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Saúde

Taxa para cesárea vira prática nos planos privados

O casal Silvana e Bruno pagou R$ 1 mil por uma cesariana, mas o médico não atendeu | André Rodrigues/ Gazeta do Povo
O casal Silvana e Bruno pagou R$ 1 mil por uma cesariana, mas o médico não atendeu (Foto: André Rodrigues/ Gazeta do Povo)

Um comportamento que está se tornando cada vez mais comum entre médicos obstetras tem gerado reclamação por parte de gestantes: a exigência de um pagamento extra para a mãe que queira fazer o parto cesariano com o mesmo profissional que a atendeu durante o pré-natal. De acordo com mulheres entrevistadas pela reportagem, a cobrança gira em torno de R$ 1 ,5 mil. Caso a gestante não aceite ou não possa pagar a taxa, o médico afirma que o parto será feito por um plantonista. Em muitos casos, a cobrança só é feita alguns dias antes do procedimento.

A discussão não é nova, mas antes se referia a uma cobrança extra apenas no caso de a mãe desejar o parto normal. Com o argumento de que os planos de saúde pagam valores irrisórios aos médicos, e de que um parto pode durar até 12 horas, o Conselho Federal de Medicina (CFM) autorizou a cobrança. Agora, a taxa vem aparecendo no caso das cesáreas, mesmo após o próprio CFM afirmar, em sua defesa na época, que a cobrança extra para partos normais incentivaria os médicos a fazer menos partos cirúrgicos. Atualmente, 80% dos procedimentos na rede privada de saúde são cesarianas, quando o recomendado pela OMS é uma média de 15%.

As gestantes precisam ficar atentas, pois a cobrança pega muitas de surpresa, em um momento delicado. Foi o que ocorreu com o casal Silvana e Bruno Gogolla, de Curitiba. Na penúltima consulta do pré-natal, o obstetra afirmou que, caso Silvana quisesse realizar a cesárea com ele, precisaria desembolsar R$ 1 mil. A cobrança era desconhecida pelo casal, pois nem o plano de saúde nem a clínica onde o médico atendia informaram sobre essa questão. O obstetra havia feito o parto das duas irmãs de Silvana e nunca cobrou pelo procedimento, daí o estranhamento dos dois.

Na consulta os dois disseram ao médico que pensariam a respeito, mas, como o bebê estava passando da hora de nascer, decidiram pagar. No dia em que as contrações começaram, dias antes de uma nova consulta, o casal tentou ligar para o médico, que não atendeu aos chamados. O parto de Enzo foi feito por uma médica de plantão. "Achamos um absurdo. Pagamos pelo plano de saúde e ainda temos de pagar uma taxa extra. Se o médico acha que ganha pouco, que discuta isso com o plano, não é justo que a mulher saia prejudicada", diz Silvana.

Outro ladoPara CRM, planos só garantem atendimento por plantonistas

O secretário-geral do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR), o médico ginecologista e obstetra Helcio Bertolozzi Soares afirma que a cobrança não é antiética porque o serviço do médico estabelecido em contrato com as cooperativas de saúde envolvem apenas o acompanhamento pré-natal e após o parto, e que, no caso do parto, o plano estabelece contrato com hospitais e maternidades que garantem o atendimento por um médico plantonista.

Soares, no entanto, afirma que é antiético o médico avisar a paciente em cima da hora. "Isso tem de ser feito na primeira consulta. E se ela não aceitar, isso não deve ser empecilho para que ele continue a fazer o acompanhamento. O que é antiético é haver dupla cobrança, como o médico receber da paciente e do plano", afirma.

Os valores pagos pelos planos são, segundo Soares, o motivo desta cobrança. "Há médicos que aceitam fazer pelo plano ou nem cobram pelo parto. Eu, por exemplo, não cobro a taxa, principalmente se a paciente é de risco. Não gostaria de deixá-la nas mãos de outro colega que não está tão a par da situação, mas esse é o meu caso. Outros colegas simplesmente não podem fazer isso." Atualmente, de acordo com o diretor do CRM-PR, o médico recebe em média R$ 300 para um parto de usuária de enfermaria, e o dobro no caso de pacientes com acomodação particular.

Cobrança é irregular, diz ANS

De acordo com a Agência Nacional de Saúde Su­­­­­ple­­­­mentar (ANS), que regula os planos de saúde no Brasil, a cobrança da taxa adicional de cesárea é uma conduta irregular e a gestante que deparar com essa situação deverá denunciar o médico e o plano de saúde ao órgão. A ANS afirma que descredenciará os médicos e imporá multas aos planos. O órgão não tem um balanço sobre quais e quantos foram os planos e profissionais punidos até hoje.

A orientação dos planos de saúde é para que o usuário procure a operadora para se informar sobre seus direitos antes de aceitar pagar a taxa. Apesar de a dupla cobrança ser irregular, os planos não ressarcem aos usuários o valor pago "por fora", pois o médico já recebe o pagamento pela tabela da operadora. É preciso observar também as regras de ressarcimento caso a escolha seja não usar o plano e pagar por um procedimento particular.

Segundo o gerente de Regulação de Assistência à Saúde da Unimed Paraná, Marlus Wolney de Morais, é possível que o plano imponha sanções ao médico que receba duplamente. A operadora recebeu denúncias nesse sentido, que tiveram como resultado advertências e até expulsões do plano. "Se a usuária não puder ou não quiser pagar a taxa, o plano vai colocar à disposição dela obstetras qualificados nos hospitais e maternidades [plantonistas], só não pode garantir que será o mesmo com quem ela fez o pré-natal."

A orientação de especialistas é que a paciente peça recibo de pagamento feito ao médico para, pelo menos, ter direito ao abatimento no Imposto de Renda. Para o casal Silvana e Bruno Gogolla, o paciente continua a ser prejudicado. "Em breve, compensará pagar de forma particular para ter um bom atendimento, já que pagar o plano não dá a certeza de que a pessoa que acompanhou a mulher durante toda a gestação e conhece bem tudo que envolve a gravidez estará lá para garantir a segurança no nascimento do teu filho", diz Bruno.

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