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Entrevista

Trocas partidárias fazem parte da história eleitoral do Brasil

Curitiba – A política nacional de conchavos e trocas partidárias não vai mudar enquanto o Brasil continuar a ser um sistema presidencialista centralizador. A visão é do professor de Ética Política da Unicamp, Roberto Romano. Para ele, se os estados e municípios não tiverem um pouco mais de autonomia, o cidadão continuará a ser refém dos esquemas de corrupção articulados pelo presidente, Congresso e lideranças locais.

Gazeta do Povo – Qual é a explicação para o troca-troca de partido entre os parlamentares?

Roberto Romano – Isso faz parte da história política no Brasil. Quando tivemos a independência, a primeira preocupação do império foi garantir que não haveria divisão nas províncias: fortaleceu as fronteiras e centralizou as forças no Executivo. Para conseguir de volta os recursos centralizados no Executivo para as regiões, os Estados começaram a negociar por meio de um sistema absurdo baseado nas "oligarquias regionais", uma espécie de filtro entre municípios, estados e o governo federal. Elas têm nas mãos os votos locais – que elegem o presidente – e os caminhos para conseguir a concessão de verbas.

Como isso funciona?De um lado, o governo federal concentra os impostos e os redistribui de acordo com o apoio que tiver. É o famoso "é dando que se recebe". Os municípios vivem em uma carência e para que os recursos voltem eles precisam de um deputado que negocie apoio. E os deputados, por outro lado, precisam de dinheiro para fazer obras e, com elas, atrair mais votos.

Quais são as conseqüências?Isso criou uma distorção nos municípios que o eleitor vive como se fosse algo normal. Ele acha que um bom deputado é aquele que traz obras para o município. Os deputados chegam de Brasília e as bases perguntam o que ele trouxe para o movimento negro, para as crianças aidéticas, de recursos e obras da região.

E o cidadão não se pergunta de onde vêm aqueles recursos, da corrupção que tem por trás. Esse mesmo eleitor fica horrorizado com a falta de ética no Congresso Nacional, sem perceber que ele também não é ético ao não acompanhar bem os parlamentares eleitos e valorizar apenas aqueles que fazem obras para a comunidade ou se servem de assistencialismo para ganhar mais votos. Se o deputado não consegue o que prometeu, para conseguir se reeleger, ele vai buscar recurso em esquemas como o do publicitário Marcos Valério que permitiu o mensalão.

O político que vai para a Câmara dos Deputados ingênuo e idealista, não consegue trazer obra nenhuma e não é reeleito.

Onde fica a escolha dos partidos nesse sistema?Nenhum partido foge das oligarquias regionais. Como o problema federativo não é resolvido, a questão não é em que partido ele está, mas se nesse partido ele consegue levar recursos para as cidades. Pensar na ideologia dos partidos é ingenuidade.

O que aconteceu com o PT?A esquerda foi muito tempo iludida com o poder presidencial brasileiro, tinha a impressão de que Lula usaria a caneta para resolver tudo. Não é isso que acontece. Fernando Henrique Cardoso explica a situação com o que ele chama de "utopia do possível". Os presidentes no Brasil são aclamados, com milhões de votos, mas depois chegam lá e têm de negociar com as oligarquias; quando não conseguem têm de ceder. O PFL, por exemplo, faz coligação mas não coloca os interesses de suas oligarquias nas mãos do PSDB, um partido urbano, formado por uma classe média intelectualizada. Algo semelhante ocorreu com o PT. Nesse panorama a solução do mensalão é, de certa maneira, "genial". Se eu não consigo apoio, compro.

Qual é a solução?Acabar com a concentração de tudo no poder federal, de recursos até leis. Nos Estados Unidos o país funciona como uma federação de verdade, os estados têm leis próprias para seus impostos, com autonomia, sem perder a unidade nacional. Isso facilitaria a fiscalização do cidadão comum da atuação dos agentes políticos e evitaria o envio sem volta de recursos das regiões.

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