Uma antiga reclamação do consumidor doméstico torna-se mais recorrente em meses quentes e secos, quando o uso racional da água passa a ser estimulado de maneira especial: "até economizo, mas a fatura permanece inalterada". Baseada em decreto estadual, a franquia de 10 metros cúbicos (m³), cobrada atualmente pela Sanepar, deve ser alvo de discussão nos próximos meses em Curitiba, quando o município reavaliará o contrato de prestação do serviço, válido até 2031. A tarifa de água é só um dos itens do contrato, cuja revisão está prevista entre as metas do Plano Municipal de Saneamento, aprovado em dezembro.
Especialistas ouvidos pela reportagem têm opiniões divergentes sobre a tarifa mínima de água. Embora todos concordem que uma remuneração do sistema é necessária, há quem defenda outro modelo de cobrança, de modo a desonerar o consumidor que tem economizado no dia a dia. É o que pensa o engenheiro civil Carlos Mello Garcias, professor de Engenharia Ambiental da PUCPR, para quem os grandes consumidores precisam arcar com o custo. "Essa é uma cobrança técnica, para viabilizar a instalação da rede, mas nada impede que o modelo seja discutido. Acredito que a medição deveria ser real: se gasto um litro, pago um litro."
O engenheiro civil e economista Rodolpho Ramina concorda que a cobrança dos 10 m³ é justa à medida que cobre, mesmo que simbolicamente, o custo de infraestrutura do sistema. Ainda assim, ele argumenta que o formato é discutível. Para Ramina, uma forma de fazer isso seria criar uma tarifa progressiva. "O valor unitário poderia crescer à medida que o consumo aumenta. No caso de empresas que precisam de grandes quantidades, isso poderia ser flexibilizado", opina.
A professora de Engenharia Ambiental da USP Monica Ferreira do Amaral Porto discorda. Ela explica que a tarifa mínima é baseada em um estudo estatístico do consumo médio que leva em conta a tarifa social. Uma família de quatro pessoas, com baixo consumo, gastaria, em média, 300 litros por dia, o que resulta nos 10 m³ mensais. "A possibilidade de se gastar menos que isso por mês é muito pequena. Sem contar que esse valor cobrado pelos primeiros 10 m³ é muito menor que nas outras faixas de consumo."
A especialista ressalta que o padrão normal das cidades brasileiras é que cada indivíduo de classe média consuma 250 litros de água por dia. Segundo Monica, é preciso que, ao olhar a fatura, o consumidor pense em termos de sociedade, não no individual.
Resposta
Em nota, a Sanepar disse que a tarifa que cobra leva em conta parâmetros de abastecimento e esgoto preconizados pela OMS e também considera a necessidade de se cobrir custos fixos para manter um serviço initerrupto.
Revisão
A diretora de recursos hídricos e saneamento da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Marlise Jorge, explica que o decreto estadual para formalizar uma comissão que discuta os itens do Plano Municipal de Saneamento deve sair nos próximos dois meses. A partir disso, o prazo para a revisão do contrato de concessão com a Sanepar é de dois meses. "Vamos sentar para conversar sobre vários assuntos. E a tarifa também entra nessa análise. Pode ser que saia uma nova metodologia de cálculo e mudanças na tarifa mínima, se a lei permitir. Pessoas da área jurídica vão analisar." A comissão será formada por poder público, sociedade civil e Sanepar.