Criado há dez anos, o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (Sinaes) tornou mais rigorosa a cobrança por qualidade nas faculdades, tanto públicas quanto privadas, puniu instituições mal avaliadas e tornou acessíveis a qualquer pessoa os resultados dessas avaliações, criando um novo critério de escolha para milhões de estudantes interessados em se matricular no ensino superior.
A lista de benefícios trazidos pelo sistema é grande, garantem analistas, mas isso não o isenta de críticas. O Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) virou o principal alvo de reclamações por parte das universidades, que pedem um modelo mais relevante aos formandos e capaz de evitar boicotes.
Quando o Sinaes passou a valer, em 2004, o crescimento explosivo no número de pequenas faculdades privadas de qualidade duvidosa era a principal preocupação dos educadores. De 1996, quando foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), até 2004,o número de instituições de ensino superior no país cresceu 180%, partindo de 922 para 2.013, incluindo públicas e particulares. A criação do sistema freou a expansão desordenada. Na última década, o surgimento de novas faculdades seguiu alto, mas passou a um crescimento médio menor, de 84% no período. O Brasil possui hoje 2.391 instituições de ensino superior.
Mérito
"O principal mérito do Sinaes foi o de implantar uma cultura de avaliação em todas as instituições do ensino superior, sem que as universidades ficassem dependendo dos humores de um governo ou outro", destaca Ronaldo Mota, reitor da Universidade Estácio, do Rio de Janeiro, e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão normativo do Ministério da Educação (MEC) na época da promulgação da lei que criou o sistema. Antes do Sinaes, o Exame Nacional de Cursos, antigo Provão, era praticamente o único parâmetro de qualidade, mas não havia um dispositivo capaz de supervisionar o funcionamento de instituições já autorizadas e reconhecidas pelo MEC. "O Provão foi uma boa iniciativa, mas era incompleto", avalia Mota.
O professor André Gontijo, pró-reitor acadêmico na FAE Centro Universitário, trabalhou no MEC justamente no processo de implantação do Sinaes. Quando deixou o governo, em 2007, ele passou a acompanhar a evolução do sistema pelo lado das instituições de ensino. A transparência trazida pelo sistema é o principal aspecto destacado por Gontijo. "O Sinaes passou a mostrar quais instituições estão com problema e quais estão bem. Para instituições sérias, a criação desses índices foi ótima, porque deu à população informações para uma escolha consciente."
Indicadores
Gontijo refere-se ao Conceito Preliminar de Curso (CPC) e ao Índice Geral de Cursos (IGC), indicadores que mostram, respectivamente, a nota de cada curso de uma instituição e pelo conjunto de cursos. As notas recebidas pelas instituições nesses dois índices estão disponíveis no site emec.mec.gov.br.
Enade é o ponto frágil do modelo, dizem instituições
Embora pareça unânime entre as instituições a opinião de que o Sinaes trouxe benefícios, um aspecto do sistema é intensamente criticado pelas faculdades. O Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) é um dos componentes mais importantes do processo de avaliação. Ele corresponde à 60% do Conceito Preliminar de Curso (CPC), mas como carece de valor prático a quem o realiza, não motiva os universitários a se prepararem, abrindo brechas para os frequentes boicotes promovidos por estudantes descontentes com o curso.
Analistas defendem que o exame precisa se aproximar daquilo que se tornou o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que deixou de ser um mero instrumento avaliativo, cujo resultado era útil apenas aos gestores educacionais, para se transformar numa forma de acesso a variados benefícios sociais. "O modelo atual gera descompromisso com o Enade. É preciso conferir maior responsabilidade aos estudantes", diz Ronaldo Mota.
Além de não resultar em nenhum ganho concreto ao aluno, o Enade também não impõe consequências a quem faz a prova com displicência, ou a boicota. Sobre esse aspecto, André Gontijo sugere um aperfeiçoamento. "Será que, como componente curricular obrigatório, não seria interessante colocar a nota do Enade no histórico do aluno?"
Outro ponto considerado falho na sua aplicação é o fato de o exame ser feito por amostragem, e não estendido a todos os estudantes. Segundo Mota, na época da estruturação do Enade, essa opção foi feita para evitar altos custos. Hoje, no entanto, com a disponibilidade de recursos digitais mais desenvolvidos, a universalização seria mais simples e barata. "Hoje você pode fazer autenticação digital. Há várias maneiras de saber se foi o aluno mesmo quem deu determinadas respostas, tudo via computador", explica.