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Moradia provisória no Garcia, em Blumenau: famílias têm áreas próprias separadas por divisórias, mas banheiros, chuveiros, cozinha e área de serviço são comunitários | Fotos: Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Moradia provisória no Garcia, em Blumenau: famílias têm áreas próprias separadas por divisórias, mas banheiros, chuveiros, cozinha e área de serviço são comunitários| Foto: Fotos: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

Família vive há um ano na escuridão

A cada anoitecer, a família da dona de casa Madalena Marques é obrigada pelas circunstâncias a se lembrar do dia 23 de novembro de 2008, data da forte chuva que desabou sobre Santa Catarina. Os Marques, que moram em Arraial do Ouro, na região rural do município de Gaspar, tiveram de sair da casa de madeira, que estava cheia de lama, em meio a grandes pedras que eram levadas pela água e morros que deslizavam.

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Casal continua desaparecido

Familiares de Elisane Brittes e de Fábio Baggio foram chamados ontem ao Instituto Médico-Legal (IML) para fazer o reconhecimento de dois corpos encontrados no Rio Igua­­çu, em Araucária, na re­­gião metropolitana de Curitiba. Fábio e Elisane desapareceram na quinta-feira passada, depois que o carro em que estavam caiu no Rio Mos­­sun­­guê.

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RS tem 47 mil casas sem energia elétrica

Mais de 47 mil casas ainda estão sem energia no Rio Grande do Sul devido às chuvas que atingem o estado desde a última quin­­ta-feira. O problema se agravou na madrugada de ontem, quando um temporal derrubou duas torres de transmissão na região central do estado e afetou cerca de 10 mil residências só na cidade de São Pedro do Sul.

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Casas devem sair apenas em junho de 2010

A previsão do secretário de Assistência Social de Blumenau, Mário Hildebrandt, é de que, até o fim do primeiro semestre de 2010, haja casas novas em número suficiente para atender as pessoas que hoje vivem nas moradias provisórias.

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  • Aperto: para cada família, um espaço de aproximadamente 30 metros quadrados

Em sete endereços de Blumenau ainda é possível encontrar um tipo especial de vítima das enchentes de 2008. Para esse grupo de 1.150 pessoas, as águas que devastaram a cidade exatamente um ano atrás não representaram apenas o fim de seus sonhos, não levaram apenas seus pertences, não acabaram apenas com suas casas. Para eles, as enchentes puseram fim também à própria noção de privacidade.

Desde que foram obrigados a deixar seus lares – destruídos pelas chuvas ou condenados por estarem em áreas que não são mais seguras para alguém morar, se é que algum dia o foram – essas pessoas esperam pela reconstrução de suas casas. Por enquanto, porém, se viram como podem nas moradias provisórias organizadas pela prefeitura.

Em Santa Catarina, durante a tragédia de 2008, cerca de 80 mil pessoas chegaram a sair de suas ca­­sas. Muitas puderam voltar assim que as águas baixaram. Cer­­ca de 28 mil continuam desabrigadas e desalojadas no estado. Para muitas delas, as moradias provisórias são a única solução.

Em Blumenau, as moradias provisórias funcionam desde março. São galpões e escolas alugados pela prefeitura. Para separar uma família da outra, foram colocadas divisões de madeira e formadas pequenas moradias, de cerca de 30 metros quadrados.

Dentro das moradias, a família consegue montar sala e quartos com os bens salvos na enchente. Mas banheiros, cozinhas, chuveiros e área de serviço são todos compartilhados entre os moradores.

E as áreas de uso comum são um combustível para a confusão. Segundo o secretário municipal de Assistência Social, Criança e Adolescente, Mário Hildebrandt, dentro dos galpões há registros de brigas e de crimes. As ocorrências mais comuns, diz Hildebrandt, são uso de substâncias psicoativas, agressões físicas e verbais e violência contra a mulher. Já houve casos de atentado violento ao pudor.

A cada dia, a situação se torna mais insustentável, dizem os moradores. Um simples esbarrão entre duas jovens, no último dia 16, quase as levou às vias de fato, na maior moradia provisória da cidade.

Para fugir das confusões, a dona de casa Maristela de Almeida Dico leva a filha Letícia, 2 anos, ao parquinho. Quando estão no galpão, a menina chega a ficar irritada com o barulho, sempre intenso. "Não aguento mais nem um dia aqui. Tem barulho e a gente sente falta de ter as nossas coisas. A privacidade acabou", diz Maristela. A filha começou a andar no abrigo onde a família morou antes de ir para a moradia provisória. O abrigo ficava numa igreja e a divisão do espaço era feita por quatro bancos.

Maristela agora está grávida novamente. E acha que a criança, que deve nascer em fevereiro, também irá passar um tempo na moradia provisória. A mãe lamenta que o bebê não terá um quarto pronto quando nascer, esperando por ele.

Já o jardineiro Jorge Luiz da Silva não sabe se é melhor sair para trabalhar ou ficar na moradia provisória, de olho nos filhos. Silva tem nove filhos, a mais velha tem 18 anos e o mais novo está com 1 ano e 8 meses. A esposa está grávida de 8 meses. O jardineiro tem me­­do de que os filhos: se envolvam com pessoas erradas. "Deixo de trabalhar fora para cuidar das crianças", conta Silva. "Quando vou, não vejo a hora de voltar."

O jardineiro diz que é complicado viver na moradia provisória. Além do aperto, há pessoas estressadas, que bebem demais, usam drogas. "A pessoa que não foi atingida pela chuva que agradeça a Deus, dê valor à sua vida porque tem uma vida decente."

Polêmica

As moradias provisórias são um assunto polêmico em Blumenau. De um lado, os desabrigados reclamam da demora para a construção das novas casas e dizem não ter condições de se reerguer sozinhos. Por outro, há quem critique o fato de a prefeitura ajudar essas famílias por tanto tempo. Um educador social, que prefere não se identificar, afirma que alguns desabrigados comentam que vivem melhor na moradia provisória e que não querem sair de lá.

Os locais onde ficam as sete moradias provisórias de Blu­­me­­nau são alugados pela prefeitura a um custo de R$ 650 mil por semestre. São fornecidos água, luz e gás para estes moradores. Na moradia do bairro Garcia, onde vivem 460 pessoas, há controle de entrada e saída e visitas são permitidas das 6 às 21 horas.

"Temos educadores sociais, temos psicólogos atendendo, só que boa parte do estresse dos moradores é porque as pessoas não aprenderam a conviver em condomínios, em comunidade", diz o secretário Mário Hildebrandt. "A prefeitura é como se fosse o síndico, com a função a mais de ter educadores para fazer o monitoramento diário."

Os moradores são responsáveis pela limpeza, que deixa a desejar. Na moradia do Garcia havia cheiro forte no banheiro e fezes no ralo dos chuveiros. Por essas e outras, o jardineiro Itair Machado está contente por saber que vai para casa. Após um ano, saiu o laudo liberando a volta. Irá agora reformar dois banheiros e refazer o muro e uma parede. "Até fevereiro quero estar em casa", comemora. Para a maioria de seus atuais vizinhos, porém, as boas notícias ainda não vieram. Resta ter paciência e seguir vivendo – um dia difícil após o outro.

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