O Supremo Tribunal Federal (STF) deve reiniciar, no dia 29, o julgamento de uma ação que pede a autorização do uso de banheiros de acordo com o gênero com o qual um indivíduo se identifica, reivindicação de pessoas trans. Se acatada, a decisão deve valer para banheiros de espaços públicos ou privados e colocar mulheres e crianças em situações de vulnerabilidade, como apontam coletivos feministas e ONGs de proteção à Primeira Infância.
A decisão da Corte ainda deve gerar uma tese de repercussão geral para estabelecer um padrão do que deve ser aplicado em processos judiciais semelhantes. “Os transexuais têm direito a serem tratados socialmente de acordo com a sua identidade de gênero, inclusive na utilização de banheiros de acesso público” é a tese sugerida por Luís Roberto Barroso, presidente da Corte e relator do recurso.
“Na prática, todos os banheiros públicos – aqui entram rodoviárias, centros comerciais, escolas infantis, praças públicas, universidades – deverão aceitar a autoidentificação de gênero como parâmetro para os banheiros. Será o fim dos banheiros femininos. Todo banheiro feminino será um banheiro unissex”, afirmou uma nota da Associação Mulheres Associadas, Mães e trabalhadoras do Brasil (Matria).
O caso em análise é de uma transexual que foi impedida de entrar no banheiro feminino de um shopping de Santa Catarina. Segundo a autora, ela teria sido abordada de forma vexatória por um segurança do estabelecimento, que teria sido o responsável pela proibição. Julgada pelas instâncias inferiores, a ação chegou ao STF depois da apresentação de um recurso extraordinário (RE 845.779).
Além de Barroso, o ministro Edson Fachin já apresentou voto favorável, o que mantém o placar de 2 x 0. O julgamento voltou a pauta depois de ter ficado suspenso por mais de 7 anos, quando o ministro Luiz Fux pediu vistas. Durante o período, houve até pressão de ONGs, através da campanha “Libera o meu xixi, STF”, para dar continuidade ao processo.
Violência em banheiros deve aumentar, dizem feministas
ONGs feministas se movimentam para tentar convencer o STF a não liberar banheiros femininos para pessoas trans. Em todo o mundo, não são raros os casos em que homens aproveitam banheiros unissex para cometer crimes, o que prejudica as mulheres socialmente em vários campos, como o afastamento de meninas das escolas por falta de segurança.
No Brasil, não faltam ocorrências nesse sentido.
Em junho de 2023, um aluno da Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo, foi detido após ser flagrado na tentativa de filmar as partes íntimas de uma menina que usava a cabine ao lado. O caso aconteceu em um banheiro unissex que havia na universidade, chamado de “Para todos”.
O flagrante se deu depois que uma amiga que aguardava a vítima do lado de fora viu a movimentação do rapaz ao passar o celular por baixo da cabine. No aparelho do garoto foram encontrados vídeos de outras 15 mulheres, segundo informações da TV Globo.
Outro caso de violência relacionado ao uso de banheiros aconteceu na Universidade de Brasília. Uma pessoa de biotipo masculino ameaçou e agrediu verbalmente uma jovem que tentou impedi-lo de usar o banheiro feminino do restaurante universitário do campus e a chamou por um pronome masculino. No Paraná, uma pessoa trans também agrediu alunas após reclamação sobre o uso do banheiro feminino.
“O fato da pessoa do sexo masculino se identificar como mulher não deixa as mulheres menos vulneráveis. Os dados oficiais do Ministério de Justiça do Reino Unido (MOJ) nos mostram isso ao expor que mais de 70% dos presos que se declaram mulheres trans ou travestis estão cumprindo pena por crimes sexuais e violentos. Como as mulheres vão saber quem é mulher trans, quem é predador sexual se aproveitando das brechas da lei ou ambos?”, questiona o coletivo Raízes Feministas Brasil. Junto com outros grupos, o coletivo tem se organizado na tentativa de impedir o avanço da ação no STF.
Segundo a Frente Ampla pela Proteção dos Espaços de Mulheres e Crianças, a organização tem recebido diversos relatos de problemas em banheiros frequentados por pessoas trans através das redes sociais. Como é o caso da mãe de uma menina de 13 anos que relatou que a filha não quer mais usar o banheiro na escola pois uma colega transexual tem usado a instalação destinada a mulheres com a autorização da instituição.
Barroso cita “algum desconforto” de mulheres em seu voto
Nas anotações distribuídas pelo STF sobre os fundamentos do voto do ministro Barroso, aparecem considerações sobre o direito de privacidade das mulheres, submetendo-as à posição do movimento trans. “Note-se que o suposto constrangimento às demais mulheres seria limitado, tendo em vista que as situações mais íntimas ocorrem em cabines privativas, de acesso reservado a uma única pessoa”, diz o documento.
“De todo modo”, continua, “a mera presença de transexual feminina em áreas comuns de banheiro feminino, ainda que gere algum desconforto, não é comparável àquele suportado pela transexual em um banheiro masculino. Pedindo licença às pessoas por citar os seus nomes e condição, imagine-se o grau de desconforto que sentiriam, por exemplo, Roberta Close ou Rogéria se fossem obrigadas a utilizar um banheiro masculino”.
Maiara Silveira, diretora da Frente Ampla pela Proteção dos Espaços de Mulheres e Crianças, lamenta esses argumentos.
“Tratar a invasão da vida íntima de mulheres e crianças como um ‘pequeno sentimento de desconforto’ é um resumo de como a sociedade trata mulheres e crianças. Obrigar mulheres a dividir banheiros com pessoas do sexo masculino. Independentemente de como se sintam ou se vistam é violento e as desumaniza”, diz Silveira.
“Somos desde cedo ensinadas, com razão, a nos proteger de homens, a detectar os riscos que sua presença em nossos espaços traz, e temos inúmeras campanhas de combate à violência contra a mulher que dizem ‘não se cale, denuncie’. Mas, se esse homem se diz mulher, nós temos que nos calar, e nosso senso de proteção é rotulado de ‘desconforto’, ‘exagero’ ou ‘pânico moral’”, rebate a nota da Matria.
Entidades de proteção aos direitos das crianças também apontam riscos
Luciana Haas, presidente da Associação Guardiões da Infância e da Juventude, acredita que o tema tem sido tratado de forma simplista, com riscos iminentes. “Quando há um movimento que propõe uma mudança profunda, mas que se desvia de um debate social amplo, debate esse com apresentação do contraditório em diversos âmbitos da sociedade, temos um sinal claro de que a sociedade foi sequestrada por um pequeno grupo de pessoas, que visa impor uma agenda de poder”, reforça Haas.
“É um tema que não foi discutido pela sociedade e não nos parece razoável, para se atender o pedido de uma pequena minoria, deixar a grande maioria das pessoas possivelmente constrangidas, inclusive, colocando nossas crianças em risco”, ressalta Cláudia Diniz, uma das fundadoras do Movimento Mães Direita. O grupo também se posiciona contrariamente ao avanço da ação.
Maiara Silveira apresentou uma sugestão para a criação de um projeto de lei que utilize o sexo do nascimento como único critério para a designação de banheiros. A proposta, enviada através do Portal E-Cidadania, recebeu o apoiamento de mais de 20 mil pessoas e deve ser analisada pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal. O próximo passo é a designação de relator, que será definido pelo senador Paulo Paim (PT-RS), presidente da comissão.
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