O Supremo Tribunal Federal derrubou nesta terça-feira (6) decisão do presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que suspendia o fornecimento da chamada “fosfoetanolamina sintética” a pacientes com câncer. Produzida pela Universidade de São Paulo (USP), a substância tem demonstrado resultados positivos na contenção e redução de tumores, mas não apresenta registros no Ministério da Saúde nem na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). No fim de setembro, por solicitação da USP, o desembargador do TJ-SP José Renato Nalini havia derrubado antecipações de tutela que permitiam a distribuição da medicação a centenas de pacientes, com o argumento de que não existem provas da eficácia da fosfoetanolamina em seres humanos.
Situação dos pacientes justifica flexibilização da norma, diz advogado
Para o advogado Robson Zanetti, que representa Roberto Zanetti, a situação excepcional em que se encontram os pacientes que recorrem à Justiça justifica a oferta da substância mesmo sem a existência de testes controlados em seres humanos. “Para a maioria dessas pessoas os médicos já não deram nenhuma esperança de vida. A Justiça havia colocado uma formalidade na frente da vida das pessoas”, afirma.
A fosfoetanolamina funciona como um marcador de células cancerosas. Produzida naturalmente pelo nosso organismo, ela tem papel importante no metabolismo celular, agindo no transporte de ácido graxo para a mitocôndria – estrutura da célula que tem o papel de produzir energia. Quando o ácido graxo entra na célula cancerosa, ele obriga a mitocôndria, até então parada, a trabalhar, denunciando para o sistema imunológico que ali existe uma célula irregular.
O comprimido da substância, que custa cerca de R$ 0,10, chegou a ser distribuído gratuitamente pelo professor aposentado Gilberto Orivaldo Chierice, responsável pelas pesquisas e ligado ao Grupo de Química Analítica e Tecnologia de Polímeros da USP. Em 2014, porém, uma portaria do Instituto de Química de São Carlos acabou proibindo essa distribuição.
A decisão de liberar novamente a medicação foi tomada pelo ministro Luiz Edson Fachin, que concedeu liminar a pedido de uma paciente em estado terminal. O parecer tem repercussão geral, o que significa que a decisão deve ser estendida a casos idênticos. A notícia reanimou o paranaense Roberto Zanetti, que já havia conseguido na Justiça o direito ao medicamento experimental. Diagnosticado com câncer de fígado em maio deste ano, Roberto conta que participa de grupos na internet formados por pessoas que tiveram melhoras significativas, comprovadas com exames, após o uso da substância.
Morador de Joinville (SC), Orlando José Souza Neves, de 50 anos, é um desses pacientes. Há onze meses ele descobriu três nódulos no fígado e recebeu indicação de quimioterapia. Contrário ao tratamento convencional, decidiu esperar pelo pior. Foi quando recebeu do filho 60 comprimidos de fosfoetanolamina e começou a tomar três deles por dia. Após cinco meses, uma tomografia apontou que dois nódulos haviam sumido. Nesta quarta-feira (7), ele passou por uma nova consulta e o oncologista constatou que o terceiro nódulo parou de crescer. “O médico ficou admirado com a reação da medicação, porque ele havia visto os exames que eu tinha feito antes”, diz.
A fosfoetanolamina é produzida pelo Instituto de Química do campus São Carlos da USP, que tem recebido centenas de pessoas em busca do tratamento. Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da USP disse que a universidade não iria se manifestar. Em esclarecimento publicado em seu site, o Instituto de Química afirma que a substância foi estudada de forma independente pelo professor Gilberto Orivaldo Chierice, já aposentado. As pesquisas envolveram a síntese da substância e contaram com a participação de pessoas sem vínculo com a Universidade de São Paulo. Ainda conforme o esclarecimento, o instituto está produzindo e fornecendo a fosfoetanolamina em caráter excepcional, em atendimento a demandas judiciais individuais, e não dispõe de médico para orientar sobre a utilização da substância.
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