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O ministro Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), retirou da pauta de julgamento do dia 11 de novembro a ação do PSOL que pretende impor a ideologia de gênero às escolas. Impetrada pelo PSOL, a ADI 5.668 quer, entre outras coisas, uso do nome social, aprovação do namoro entre menores de idade do mesmo sexo, aulas sobre teorias de gênero, etc. A decisão ocorreu depois que Fux recebeu deputados da Frente Parlamentar Católica, da Frente Parlamentar Evangélica e representantes da Anajure, amicus curiae no processo. Leia aqui a íntegra da petição inicial do PSOL.
A ação direta de inconstitucionalidade foi ajuizada pelo partido em 2017, após várias tentativas de incluir menções às palavras “gênero”, “identidade de gênero” e “orientação sexual” tanto no Plano Nacional de Educação (Lei 13.005), que foi aprovado pelo Congresso Nacional em 2014, quanto em planos de educação estaduais e municipais, que foram discutidos em 2015. O PSOL também reclama da ausência do tema na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), homologada em 2017. Em sua reunião com Fux, os deputados afirmaram que o assunto já havia sido amplamente discutido pelo Congresso nessas votações e, portanto, não teria sentido um novo debate do tema fora do Poder Legislativo. O adiamento, porém, não impede que a ação seja julgada no futuro pelo tribunal.
PSOL nega imposição de ideologia de gênero
O PSOL, por meio de sua assessoria de imprensa, enviou uma nota à Gazeta do Povo negando a intenção de impor "ideologia de gênero" às escolas. O partido argumenta que "A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5668, à qual o texto se refere, não tem qualquer relação com 'ideologia de gênero'", e convida à leitura da petição inicial. Segundo o partido, apenas há o pedido "que seja contemplada, no Plano Nacional de Educação (aprovado pela Lei 13.005/2014), a prevenção e proibição do bullying homofóbico. Inúmeros trechos do documento deixam essa informação bem clara".
A ideologia de gênero - assim chamada por não ter comprovação científica - defende que ninguém nasce homem ou mulher, mas que cada indivíduo deve construir sua própria identidade, isto é, o seu gênero ao longo da vida. Por isso, ativistas LGBT insistem que os pais devem permitir que as crianças decidam sobre o próprio gênero. Na verdade, as pesquisas sobre disforia de gênero em crianças mostram como a veiculação dessa ideologia é prejudicial às crianças. Estudos como o do American College of Pediatricians, publicado com exclusividade pela Gazeta do Povo, concluem pela falta de evidências sólidas para estimular a mudança de sexo entre crianças, o que pode fomentar tratamentos invasivos, precoces e irreversíveis que produzem graves efeitos físicos e psicológicos.
Coibição de bullying já é prevista em lei
Quanto à justificativa apresentada pelo PSOL para a ação, impedir bullying contra crianças transgênero nas escolas, o advogado especialista em Direito Constitucional, Acácio Miranda, explica que a coibição de bullying, violências e discriminações é algo que já faz parte das atribuições das instituições de ensino e está previsto tanto constitucionalmente quanto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), e, portanto, a ação não teria nenhum efeito prático.
“Faz parte da estruturação do nosso sistema educacional ensinar as crianças a respeitarem as diferenças e a conviverem com elas. O bullying é algo que também cada vez mais tem sido debatido. A ADI proposta vem ampliar essa discussão, mas acho que estão discutindo algo que já está consagrado na Constituição e na LDB”, observa.
Por outro lado, o professor de Direito Constitucional e procurador do Ministério Público Federal André Borges Uliano, afirmou que caso a ação fosse julgada como procedente, o efeito seria gerar uma “blindagem” para permitir abordagens mais incisivas relacionadas à ideologia de gênero, com conteúdos que não são adequados para crianças em idade escolar.
“Em nome das questões de gênero pode-se, por exemplo, explicar para as crianças que sexualidade é algo totalmente fluido e que elas podem ser meninos ou meninas a todo tempo. Todo tipo de conteúdo e de abordagem sobre desconstrução do sexo biológico vai poder ser passado para as crianças em nome da coibição do bullying”, salienta Uliano.
