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Segurança

Tráfico mata cada vez mais jovens em Curitiba

O adolescente Francisco* não consegue contar nos dedos das mãos o número de amigos mortos pelo tráfico de drogas em 2008. Passam de 15. Mais da metade tinha menos de 12 anos. Francisco tem 17 anos e morou até os 14 na Vila das Torres. O jovem fala do cotidiano na vila como uma guerra. "Eu me envolvi na guerra porque tinha três primos que traficavam. Nosso grupo tinha 20 meninos que ficavam direto no movimento, mas tinha outros cem que participavam de vez em quando." A Vila das Torres é dividida em grupos rivais que literalmente guerreiam pelo espaço de venda de drogas. Francisco conta que, às vezes, durante a noite, formavam-se os "bondes", um miniexército de jovens armados que acerta contas com outras gangues. É aí que ocorriam as mortes.

O relato de Francisco faz parte de uma realidade contabilizada pela Vara do Adolescente Infrator de Curitiba. A equipe, incluindo a juíza, assistentes sociais e psicólogos, faz um levantamento informal sobre o número de jovens curitibanos que passaram pela vara e morreram no tráfico de drogas. Os dados significam quase um adolescente morto a cada três dias somente na capital. Desde que o levantamento começou, no fim de 2005, os números vêm crescendo. A média tem ficado em 60 mortes por ano, mas em 2008 o número pode ter passado de 100. "Como é uma pesquisa informal, o número pode ser maior", diz a juíza Maria Roseli Guiessmann.

Quem comanda o levantamento é a psicóloga Sylnara Borges. "É como se os jovens não tivessem chance de sair das drogas", diz. Outro fator que pode ampliar o resultado final e piorar as estatísticas é que esse número corresponde somente aos adolescentes que estão cumprindo medida socioeducativa em regime aberto. São aqueles que cometeram infrações leves, sem ameaça à vida, e estão em liberdade assistida. Não entra na conta quem cumpriu medida em regime fechado e já saiu e nem os jovens que nunca tiveram passagem pela Vara do Adolescente Infrator. "Por isso os dados são relativos", explica a psicóloga. Sylnara diz que parte das mortes ocorreu pelas dívidas com o tráfico, quando os jovens são só usuários, e em função do envolvimento direto com a atividade ilícita.

Números do Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros, organizado pelo pesquisador Júlio Jacobo Waiselfisz, mostram que em Curitiba o número de homicídios juvenis saltou de 239 em 2002 para 382 em 2006. É um crescimento de quase 60% em apenas quatro anos. Apesar de estar longe de índices como os do Rio de Janeiro e de São Paulo, a capital paranaense esteve na contramão de algumas metrópoles do país. Desde 2003 houve uma diminuição no número de homicídios juvenis em algumas das cidades mais violentas. Em Curitiba, o número aumentou.

Crack e maconha

O coordenador do Centro de Socioeducação (Cense) de Curitiba, sociólogo Francesco Serale, traz outro dado alarmante. Em 2008, 2.972 adolescentes passaram pelo Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Infrator (Ciaddi). Desses, 80% admitiram fazer uso de drogas. Mas Serale afirma que o porcentual chega a 95%. "Muitos não gostam de contar, porque acham que pode haver implicações com o Judiciário depois." O crack e a maconha são as principais substâncias utilizadas. "Esse é o grande motivo para os atos infracionais: sob o efeito da droga, eles não têm consciência e responsabilidade sobre os atos", diz o sociólogo. Serale relata que, se por um lado o número de jovens se mantém constante, o que preocupa é o aumento da gravidade das infrações. "Antes era difícil até haver arma branca. Hoje o número de armas de fogo que chegam com os jovens é muito grande."

Um dos primos de Francisco está preso, mas os outros dois continuam "na ativa". A mãe dos garotos foi assassinada pela gangue rival. Hoje Francisco é um adolescente como qualquer outro. Faz aulas de canto e violão e sonha ser cantor. Lucas*, um de seus amigos, também teve envolvimento com o tráfico. Morava com a mãe, que deu 8 de seus 11 filhos. Lucas tinha de cuidar dos dois irmãos menores. Aos 13 anos, escolheu o caminho mais fácil para trazer comida para dentro de casa. Só decidiu sair do "movimento" quando seus dois melhores amigos foram mortos.

* Nomes fictícios

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