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STF julgará pedido de desbloqueio de contas bancárias e redes sociais do Terça Livre
Jornalista Allan dos Santos, um dos fundadores do Terça Livre, falando na CPMI das Fake News, em 2019| Foto: Roque de Sá/Agência Senado

O Supremo Tribunal Federal (STF) dará início, nesta sexta-feira (3), ao julgamento de um mandado de segurança apresentado pela defesa da empresa de comunicação Terça Livre, de propriedade do jornalista Allan dos Santos. Os advogados pedem que a Corte suspenda o bloqueio das contas bancárias e de todos os perfis nas redes sociais do Terça Livre. Os bloqueios foram determinados em outubro do ano passado pelo ministro Alexandre de Moraes de ofício, isto é, sem haver pedido por parte do Ministério Público ou de autoridade policial.

O julgamento ocorrerá em plenário virtual e os ministros terão até a próxima sexta-feira, 10 de junho, para apresentar seus votos.

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Na referida decisão de Moraes, no âmbito do inquérito 4.784, que corre em segredo de justiça, o ministro ordenou a prisão preventiva de Allan dos Santos, o bloqueio de suas contas bancárias e de todas as suas redes sociais alegando que o jornalista “integra organização criminosa voltada à prática dos crimes de ameaça, incitação à prática de crimes, calúnia, difamação, injúria e outros”. Como o Terça Livre é o veículo no qual o jornalista se manifestava, o ministro decidiu aplicar as medidas que, na prática, obrigaram a empresa a fechar suas portas dias após a decisão, gerando o desligamento de cerca de 50 funcionários.

Mesmo com diversas medidas cautelares em vigência, Alexandre de Moraes ainda não ofereceu denúncia contra Santos ou qualquer outro investigado, e mantém a investigação em andamento a “passos lentos”. Situação semelhante ocorre no inquérito 4.781, também sigiloso, que se arrasta há mais de dois anos sem nenhum indiciamento, porém com diversas medidas cautelares questionáveis em andamento contra os investigados – grande parte deles, críticos do STF.

Ministros alegam jurisprudência do STF para não interferirem em decisões de Moraes

Duas semanas após as ordens de bloqueio, a defesa do Terça Livre entrou com o mandado de segurança. O documento não foi apresentado antes porque os advogados não tiveram acesso aos autos do processo e ficaram sabendo da decisão de Moraes por um site de notícias após os autos sigilosos terem sido vazados para a imprensa.

Ao impedir que os advogados tenham acesso aos autos na íntegra, o Supremo fere a Súmula Vinculante 14, do próprio STF, que cita ser “direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”. Apesar de ter sido acionada em abril, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por meio da Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas, ainda não tomou providências para defender as prerrogativas dos advogados do Terça Livre.

O mandado de segurança foi rejeitado por Edson Fachin, que justificou a medida com uma jurisprudência da Corte, a qual define que o instrumento jurídico em questão não pode ser impetrado contra ato praticado por ministros do STF.

“Essa jurisprudência do STF tem uma ressalva, que está relacionada à existência de ilegalidades ou abusos. Mas em todas as decisões e votos em ações de impugnação das decisões do Moraes até agora, os ministros não estão entrando no mérito. Apenas alegam que não podem analisar porque existe essa jurisprudência. Mas como vão verificar se há abuso ou ilegalidade se não entram no mérito?”, questiona Renor Oliver Filho, advogado responsável pela defesa de Allan dos Santos e do Terça Livre.

A partir da rejeição do mandado de segurança, a defesa entrou com um recurso pedindo que o caso fosse levado ao plenário do STF e avaliado por todos os ministros, o que ocorrerá a partir desta sexta-feira.

Em julgamento recente de um habeas corpus pedindo a suspensão de medidas cautelares contra Allan dos Santos, o ministro Nunes Marques pediu vista suspendendo temporariamente o ato. Até o pedido de vista, cinco ministros já tinham votado contra o habeas corpus. Eles citaram a jurisprudência de não interferir em decisão de outros integrantes da Corte.

“Nem ditadura fechou meios de comunicação”, diz defesa do Terça Livre ao STF

No mandado de segurança encaminhado ao STF, os advogados do Terça Livre afirmam que nem mesmo durante o período da ditadura militar, entre 1964 e 1985, houve um ato oficial que “tenha decretado o fechamento de qualquer veículo de mídia”.

A defesa também alega que Alexandre de Moraes tem conduzido a investigação de forma a dificultar a atuação dos advogados. Segundo o texto, “os bloqueios decretados contra o Terça Livre TV configuram violação à liberdade de imprensa, ainda mais quando sua fundamentação encontra-se repleta de expressões e opiniões eivadas de um subjetivismo incompatível com jus persequendi [direito do Estado de perseguir o autor de um delito], tornando impraticável o exercício do contraditório e da ampla defesa”.

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Na decisão de Moraes, de outubro do ano passado, ele cita a existência de uma organização criminosa “constituída para atacar instituições da República, o Estado Democrático de Direito e a tripartição dos poderes”. Porém, a menção a uma suposta organização criminosa é citada sem nenhuma descrição de sua composição, organização, estrutura, modo de operação concreto ou dos crimes acessórios que seriam seu objetivo.

Desde o início da investigação, pessoas ligadas ao Terça Livre foram intimadas a depor, tiveram seus sigilos telemáticos e bancários quebrados, foram alvo de busca e apreensão, entre outras medidas. E tudo isso sem que essas diligências resultassem na apuração de indícios de materialidade ou autoria de qualquer crime. Diante disso, a defesa sustenta que não há embasamento legal para que a apuração prossiga.

Para Oliver Filho, nos inquéritos sigilosos conduzidos por Moraes há ocorrência do chamado fishing expedition (pescaria probatória), que consiste em uma “investigação especulativa”, sem objetivo certo ou declarado, que “lança redes” com o intuito de “pescar” provas para subsidiar uma futura acusação. O mecanismo, que é ilegal, foi alvo de críticas do ministro Ricardo Lewandowski em julgamento realizado em 2018.

“Ministro Gilmar, eu penso que os ministros desta Casa, e o Judiciário de modo geral, devem estar muito atentos para aquilo que os doutrinadores chamam e condenam de fishing expedition, ou seja, os órgãos investigatórios lançam a rede e não pescam nada. Voltam novamente a lançar e ficam pedindo diligências e prorrogando diligências, como demonstrou agora o Ministro Dias Toffoli, por um prazo indeterminado, até encontrarem alguma coisa vaga e tentam estabelecer algumas conexões”, disse Lewandowski na ocasião. “Isso é absolutamente, a meu ver, contrário aos princípios constitucionais, às garantias fundamentais do cidadão, e nós não podemos admitir”, reforçou.

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