O Supremo Tribunal Federal (STF) deve retomar nesta quarta-feira (6) o julgamento de uma lei de Uberlândia (MG), publicada em 2022, que proíbe a vacinação compulsória e a imposição de restrições a pessoas que não queiram se vacinar contra Covid-19 ou outras doenças. O assunto ficou quase um ano parado na Corte. Em 2023 chegou a ser analisado no sistema virtual, mas o ministro Kassio Nunes Marques pediu destaque, levando a discussão ao plenário físico.
De acordo com o texto da Lei 13.691, de autoria do vereador Cristiano Caporezzo (Patriota), nenhum gestor pode exigir um comprovante de vacinação aos servidores públicos e nenhuma pessoa deve ser impedida de frequentar locais públicos ou privados em Uberlândia, por se recusar a tomar qualquer vacina. O texto prevê multa de dez salários mínimos pelo descumprimento, cerca de R$ 14 mil.
Em fevereiro de 2022, dois dias depois de ser promulgada, a lei foi contestada no STF em uma ação movida pelo partido Rede Sustentabilidade. A alegação foi que a legislação contraria o entendimento do STF, durante a pandemia da Covid-19, em 2020, que considerou constitucional a vacinação compulsória e a imposição de medidas restritivas a quem se recusasse à imunização.
Dois meses depois, o relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, suspendeu a lei de Uberlândia após um pedido de liminar. O magistrado argumentou que sanções indiretas, como a restrição à circulação em locais públicos, podem ser adotadas para proteger a coletividade, e que matérias relacionadas à proteção da saúde devem seguir os princípios de precaução e prevenção, citando a jurisprudência do Supremo e o artigo 196 da Constituição Federal. Afirmou ainda que, em caso de dúvida, devem ser adotadas medidas mais conservadoras, para evitar danos.
O julgamento, levado ao plenário físico, anula os pareceres computados na sessão virtual, onde não houve discussão, mas apenas a apresentação de votos. Os ministros Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes, que haviam acompanhado o relator, devem votar novamente. Rosa Weber, aposentada no tribunal, terá sua posição mantida, conforme prevê o regimento da Corte.
Tese fixada em 2020 condicionava obrigatoriedade de vacinas à existência de evidências científicas
Em dezembro de 2020, no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6586 e 6587, o STF decidiu que estados e municípios podem determinar que qualquer vacinação seja obrigatória, desde que não sejam utilizadas medidas invasivas e coercitivas para imunizar a população. O caráter compulsório da vacina pode ser exigido por meio de medidas indiretas, como a restrição ao exercício de determinadas atividades ou de acesso a determinados locais.
A tese fixada, proposta pelo ministro Ricardo Lewandowki, condicionava a obrigatoriedade das vacinas à existência de evidências científicas; ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes, além de outros critérios, como razoabilidade e proporcionalidade.
O professor de Direito Constitucional, Doutor em Ciências Jurídicas pela UFSC, João Luiz Esteves, frisa que a Corte insistiu em que a vacinação não poderia ser forçada, apesar de determinar a possibilidade de restrição de direitos aos que não queiram receber os imunizantes. Ao mesmo tempo, lembra da necessidade imposta pelo próprio STF da necessidade de evidências científicas quanto à eficácia e segurança da vacinação.
“É de carácter lógico que uma lei não pode proibir tal exigência, se também não tiver evidência científica. Então, a base científica será, com certeza, a tônica da decisão do STF neste julgamento do dia seis de novembro”, explicou o professor.
Um aspecto formal que deverá ser levado em conta no julgamento é se o município teria competência para legislar sobre o assunto. No julgamento das ADIs, em 2020, os ministros lembraram que o tema deve ser alvo de decisão conjunta de União, Estados e municípios.
A decisão do julgamento da lei de Uberlândia, segundo Esteves, deve valer para outros casos similares, já que o tema está sendo avaliado por meio de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). “Em ações assim, o STF tem por objeto evitar ou reparar uma possível lesão a um preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público. A decisão terá eficácia contra todos os casos semelhantes e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Público”, concluiu.
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