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Descriminalização da maconha

STF assume papel do Congresso ao definir o que é ou não crime, dizem juristas

STF decide por descriminalização do porte de maconha
O Supremo Tribunal Federal (STF) ultrapassou suas competências ao decidir que o porte de maconha para consumo pessoal não será mais considerado crime, segundo juristas (Foto: Andressa Anholete/STF)

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O Supremo Tribunal Federal (STF) ultrapassou suas competências ao decidir que o porte de maconha para consumo pessoal não será mais considerado crime. Por maioria de 8 a 3, os ministros decidiram pela inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, que criminaliza o porte de drogas, em um julgamento que continua nesta quarta-feira (26). Juristas ouvidos pela Gazeta do Povo argumentam que a Corte deveria se restringir a analisar situações de dispositivos claramente inconstitucionais, o que não se aplica neste caso.

O STF também possui competência para interpretar dispositivos legais quando o texto não é claro o suficiente, mas essa não foi a motivação desta discussão entre os ministros. O artigo 28 da Lei de Drogas, sancionada em 2006 e considerada ainda recente, é explícito ao considerar crime o porte de substâncias ilícitas, estabelecendo como possíveis penas para esses casos a advertência sobre os efeitos das drogas, a prestação de serviços à comunidade ou outras medidas educativas.

Ao contrário do que algumas declarações dos ministros podem sugerir, a lei não prevê penas de reclusão ou detenção para usuários flagrados em circunstâncias que indicam que a droga seria usada para consumo próprio. O medo do mau uso do dispositivo poderia justificar a fixação de uma interpretação mais adequada, mas nunca a descriminalização do porte de drogas.

Diante da tipificação de conduta criminosa prevista pela lei, que passou pelo Legislativo e foi sancionada pelo Executivo, a decisão do STF ultrapassa os limites de sua competência.

STF não pode alterar entendimento de condutas criminalizadas no Direito Penal

A doutora em Teoria Geral do Direito pela USP e professora de Direito Constitucional Ana Luiza Rodrigues Braga destaca que o Direito Penal existe para tutelar os valores sociais mais importantes para a sociedade. Por isso, essa área do Direito é considerada uma ultima ratio, no sentindo que a aplicação da pena acontece em último caso e se restringe a condutas que tenham um impacto social relevante.

“Se o Congresso Nacional entendeu que o porte de maconha para consumo pessoal é uma conduta que merece reprovação pelo Direito Penal, o STF não pode descriminalizá-la porque foi uma escolha do legislador em face dos bens sociais que para ele são importantes”, explica Braga.

Para a professora, as sanções previstas para o crime de porte de substâncias ilícitas na Lei de Drogas não podem ser consideradas inconstitucionais pela Suprema Corte, justamente porque refletem a visão geral da sociedade sobre o assunto. De maneira geral, a sociedade tende a não achar que uma pessoa que consome maconha deva ser presa.

“O legislador buscou um equilíbrio entre a sanção e o desvalor social. Mesmo assim, ele quis deixar claro que essa não é uma conduta socialmente aceitável no nosso país e, por isso, ela merece tutela do Direito Penal”, reforça Braga.

STF decidir sobre limite de quantidade de drogas é aberração, diz jurista 

“O STF deveria servir para expurgar do ordenamento jurídico brasileiro aquelas normas que são claramente inconstitucionais. Mas nunca descer às minúcias de legislar, por exemplo, sobre a quantidade de droga que um indivíduo deve portar para ser considerado traficante ou usuário. É aberrante a ação do STF nesse caso”, analisa Alessandro Chiarottino, doutor em Direito Constitucional pela USP.

A Lei de Drogas prevê que, para determinar se a droga se destinava ao consumo pessoal, o juiz deve avaliar questões como a conduta, os antecedentes e a quantidade de droga apreendida. Por exemplo, o suspeito poderia ser enquadrado por tráfico, se, apesar da pequena quantidade de drogas, portar itens como balança de precisão e embalagens ou ter uma extensa ficha criminal.

“Existem várias questões circunstanciais de política criminal que dependem da análise de caso e de como ele se apresenta na prática. Então, não é que o legislador foi omisso. É que ele entendeu que esta foi a melhor forma de se posicionar sobre essa questão”, aponta Braga.

Durante o julgamento, houve grandes divergências entre os ministros sobre a quantidade máxima de maconha que diferenciaria o porte da substância com o crime de tráfico. Sem o estabelecimento de critérios objetivos por parte dos ministros para definir a quantidade, os valores discutidos foram de 10 a 100 gramas. Até o momento, a Corte não definiu qual será a quantidade estabelecida.

“São os órgãos Legislativo e Executivo que têm a legitimidade, que é dada pela eleição, para decidir sobre questões desse tipo. Até porque é necessário fazer uma análise técnica baseada no que ocorre na prática policial para determinar como fazer essa diferenciação entre o traficante e o usuário”, finaliza Chiarottino.

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