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Transparência

Senador coleta assinaturas por CPI para “abrir caixa-preta” de ONGs na Amazônia

Senador Plínio Valério (PSDB-AM) é autor do requerimento para a CPI que vai investigar ONGs que atuam na Amazônia (Foto: Roque de Sá/Agência Senado)

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Em meio à crise humanitária que atinge os yanomamis e às denúncias sobre a atuação das ONGs na Amazônia, o senador amazonense Plínio Valério (PSDB-AM) tenta novamente emplacar a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado para investigar a atuação de organizações não-governamentais na região amazônica. O intuito da CPI, segundo o senador, é abrir a "caixa-preta” dessas ONGs, algo que ele tenta desde 2019, quando apresentou o primeiro pedido de instalação.

Na última legislatura, Valério conseguiu o número mínimo de assinaturas para a CPI, mas o pedido apenas foi lido no Plenário e não houve a instalação da comissão. Com o fim da legislatura anterior, o pedido foi arquivado e será preciso seguir todo o trâmite novamente para a criação da CPI, o que já vem sendo feito pelo parlamentar. A nova solicitação deve ser apresentada nos próximos dias, segundo Valério.

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Esta não será a primeira vez que se pretende investigar a atuação de ONGs brasileiras. No ano de 2007, foi instalada uma CPI no Senado para investigar repasses financeiros ocorridos no primeiro mandato do governo Lula (entre 2003 e 2006) para entidades ligadas ao governo federal e ao Partido dos Trabalhadores (PT).

Valério garante que não faltam denúncias sobre irregularidades em organizações ligadas ao governo federal em gestões petistas anteriores. Em 2011, o Tribunal de Contas da União (TCU) admitiu a dificuldade de fiscalizar recursos públicos destinados às ONGs devido à falta de prestação de contas das entidades.

No ano de 2019, quando recém assumiu o Ministério da Saúde, o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta denunciou que ONGs administradas por traficantes de drogas que venceram licitações no governo petista usaram recursos destinados a atender áreas indígenas na Amazônia pelo SUS para transportar, além de medicamentos, todo tipo de drogas.

Confira a entrevista exclusiva do senador amazonense à Gazeta do Povo sobre as tentativas de investigar ONGs e a questão indígena na Amazônia:

Por que o senhor pretende abrir a CPI das ONGs e como está o andamento dessa instalação?

Plínio Valério: A CPI das ONGs sempre foi necessária e é fundamental para abrir essa "caixa preta" que envolve as ONGs, principalmente na Amazônia.

Queremos abrir a CPI, porque se ganha muito dinheiro usando o nome da Amazônia e ficou claro, agora com a crise yanomami, que há ONGs ganhando dinheiro à custa da miséria dos yanomamis. E isso é só um exemplo. Também há ONGs que receberam 400 milhões em um ano, e o Fundo Amazônia, que financia essa gente, não pede prestação de contas.

Quanto à instalação da CPI, tivemos que recomeçar, porque acabou a legislatura e [o pedido] foi arquivado. Então, já estou colhendo novas assinaturas e não vou ter dificuldades. Acredito que devo apresentar um novo pedido nesta semana.

Há denúncias sobre a atuação dessas ONGs?

Plínio Valério: Temos o relatório do Fundo Amazônia, que financiou algumas ONGs – R$ 17 milhões, R$ 14 milhões, R$ 54 milhões... – e as organizações não prestaram contas desses valores. Então, a gente pode partir do Fundo Amazônia e da denúncia do ex-ministro da Saúde do governo Bolsonaro, quando ele informou que o governo anterior, do PT, tinha gastado mais de R$ 1,4 bilhão com três ONGs.

Tem também relatórios do TCU. O próprio ministro Vital do Rêgo já auditou 20/22 convênios de ONGs, e 18 deles têm problemas, ou seja, gastam 85% do dinheiro que arrecadam entre eles. Então, tem muita coisa para analisar. Fora o que a gente sabe que tem, escuta falar, existe e vê, mas não pode provar porque não consegue chegar lá.

Na sua avaliação, as ONGs mais atrapalham do que colaboram no desenvolvimento das aldeias?

Plínio Valério: As ONGs atrapalham muito mais. O próprio Instituto Socioambiental (ISA) tomou conta da região do Alto Rio Negro, que é a região mais rica do planeta, e não somente a mais rica do Brasil. E lá só entrava quem o ISA permitia.

O instituto chegou a fazer convênio com a Funai para executar o serviço da Funai. Ou seja, a Funai, no governo do PT, terceirizou o seu trabalho para o ISA, que se tornou um braço para atacar as pessoas. Eu tenho contato com os baniwas (grupo indígena que vive na fronteira do Brasil com a Colômbia e Venezuela), que são revoltados com o ISA. E na minha concepção, tenho certeza absoluta de que elas [ONGs] atrapalham.