Na avaliação do professor de Direito Constitucional e doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (SP), Antônio Jorge Pereira Júnior, uma consequência de eventual julgamento da ação como procedente poderia significar antecipar determinados assuntos relacionados à sexualidade para o universo infantojuvenil. “Estamos mexendo com o imaginário, com a dimensão psíquica das crianças. Ao trabalhar questões de gênero para esse público, pode haver antecipação de experiências, tornando as crianças familiarizadas com temáticas que escapam às suas necessidades pedagógicas”, declara.
O professor também reforça que já há preocupação das escolas quanto a combater ações relacionadas a bullying e previsões pedagógicas e legais relacionadas à valorização de aspectos como solidariedade e respeito a todas as pessoas. Pereira Júnior também questiona se os docentes estariam preparados para abordar questões tão sensíveis em sala de aula. “Qual seria a formação adequada para que o professor possa dar aulas de questões de gênero? Nessa lacuna podem entrar manipulações diversas, ainda mais em grupos vulneráveis como as crianças”.
Reivindicações contrariam vontade majoritária da população, apontam juristas
Os juristas consultados pela Gazeta do Povo também destacam que as reivindicações formalizadas na ADI 5.668 seriam antidemocráticas, uma vez que vão contra a vontade da maioria da população. A manifestação dos parlamentares ao definir o plano de educação a nível federal, que se seguiu nos níveis inferiores – nos estados e municípios –, é reflexo do efeito de representatividade dos parlamentos.
“Nosso sistema de representantes é um sistema proporcional para que todos os vieses ideológicos sejam contemplados. Mas, independentemente dos vieses contemplados, a maioria deve prevalecer, ainda que a opção dessa maioria possa ser discutível em algumas circunstâncias”, destaca Acácio Miranda.
Uliano reforça que a não obrigatoriedade da abordagem de questões de gênero nas escolas tem respaldo democrático.
“Recordo que, em 2015, na elaboração dos planos municipais de educação pais e mães de alunos se dirigiram massivamente às câmaras de vereadores para reivindicar que não desejavam que fossem abordados conteúdos relacionados à ideologia de gênero nas escolas, considerando-os inapropriados para as crianças. A sociedade se mobilizou e os parlamentos acataram, por isso essas decisões têm intensa legitimidade”, afirma.
Para reforçar o aspecto democrático relacionado ao tema, Uliano cita uma pesquisa realizada em 2017 pelo Paraná Pesquisas, que revelou que 87% dos brasileiros são contrários à ideologia de gênero nas escolas. Na ocasião, foi feita a seguinte pergunta a 2.365 pessoas de todas as unidades da federação: “A teoria de que uma pessoa pode escolher o próprio gênero deve fazer parte do currículo escolar?". Entre todos os participantes, apenas 8,6% responderam positivamente à pergunta.
Ao contrário do que diz a primeira versão dessa matéria, o PSOL não requer diretamente a implantação de "banheiros comuns", ainda que defenda no corpo da petição inicial o uso de banheiros de acordo com o gênero com o qual a criança se identifica. O partido cita a questão dos banheiros, no apartado "3.1. Dos Fatos e do Direito", da petição inicial. Segundo o partido: "Crianças e adolescentes travestis e transexuais se veem sem alternativa a não ser abandonar as escolas em razão do profundo desrespeito à sua identidade de gênero (não permissão de se vestirem de acordo com o gênero com o qual se identificam, uso do banheiro de acordo com este etc). É indescritível o sofrimento que travestis e transexuais experimentam quando lhes é imposto viver de acordo com um gênero incompatível com sua identidade de gênero, donde este desrespeito acaba sendo o grande responsável por sua evasão escolar". O texto também acrescenta a manifestação do PSOL sobre o tema.
Corrigido em 24/11/2020 às 12:06