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Em fevereiro deste ano, a Universidade de São Paulo (USP) passou a ofertar o curso de licenciatura em Educomunicação. A disciplina ainda é pouco conhecida no país, mas, segundo o professor e pesquisador da USP Ismar de Oliveira Soares, vai fazer parte das políticas educacionais de todos os municípios brasileiros daqui a dez anos.

A educomunicação prevê o uso de recursos tecnológicos modernos para provocar avanços na aprendizagem, tanto em espaços de educação formal – escolas, por exemplo – como em movimentos sociais e no terceiro setor.

"A geração que está chegando tem um projeto de vida e a sociedade necessita desses jovens. A educomunicação é um paradigma que reconhece e favorece a realidade", entusiasma-se o estudioso, sobre as crianças e jovens que têm na tecnologia um instrumento cotidiano e querem fazer uso dela no processo de aprendizagem.

Soares é jornalista, educomunicador e pós-doutor pela Marquette University Milwaukee Wisconsin. Ele esteve em Curi­­­tiba no mês passado para participar do 1.º Fórum Paranaense de Educomunicação. Confira trechos da entrevista dada à Gazeta do Povo.

O senhor é o principal pesquisador de educomunicação no país. Como começaram os estudos nessa área?

A palavra educomunicação é um neologismo antigo. Foi utilizado na década de 1980 pela Unesco e significava "educação para recepção crítica". Entre 1997 e 1999, a USP fez uma pesquisa que identificou esta prática social de produção midiática. Queríamos um conceito que servisse de guarda-chuva para explicar o uso dos meios na educação. Lembramos da palavra usada pela Unesco e passamos a empregar o mesmo conceito, mas num sentido mais amplo. A educomunicação não seria mais uma área preocupada com o impacto da mídia, mas sim a gestão da mídia por parte das comunidades, com o uso das tecnologias, permitindo o empoderamento da sociedade. A responsabilidade minha e da equipe com a qual trabalho foi a ressignificação do conceito e sua apresentação pública.

A educomunicação é um tema recente na agenda de pesquisas científicas brasileiras. O que desencadeou esse interesse?

Nossa conclusão é a de que há um novo fenômeno educativo. Crianças começam a aprender à medida que produzem usando recursos de comunicação disponíveis. Observamos casos isolados. E descobrimos que não são tão isolados assim. Existem muitas experiências ocorrendo em todo o país, o que nos leva a entender que a "no­­­vi­­­dade" é uma prática que vem se consolidando há anos.

Com bons resultados?

Há bons resultados em termos de autoestima, aprendizado, desenvolvimento, além da criação de perspectivas de mudanças sociais e existenciais. Este neologismo que reúne as palavras educação, comunicação e ação está presente na sociedade há muito tempo. Estava incorporado aos movimentos sociais, ajudando na discussão do meio ambiente, democracia, emancipação da mulher. E estava relacionado ao cotidiano. O que move crianças e educadores é o cotidiano, a transformação da realidade que está mais próxima.

Que mudanças a educomunicação promove?

É uma prática questionadora, que colabora com os sistemas de educação e comunicação. Em 2004, houve um encontro de educomunicação no Rio de Janeiro, com participantes de 40 países, no qual se discutiu a qualidade da mídia para a infância e a juventude. Os adolescentes que estavam lá elaboraram um documento dizendo que a mídia de qualidade era a produzida por eles e com eles. Estamos falando de uma geração que domina a tecnologia, que passa a ser ativa na sociedade, que vem para colaborar na definição de políticas e interferir na maneira como a sociedade pensa.

A universidade já percebeu isso?

Percebeu ser uma realidade que precisa ser levada a sério. Inde­­pendentemente da vontade das escolas e dos meios de comunicação, esta geração chega com muita força e não será cooptada. Ela tem pontos de vistas que ficarão mais claros e incisivos. Daí a necessidade de diálogo com es­­ses jovens.

O que a USP propõe com a licenciatura em Educomunicação é que o mundo adulto, de cientistas e de gestores, colabore com essa nova realidade. A educomunicação é um paradigma que reconhece a geração que está chegando, faz propostas para que os sistemas estabelecidos – como a escola e a própria mídia –, ao reconhecerem este fenômeno, passem por uma revisão. A partir de agora, vai se perguntar mais, por exemplo, como a mídia se relaciona com o jovem. E será preciso criar conteúdos para serem consumidos.

E a escola?

O mesmo desafio da mídia é colocado para a educação. Cerca de 40% dos jovens estão fora do ensino médio e os outros 40% não sabem o que fazer com o conteúdo dado em sala de aula. Os educadores começam a apoiar a educomunicação como forma de motivar esses adolescentes.

O senhor diz que em uma década a educomunicação estará em todos os municípios? Como?

É muito nítida a perspectiva de que isso vai ocorrer. O conceito ficará conhecido. E teremos políticas públicas. A área de meio ambiente, por exemplo, já adota esta prática. Outra possibilidade é a aplicação da educomunicação no ensino da disciplina His­­­tória e Cultura Afro-Brasi­leira. Há também programas no governo federal, como o Mais Edu­­cação – são 4 mil escolas no Brasil usando equipamentos de comunicação. Como está em discussão, naturalmente o tema será de domínio público.

Não imaginávamos o que ocorreria nos últimos anos. O conceito foi definido em 1999 e já é política pública em muitos estados. Falar em dez anos é pensar na multiplicação deste trabalho.

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