Há influências estrangeira na atuação dessas ONGs? Na sua avaliação, isso é bom ou ruim?

Plínio Valério: Existe a atuação de grandes fundos internacionais, como o Império Rockfeller, de ingleses, George Soros, entre outros. Eles arrecadam dinheiro, e não é só no Brasil que eles manipulam. Estamos sendo vítimas disso. Eles fazem o que querem e não é só na questão ambiental. Eles manipulam a questão política na acepção do termo e isso é muito ruim, porque hoje, com o governo do PT, o Estado volta a ser aparelhado, e a Funai vai fazer o papel que fazia no PT.

É um caos total. Você vê agora, por exemplo, essa hipocrisia: tem um cacique preso [o líder indígena e apoiador de Jair Bolsonaro, José Acácio Serere Xavante, que foi preso em dezembro após protestar contra a vitória de Lula nas eleições] e ninguém falou pelo cacique. Agora, vai mexer com um índio na aldeia dele, onde as ONGs estão dizendo proteger. É muita hipocrisia de quem não conhece, de quem não dá valor ao homem. Não se pode preservar a Amazônia sem preservar o ser humano.

Um relatório da Unicef mostrou que a Amazônia é o pior lugar do planeta para crianças viverem, e que existem nove milhões de residências que não têm dinheiro para comprar uma cesta básica. Trata-se de um cenário triste com ONGs arrecadando milhões. Isso por si só já diz tudo.

Sobre a crise humanitária dos yanomamis, na sua avaliação o que aconteceu e o que pode ser feito para amenizá-la?

Plínio Valério: Essa questão dos yanomamis sensibiliza, mas se formos analisar por outro lado, pode ser encarada de uma forma cruel. Ali os yanomamis vivem isolados, sem produzir, e somente duas ONGs têm acesso. São índios que vivem como esse pessoal de ONGs querem que vivam: isolados e sem equipamentos para produzir e plantar. Por isso eles vivem dependendo de ajuda.

Eles não plantam mandioca, não têm milho e não têm muita água. Então é difícil falar sobre os yanomamis sem parecer que não nos sensibilizamos. É claro que nos sensibilizamos. Porém, eles foram ficando desnutridos há muito tempo. E isso é culpa também de quem ganha dinheiro e está lá pra assistir e não assiste. Então essa questão vem à tona: até que ponto vale essas ONGs tomarem conta, dominarem e isolarem os indígenas?

Como representante da Amazônia, como o senhor avalia a política indigenista no país e o que deve melhorar?

Plínio Valério: O que a gente precisa melhorar é dar valor e respeitar o que o índio quer. Há tribos que não querem a presença do branco e há tribos que querem viver isoladas. Tem que respeitar isso. Mas tem tribos que querem usufruir de hospitais, escolas, de internet e transportes.

Vou ter dar um exemplo dos baniwa, que vivem na região do Alto Rio Negro. Nós conseguimos, no governo passado, colocar internet [na aldeia dessa etnia] e foi a glória pra eles. Também garantimos um barco com motor para colherem castanhas.

E como outro exemplo, dos tenharins, conseguimos canoa de alumínio com motor para as famílias colherem castanhas. Eles colhiam à remo e canoa. Pergunta para o índio se ele prefere o barquinho com motor ou quer remar para colher castanhas?

Os índios querem cooperativas para explorar o seu minério, para sair da aba do branco. Tem índios que dizem que têm vergonha de pedir ajuda. Quem quer viver isolado que viva, mas quem não quer, não precisa de tutela. E eu conheço muitos índios que não querem mais ser tutelados.

Outro lado

A reportagem abriu espaço para o Instituto Socioambiental se manifestar sobre as denúncias feita pelo senador. Em nota, o ISA informou que não tem competência para conceder autorização aos ingressos em aldeias indígenas.

Confira a nota, na íntegra:

"Não é de competência do ISA ou de qualquer organização da sociedade civil conceder autorização para ingresso em terras indígenas. Não são novas e já foram desmentidas pelas próprias organizações indígenas as tentativas do parlamentar de difamar organizações da sociedade civil que atuam na defesa dos direitos indígenas. O senador busca desqualificar a atuação das instituições e lideranças indígenas para legitimar o interesse de grupos empresariais nesses territórios. Demonstra ainda seu total desconhecimento sobre o direito à autonomia e autodeterminação dos povos indígenas, que são livres para tomar decisões acerca de seus modelos de desenvolvimento."

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