Cronologia
Recorde a evolução dos investimentos do Ministério da Saúde em células-tronco:
2004 Apoia um estudo de terapia celular voltado a pacientes cardíacos que é considerado, na ocasião, a maior pesquisa mundial na área.
2005 Lança edital, em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que fomenta 45 pesquisas em terapia celular para doenças que impactam no SUS. No mesmo ano, é aprovada a Lei de Biossegurança, que autoriza a utilização de células-tronco embrionárias.
2008 Incorpora os centros de terapia celular, que passam a integrar a Rede Nacional de Terapia Celular (RNTC), constituída por 52 grupos de pesquisadores.
2009 Cria o programa binacional de terapia celular Brasil/Argentina, que apoia o financiamento de oito pesquisas em terapia celular.
2012 Anuncia investimento de R$ 15 milhões para alavancar a pesquisa e produção de células-tronco.
Entrevista
"O maior avanço foi a liberação das pesquisas"
Lygia da Veiga Pereira, geneticista e coordenadora do laboratório nacional de células-tronco da Universidade de São Paulo (USP).
Os estudos com células-tronco já permitem incluí-las como tratamento para alguma doença?
Ainda não. Só podemos tratar com células-tronco o transplante de medula óssea, o que é feito há anos. Todo o resto é experimental.
Nesses mais de dez anos de pesquisa com células-tronco, onde houve avanço e onde houve retrocesso?
O maior avanço foi a liberação das pesquisas com células-tronco embrionárias em modelos animais, que foi um marco na medicina. Mas não vejo retrocesso, pois avançamos mesmo quando uma pesquisa não funciona bem. Como, por exemplo, com os resultados da primeira leva de células-tronco, que vieram da medula óssea para tratar doenças cardíacas e foram decepcionantes. Ali aprendemos que deveríamos tentar com células mais eficientes.
Isso quer dizer que não há possibilidade de tratar pacientes cardíacos com células-tronco no futuro?
Há grupos trabalhando com células-tronco cardíacas, que já estão no músculo cardíaco e podem se multiplicar e se reinventar. Há notícias dessas pesquisas nos EUA e no Japão e os primeiros resultados foram animadores.
As verbas destinadas pelo governo federal são suficientes para manter as pesquisas já existentes no país e ampliá-las nos próximos anos?
Esse anúncio do Ministério da Saúde [investimento de R$ 15 milhões] mostra que essa gestão [da presidenta Dilma Rousseff] tem o compromisso com a continuidade e não jogará fora o que já foi feito. Havia um receio da comunidade científica em relação a essa continuidade, porque investimento em pesquisa é investimento de longo prazo.
Qual o papel do Brasil no cenário mundial de pesquisas com células-tronco?
Ainda temos um papel tímido e pequeno nas pesquisas. Por outro lado, há interesse da Sociedade Internacional de Pesquisas com Células-tronco no Brasil, já que ela está copatrocinando o Congresso Brasileiro de Células-Tronco e Terapia Celular, que será em São Paulo neste ano.
Há notícias de clínicas em países como a China que vendem o tratamento com células-tronco como solução para algumas doenças. Como a comunidade científica internacional encara isso?
Isso é uma lastima e a comunidade científica repudia. Essas clínicas se valem do desespero dos pacientes, pois são várias as doenças para as quais as células-tronco são apenas promessas e as pessoas vendem tudo para pagar por um negócio clandestino. (RM)
Ainda restritas às pesquisas, as células-tronco podem entrar de vez no rol dos tratamentos clínicos financiados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Ministério da Saúde anunciou no mês passado que vai investir, apenas neste ano, R$ 15 milhões no setor. O recurso será destinado para editais de pesquisa e oito centros de terapia celular do país, incluindo o instalado na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), em Curitiba, considerado o mais avançado do país.
Esse incentivo é 50% maior do que a média recebida pelo setor nos últimos anos. De 2004 até 2011, o governo federal investiu cerca de R$ 80 milhões em pesquisas científicas e tecnológicas vinculadas à terapia celular. Segundo o Ministério da Saúde, o aporte financeiro tem o objetivo de ampliar o uso da medicina regenerativa em pacientes com problemas no coração, articulações ou esclerose múltipla.
