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São Paulo - As novas normas para a demarcação de terras de quilombolas, estabelecidas pela Instrução Normativa nº 49, divulgada ontem no Diário Oficial da União, provocaram manifestações de apoio e de repulsa. "O governo cedeu às pressões dos ruralistas e retrocedeu vergonhosamente", acusou a quilombola Jô Brandão, da Coordenação Nacional dos Quilombos.

Do outro lado, o ministro interino da Secretaria da Igualdade Racial, Elói Ferreira de Araújo, saudou a instrução como um avanço: "As novas normas aparam arestas e eliminam dúvidas que emperravam o andamento dos processos de reconhecimento das terras."

A nova instrução foi definida a partir de um grupo de trabalho coordenado pela Advocacia-Geral da União (AGU). A idéia de substituir a antiga instrução, de nº 20, surgiu na Casa Civil após uma série de disputas envolvendo instituições do governo em torno das terras reivindicadas pelos quilombolas.

A instrução é assinada por Rolf Hackbart, presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) – a autarquia responsável pelos processos de reconhecimento, demarcação e titulação das terras de quilombos. Ontem, Hackbart também disse que as novas regras constituem um avanço. "Daqui para a frente, as desapropriações de terras serão pagas integralmente em dinheiro. Antes uma parte era paga em TDA (Títulos da Dívida Ativa). Isso favorece o proprietário e elimina os demorados ritos de desapropriação para a reforma agrária", afirmou. "Outra medida positiva é a criação de uma câmara de conciliação, dirigida pela AGU, no caso da sobreposição de interesses públicos."

Redigida na AGU, a nova instrução foi analisada e aprovada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, antes de ser encaminhada a Hackbart. Ela reduz sensivelmente os poderes do Incra. Um exemplo: anteriormente, cabia ao instituto a palavra final em qualquer conflito. De agora em diante, cabe à AGU.

Para Jô Brandão, um dos sinais de que o governo recuou foi o abandono do termo "território" – que constava da instrução anterior. "Território é um termo abrangente. Engloba tudo o que envolve a identidade cultural da comunidade", explicou. "Agora o governo trata a questão como se estivéssemos pedindo um lote de terra." A articuladora política também observa que antes bastava uma comunidade se autodefinir como quilombola para ser reconhecida: "Pelas novas normas, a autodefinição precisa ser confirmada por um antropólogo. É um retrocesso."

Ao mudar as normas, o governo também pretende sensibilizar o Supremo Tribunal Federal (STF), que se prepara para examinar uma ação direta de inconstitucionalidade a respeito do tema. Proposta pelo DEM, a ação questiona a Resolução 488, assinada em 2003, pelo presidente Lula, regulamentando o artigo da Constituição que reconheceu os direitos dos quilombolas. Segundo o DEM, o presidente não tem autoridade para isso.

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