O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu, nesta quinta-feira (8), que decretos estaduais e municipais podem proibir a realização de missas, cultos e demais celebrações religiosas presenciais durante a pandemia. O caso concreto analisado era o do Decreto 65.563/2021 do estado de São Paulo. A ação foi ajuizada pelo Partido Social Democrático (PSD). O placar do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 811 foi de 9 a 2 pela constitucionalidade do decreto.
Nove ministros consideraram que a restrição temporária estabelecida à liberdade religiosa é constitucional e necessária para garantir o direito à saúde e à vida na pandemia. São eles: Gilmar Mendes, relator da ADPF, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Luiz Fux. Na visão deles, a liberdade de culto não esteve em discussão na ADPF 811, já que é garantida pela Constituição. O que se discutiu, segundo eles, foi a constitucionalidade do decreto paulista que determina a proibição da presença dos fiéis nas igrejas e demais locais de culto em razão da necessidade de se coibir aglomerações.
Kassio Nunes Marques abriu divergência de Mendes. Ele defendeu a inconstitucionalidade do trecho do Decreto 65.563/2021 do estado de São Paulo que proíbe cerimônias coletivas presenciais por ferir, no seu entendimento, o direito à liberdade religiosa, previsto no inciso 6º do artigo 5º da Constituição Federal. O ministro Dias Toffoli seguiu o voto de Nunes Marques.
Na quarta-feira (7), Mendes sustentou a tese de que a Constituição só defende o direito à liberdade religiosa como algo absoluto quando trata da dimensão interna da pessoa – o que envolve, por exemplo, a proibição de coagir qualquer pessoa a rejeitar ou aderir a alguma religião. De acordo com ele, não fosse pelos decretos, “o nosso quadro sanitário estaria, muito provavelmente, ainda pior do que se encontra”, e que “um aprendizado que nós temos no Brasil” é que “as situações trágicas ou graves ainda podem piorar”.
Nunes Marques defende que fiéis possam frequentar cultos e missas, mas com restrições
Ao discordar de Gilmar Mendes, o ministro Nunes Marques salientou que é contra o fechamento total das igrejas e demais locais de culto, sempre que sejam seguidos os protocolos rígidos de proteção para evitar a disseminação do coronavírus. A sugestão dele foi a de limitar a 25% a capacidade de público das igrejas. Além disso, ele reforçou a obrigatoriedade do uso de máscara, disponibilização de álcool em gel e distanciamento social.
Nunes Marques afirmou que não foi por causa das celebrações religiosas que a pandemia ganhou força no Brasil e destacou que a possibilidade de ir à igreja nesse momento representa alento espiritual aos fiéis.
Ele citou ainda outra ação, a ADPF 701, na qual concedeu liminar para permitir as celebrações religiosas presenciais, com protocolos de segurança sanitária, medida criticada por outros ministros da Corte. Em sua defesa, ele disse que não mandou abrir as igrejas, mas que garantiu que elas não fechassem. Nunes Marques reclamou ainda da repercussão negativa de seu voto e de ter sido chamado de “negacionista” e “genocida”.
O posicionamento dele foi seguido por Dias Toffoli. O ministro limitou-se a concordar com o voto de Nunes Marques, mas não apresentou considerações durante o julgamento.
Defesa do direito à saúde
Moraes, Fachin, Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Lewandowski, Mello e Fux apresentaram argumentos para defender que as restrições impostas no decreto de São Paulo - e nos demais publicados em unidades da federação - são temporárias, constitucionais e que não configuram ataques à liberdade religiosa. Os decretos, segundo eles, foram adotados para garantir o direito à saúde e o direito à vida.
Para eles, impedir que os fiéis compareçam às igrejas neste momento é uma forma de evitar aglomerações. Eles se solidarizaram com familiares das vítimas da pandemia, com profissionais de saúde e ainda com os jornalistas que cobrem os acontecimentos e desdobramentos da Covid-19.
As opiniões dos nove ministros foram no sentido de que as restrições não foram impostas somente às igrejas, mas também ao comércio, às escolas, à presença nos estádios, entre outros setores.
Moraes disse que os decretos reconhecem os interesses locais e a situação pandêmica de cada localidade, mas reforçou que isso não exime a União de liderar os esforços para combater o coronavírus.
Já Fachin ressaltou que o elevado ônus de impor uma temporária e excepcional restrição à liberdade religiosa é necessária diante da situação da pandemia no país.
Além deles, Barroso afirmou que nutre profundo respeito ao sentimento religioso da maioria da população brasileira, mas alegou que fé e ciência têm interesses diferentes neste momento.
A ministra Rosa Weber destacou que o Brasil é o epicentro da pandemia atualmente e, diante da incontestável gravidade da doença no Brasil, as restrições impostas pelos decretos são necessárias.
Cármen Lúcia reforçou que os decretos não discutem o direito à liberdade religiosa, mas apenas impõem restrições aos cultos diante da transmissibilidade do vírus.
Já Lewandowski ressaltou que as aglomerações não são recomendadas e afirmou que os fiéis neste momento devem fazer suas práticas religiosas em suas casas e podem acompanhar as celebrações pela internet e pelos meios de comunicação. O mesmo argumento sobre rezar em casa foi apresentado por Marco Aurélio de Mello.
Luiz Fux, presidente do Supremo, foi o último a votar e afirmou que o momento vivido é excepcional e, diante da aceleração da pandemia, os decretos se justificam. Ele também mencionou que celebrações religiosas coletivas podem contribuir para a disseminação do vírus. Ao se posicionar como um homem de fé, Fux salientou que a fé é importante para encarar esse momento, porém, não se pode deixar de levar em conta as recomendações de cientistas sobre a importância de se evitar aglomerações.
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