Meta que Antônio Carlos de Carvalho, coordenador da Rede Nacional de Terapia Celular (RNTC), encara com otimismo. "A terapia celular entrará na prática clínica. Ainda faltam respostas, mas só as teremos com ensaios em seres humanos", afirma. Esse tipo de experimento já ocorre desde 2005 no Centro de Terapia Celular (CTC) da PUCPR.
Com a parte que lhe cabe no investimento federal, a PUCPR pretende iniciar a produção de células-tronco adultas destinadas à recuperação da cartilagem do joelho, desde que receba da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) a licença sanitária necessária para o procedimento. "Vamos ampliar nosso quadro para até 23 pesquisadores [hoje são 18] e comprar insumos. Estaremos prontos para fornecer as células-tronco em escala comercial", diz o médico Paulo Brofman, coordenador do CTC da PUCPR.
Apesar do investimento na regeneração muscular, é no coração que o laboratório mais se destaca. De acordo com Brofman, apenas um terço das pessoas atendidas ali sofrem de problemas musculares e o restante é todo de pacientes cardíacos, como o aposentado Silvio Cunha, 71 anos, que diz ter deixado de sentir dores no peito graças às células-tronco.
"Fiz a inserção das células-tronco após a terceira ponte de safena, há quase três anos. Mesmo depois das duas primeiras cirurgias, continuava sentindo dores e ia ao médico a cada dois meses. Agora, tenho uma vida normal", afirma Cunha, que recebeu nos vasos cardíacos células-tronco extraídas do tutano da sua medula óssea.
Cautela
O otimismo de Cunha, porém, tem de ser encarado com ressalvas. Pelo menos, é o que garante Lygia da Veiga Pereira, a primeira brasileira a conseguir extrair e multiplicar células-tronco de embriões congelados. "Ainda não é possível incluir células-tronco como tratamento. Com exceção do transplante de medula óssea que é feito há anos , o resto é tudo experimental", afirma a geneticista, que é coordenadora do laboratório nacional de células-tronco da Universidade de São Paulo (USP).
De três anos para cá, o CTC da PUCPR já submeteu mais de 100 pessoas a procedimentos clínicos com células-tronco. Como a terapia celular ainda não é regulamentada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), o seu uso é autorizado apenas no âmbito das pesquisas, com exceção às utilizadas para tratar leucemia e anemia. Procurado pela reportagem, o CFM não se pronunciou até o fechamento desta edição sobre a regulamentação do tratamento de dores no joelho com células-tronco.
Convênio reduz burocracia nos aeroportos
Além do investimento de R$ 15 milhões, o Ministério da Saúde anunciou uma parceria com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) para acabar com as dificuldades de importação de células-tronco quando o material de pesquisa chega aos aeroportos nacionais.
Desde o fim do ano passado, os aeroportos de Congonhas (SP), Tom Jobim (RJ) e Viracopos (Campinas) já contam com o CNPq Expresso, sistema criado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para reduzir o tempo de liberação de importação de insumos e equipamentos para pesquisa.
Com o sistema, cargas com material destinado à pesquisa recebem selo e fita, afixados pelo exportador. Com o material identificado, funcionários dos aeroportos têm de dar tratamento rápido e prioritário na liberação dos produtos.
Segundo a Anvisa, no aeroporto de Congonhas, o sistema conseguiu reduzir de 20 para cinco dias o tempo de liberação das importações destinadas à pesquisa.
No último dia 24, os aeroportos Afonso Pena, em São José dos Pinhais, e Salgado Filho, em Porto Alegre, também receberam o CNPq Expresso. O aeroporto Juscelino Kubistchek, em Brasília, já havia recebido o sistema uma semana antes. Até o fim deste semestre, os aeroportos de Cofins (MG), Recife (PE), Salvador (BA) e Fortaleza (CE) também serão inseridos no sistema.
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