A Inglaterra mandou para o Brasil 64 contêineres com lixo entre fevereiro e maio deste ano. Chegaram 40 contêineres no Porto de Rio Grande (RS), 8 em Caxias do Sul (RS) e mais 16 no Porto de Santos (SP), segundo informações do Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul. A carga deveria conter polímeros de etileno (produto utilizado como isolante térmico na fabricação de plástico) para reciclagem, mas na realidade estava repleta de lixo doméstico.

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A Procuradoria da República no município de Rio Grande já solicitou à Polícia Federal (PF) a abertura de inquérito para apurar as responsabilidades sobre a importação das cerca de 740 toneladas de resíduos provenientes do porto de Felixtowe, na Grã-Bretanha. A procuradora Anelise Becker solicitou ainda que a Procuradoria-Geral da República, em Brasília, faça contato com o Ministério das Relações Exteriores. A ideia é informar o Reino Unido sobre os fatos, para que se providencie o retorno do lixo à sua origem.

Fernando Salino Cortes, engenheiro civil especializado em Engenharia Sanitária e Ambiental pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro e mestre em saúde pública pela Universidade de São Paulo (USP), diz que é surpreendente que isso ainda aconteça. Ele lembra que essa era uma prática usual na década de 1980 e até há alguns anos, quando navios percorriam países tentando descarregar resíduos. Depois, completa, foram criadas leis que impedem essa prática.

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"O custo para operar e gerenciar qualquer sistema (de processamento de lixo) ainda é muito alto. Então, muitos países despacham para qualquer lugar", afirma o biólogo Rodrigo Berté, doutor em Meio Ambiente e coordenador da pós-graduação em Gestão Ambiental do Grupo Uninter. Os países mais pobres acabam recebendo esse material e depositando-o a céu aberto, completa ele, embora possam e devam devolvê-lo.

Impasse

As tentativas de exportação do lixo e as discussões em torno da localização da unidade de processamento dos resíduos gerados em Curitiba e em mais 16 municípios da região metropolitana são dois exemplos de um impasse que parece longe de ter um fim: todos querem consumir, e assim produzem lixo, mas ninguém quer que esse material seja depositado perto da sua casa.

Para Cortes, esse comportamento é tão antigo quanto a humanidade e está presente em todas as culturas. "Os índios já jogavam seu lixo nos rios, para que ficasse longe deles. Como o volume era muito pequeno, o problema era resolvido pela capacidade de autodepuração do rio", diz o especialista. Segundo ele, é até compreensível que as pessoas não queiram os resíduos perto de suas casas, mas não é fácil entender por que não há contribuição – nem da comunidade nem do poder público – para que seja gerado um volume menor de lixo.

Berté aponta que o grande problema está na visão que as pessoas têm dos modelos de tratamento utilizados até agora. De acordo com ele, esses sistemas arcaicos têm uma imagem negativa. E as novas tecnologias propostas – como está sendo prometido em Curitiba – ainda não convencem a população, embora sejam realmente melhores. "O nosso problema é que ninguém sabe o que é realmente esse modelo diferente", completa.

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O secretário municipal do Meio Ambiente de Curitiba, José Antônio Andreguetto, concorda que as pessoas rejeitam o lixo perto de suas casas porque o país ainda tem o aterro sanitário como a melhor tecnologia disponível. "A prática de enterrar o lixo não demonstra para a população que o resíduo pode se transformar em renda ou emprego". Segundo ele, Curitiba está tentando quebrar esse paradigma, mas esbarra na dificuldade de demonstrar que é possível. "As oito propostas técnicas abertas demonstram isso e estão disponíveis para quem quer conhecer", diz o secretário. Ele cita, ainda, que a nova unidade de processamento vai abrir de 150 a 250 oportunidades de emprego.

Para Andreguetto, a solução passa pela redução do lixo, mas o modelo de consumo vigente impede que isso aconteça. "As pessoas precisam buscar produtos que reduzam a geração de lixo. Se o consumidor pedir, o mercado vai atender", aposta ele.

Compensação

Ao comentar o caso de Curitiba, Fernando Salino Cortes mostra que é possível entender a postura dos moradores da Caximba, que não querem continuar recebendo o lixo de Curitiba e região. "Eles nunca tiveram uma compensação ambiental adequada". Ele diz que, se tecnicamente o local for o mais apropriado, precisa haver uma negociação. Rodrigo Berté também cita a importância da compensação para a cidade que fica com o lixo. De acordo com ele, a comunidade do entorno da unidade de processamento do lixo precisa ter benefícios.

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