Três projetos paranaenses são finalistas do Prêmio Vivaleitura, que será entregue amanhã, em Brasília. São eles: "Freguesia do Livro", "Palavra de Mulher" e "Ação Integrada para o Letramento". Ao todo, 20 trabalhos concorrem em quatro categorias, sendo que o vencedor de cada uma delas recebe R$ 25 mil. Nenhum grupo do Paraná compete na mesma categoria.
Apesar da premiação em dinheiro, a palavra "competir" deve soar estranha aos selecionados. Quase regra, os projetos que se candidatam ao Vivaleitura instituído em 2005 numa parceria dos ministérios da Educação e da Cultura com a Organização dos Estados Ibero-Americanos para Educação, Ciência e Cultura (OEI) primam pela despretensão e pela economia de recursos.
Dos candidatos locais, o "Freguesia do Livro" é o mais antigo. Começou há três anos, por iniciativa das fonoaudiólogas Josiane Mayr Bibas e Ângela Marques Duarte. As duas distribuem livros em caixas personalizadas, tudo muito ajeitado, fazendo do livro um presente. O doador liga, elas recolhem os títulos, guardam numa garagem e separam o que interessaria para essa ou aquela biblioteca. A seleção evita o mero repasse de material algo como mandar obras de Medicina para uma sala de leitura de uma escola básica. Pois isso acontece.
A "trabalheira" de Jô e Ângela é fazer a caixa chegar ao destino, com custo mínimo. No começo, receberam pedidos até de Xapuri, no Acre. Chegaram a formar uma rede de caminhoneiros e viajantes em geral, mas logo entenderam que deveriam limitar o território. Mesmo assim, o "Freguesia" atende o Paraná inteiro, um pouco de Santa Catarina, atingiu mais de 200 espaços e iniciou uma tarefa que enche os olhos colabora para que outros agentes façam suas próprias redes. "Chamam de replicabilidade", diz Josiane.
O "Palavra de Mulher" nasceu em 2013, por iniciativa do ator Alisson Freyer, 26 anos, coordenador da Casa de Leitura Dario Vellozo, na Praça Garibaldi. O projeto tem menos segredos do que fazer um bolo. Escolhe-se um texto, arruma-se alguém para lê-lo em voz alta, numa roda, todo mundo com xerox na mão. Depois é conversa livre, de modo a deixar correrem as impressões, sem nenhuma obrigação acadêmica. "Estamos aqui para desmistificar", resume o idealizador. A novidade do ciclo é a determinação de ler obras de autoras brasileiras, inicialmente as da primeira metade do século 20, muitas delas deixadas no banco de reserva da história.
Em um ano de rodas, a lista ganhou fermento passa por Adélia Prado, Clarice Lispector, Hilda Hilst e Luci Collin. E os pedidos na linha "venham aqui ler para a gente" ultrapassaram os limites da Casa da Leitura. Hoje o "Palavra" acontece em abrigos da Fundação de Ação Social e em residências terapêuticas, para surpresa do próprio Alisson e sua trupe.
A leitura em voz alta também está na raiz do projeto "Ação Integrada para o Letramento", desenvolvido no Colégio Estadual João Gueno. O nome é meio rígido, a prática, líquida. A escola fica no bairro São Dimas, em Colombo, vizinha do Monte Castelo, conhecido dos noticiários policiais. O clichê está ali região modesta, informalidade alta, estigma social e alunos vindos de famílias de baixa escolaridade. A professora de Português Érica Rodrigues, 34 anos, ao constatar que os adolescentes liam pouco porque entendiam mal ou entendiam mal porque liam pouco pediu ajuda à UFPR, em 2012.
Em 2013, recebeu como resposta, na porta da escola, duas pesquisadoras cujos Lattes "são um brinco" Lúcia Cherem e Elisa Dalla-Bona. Por lá permanecem. Toda essa reviravolta ajudou a disparar o gatilho do projeto que impressionou o Vivaleitura. Érica começou a ler para a turma do 6.º ano A maldição da moleira, da nada convencional escritora Índigo. Fazia-o naqueles 5 minutos infernais do final da aula, quando o teto quase desaba. Não usou de performance nem de recursos de contação de histórias. Só leu. Ansiosos pelo próximo capítulo, os alunos sugeriram inverter a ordem primeiro a leitura depois a matéria. Quando o livro acabou, pediram-no emprestado, em massa, mas só havia ali um mísero exemplar. "Não esperava tanto interesse."
A professora tentou passar o chapéu entre as autoridades, para comprar os livros, mas nada, até que a própria Índigo ao saber de tudo por uma jurássica carta postada por Érica no Correio mandou uma caixa de presente. Melhor, numa manhã de setembro, apareceu para uma visita. Nada mais natural para alguém que vinha trocando e-mails com aqueles leitores. Índigo, pode-se dizer, "é parte do processo". O episódio lembra o emocionante filme Escritores da Liberdade, estrelado por Hilary Swank. "Ocorreu de forma inocente. A gente adoraria repetir a experiência, mas esse tipo de coisa não tem método, acontece", comenta Érica. Os alunos agora também leem para idosos, entre outras atividades. Mas essa parte da história vai ficar para o Vivaleitura do ano que vem.
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