra ideológica travada no Brasil hoje?

A guerra ideológica é absolutamente natural na medida em que o país fica polarizado. Não é só o Brasil que está polarizado, os Estados Unidos também estão e em altíssimo grau. Isso é o reflexo da intensificação da luta entre setores sociais.

A única coisa que acho que merece uma consideração especial é que essa polarização é muito confusa ainda nesse momento porque as posições da direita têm um certo viés de oposição ao sistema estabelecido e de apelo popular – um viés, não é o conteúdo. O Trump, a gente vê, ele tem posições que têm apelo para setores da classe operária norte-americana. Nós estamos ainda num momento de confusão. À medida que se desenvolva essa polarização, os campos ideológicos vão ficar mais nítidos. E estamos em processo de esclarecimentos desses campos.

Agora, acho que a esquerda não está trabalhando bem para a sua causa e a sua sobrevivência, porque apoiar censura e outras coisas é um bumerangue, ou seja, você joga, passa perto do alvo e volta para a sua cabeça. Se a esquerda não mudar de posição, vai ser destruída juntamente com o sistema, que está em colapso.

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